Fronteiras

A vida é um diálogo entre fronteiras! A vida no planeta Terra só terá surgido quando se formou uma fronteira, constituída por uma membrana de natureza lipídica primordial, que separou, de forma mais ou menos permeável e selectiva, um espaço interior e o meio exterior envolvente.

Passados talvez um pouco mais de 3,5 mil milhões de anos, a funcionalidade bioquímica dessa membrana, dessa fronteira que permite diálogos entre o interior celular e o espaço extracelular, continua a ser decisiva para a viabilidade da vida. É através dela que entram e saem substâncias, tanto nutrientes como a glicose, como “comunicadores” como as hormonas e neurotransmissores, por exemplo. Nas células do sistema nervoso, nos neurónios, é através da fronteira membranar dos seus axónios que os impulsos nervosos se propagam permitindo, por exemplo, o pensamento. É na fronteira que o sonho explora a existência!

Num nível fisiológico seguinte encontram-se os órgãos. Estes são formados por tipos específicos de células, que os definem e caracterizam. A fronteira dos órgãos é essencial para a sua função bem definida, para a sua integridade, forma, suporte, etc. E essa fronteira também é funcional constituindo, em alguns casos, como seja o cérebro (com a fronteira hematoencefálica), uma barreira protectiva contra a entrada de potenciais substâncias nocivas. E é através das suas fronteiras que os órgãos interagem homeostaticamente com o restante organismo de que fazem parte.

No nosso caso, assim como em muitos outros seres vivos, o nosso corpo possui uma fronteira cuja integridade e perfeita funcionalidade é essencial para a nossa vida: a pele. Barreira protectora, por exemplo, contra microorganismos. Fronteira que também permite a excreção de substâncias através do suor, que nos protege das radiações solares e outros agentes nocivos, mas que também participa activamente no controle da temperatura corporal. É uma fronteira que permite e potencia o tacto, esse sentido tão importante para a humanidade com sentido.

Poderíamos discorrer sem fim sobre as fronteiras geofísicas e/ou administrativas que delimitam as freguesias, os concelhos, os distritos, os países, os continentes, os mares. Essas fronteiras delimitam espaços distintos e elas próprias estão repletas de conteúdos históricos, culturais, políticos, científicos e tecnológicos. Mas pensemos no planeta Terra como um todo e na importância para a vida dessa fronteira feita de atmosfera. Sem ela, a vida não seria possível tal qual a conhecemos. E a própria dinâmica geológica seria diferente na ausência da atmosfera.

O invólucro maioritariamente gasoso que caracteriza essa fronteira condicionou a evolução da vida na Terra, permitindo-a, ao impedir que a maioria das radiações a ela nocivas, como sejam as radiações ultravioleta e os raios cósmicos, atinjam a superfície terrestre. Essa fronteira também está envolvida na dinâmica do ciclo da água, substância ubíqua à vida, e na regulação da temperatura da superfície do planeta. A sua história dinâmica alberga as preocupantes alterações climáticas e o seu impacto decisivo para a vida. É a fronteira que nos separa do nosso sentido cósmico.

E uma última fronteira, a heliopausa, que delimita o sistema solar, que separa a heliosfera (a região imensa de espaço sob a influência do vento solar) do resto do universo. Foi atravessada há alguns anos pelas sondas Voyager que continuam as suas viagens cósmicas em direcção a outras estrelas, outros mundos, repletos de fronteiras a explorar.

Por fim uma questão cosmológica, a de se o universo em que existimos, e que está em expansão acelerada, terá uma fronteira. Se esta existe, o que é que existirá para além dela?

António Piedade
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Alterações climáticas: cientistas estudam soluções para impedir o desaparecimento dos sapais estuarinos

Devido às alterações climáticas, os sapais estuarinos correm sérios riscos de desaparecer, tornando-se urgente a adoção de medidas de proteção e conservação destas zonas de elevada importância ecológica e socioeconómica.

Tiago Verdelhos
Para mitigar o impacto causado por eventos climáticos extremos, mas também por atividades humanas (agricultura, urbanização, poluição), nas zonas de sapal dos estuários, está em curso o projeto de investigação ReSEt – Restauro de sapais estuarinos com vista à sustentabilidade.

Financiado por fundos europeus através do Programa Operacional MAR 2020, o ReSEt junta 15 investigadores do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente das universidades de Coimbra (MARE-UC) e de Lisboa (MARE-UL), do Instituto para a Sustentabilidade e Inovação em Engenharia Estrutural (ISISE) e do Departamento de Ciências da Terra da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC).

No âmbito do projeto, será instalado, ainda durante o mês de julho, um conjunto de células experimentais no estuário do Mondego, perto de Vila Verde, onde os investigadores vão estudar novas técnicas que impeçam a destruição dos sapais.

«Vamos testar e validar quatro técnicas de eco engenharia que possam ser utilizadas para promover a sedimentação e proteger e recuperar estas zonas de sapal, nomeadamente uma paliçada de madeira, uma tela de geotêxtil e sacos de geotêxtil com areia, bem como o transplante de plantas autóctones. Estas experiências vão ser implementadas ao longo de um ano e meio, para assim podermos avaliar a evolução da taxa de sedimentação e das comunidades biológicas, com o objetivo de compreender qual destas técnicas será mais vantajosa do ponto de vista ambiental e económico», clarifica Tiago Verdelhos, investigador do Laboratório MAREFOZ do MARE e coordenador do projeto.

Trabalho de Campo
Sabendo da importância das zonas estuarinas para a sustentabilidade das pescas, já que são fundamentais para os primeiros tempos de vida de muitas espécies de peixe, os investigadores vão também explorar a hipótese de proteger e conservar a fauna autóctone do estuário do Mondego com recurso à utilização de um tanque de aquacultura como “viveiro”. Para tal, «vamos deixar entrar a água do estuário, capturando o peixe dentro desse tanque, para que seja possível avaliar quer a quantidade quer a diversidade de peixes, assim como perceber se este método pode ser usado como técnica de proteção e conservação de espécies», adianta Tiago Verdelhos.

O investigador do laboratório MAREFOZ adverte que é urgente adotar medidas de proteção e restauro dos sapais estuarinos porque, «se nada for feito, com a subida do nível do mar prevê-se que estas zonas, que por natureza estão situadas entre marés, tendam a desaparecer, com consequências bastante negativas. Assistir-se-á à diminuição da biodiversidade e os serviços que são fornecidos por estes ecossistemas serão bastante afetados. Os sapais contribuem, por exemplo, para a retenção de carbono, a qualidade da água e reciclagem de nutrientes, e são fundamentais para a reprodução de peixes». Além disso, são ainda ecossistemas muito importantes para o turismo e lazer.

Em resumo, o projeto ReSEt desenvolve-se em três grandes eixos: ecossistema (testar técnicas de proteção dos habitats), biodiversidade (proteção da fauna) e sociedade (apostando em atividades de comunicação de ciência e ações de ciência cidadã, nomeadamente ao nível de sensibilização). A equipa do projeto espera que as soluções de proteção e restauro de sapais estuarinos desenvolvidas sejam aplicadas no estuário do Mondego e possam ser replicadas em qualquer estuário do mundo.

O céu de julho de 2019

A Lua Nova é a primeira efeméride astronómica relevante do mês, ocorrendo ao final da segunda tarde de julho. A interposição da Lua entre o Sol e a Terra causará um eclipse solar total, que apenas será apreciado na sua plenitude ao longo de uma faixa estreita que se estende do norte da Argentina e do Chile até ao sul do oceano Pacífico.

Figura 1 - céu a oeste ao anoitecer de dia 4
Ao anoitecer de dia 4 a Lua será vista na constelação do Caranguejo junto com os planetas Mercúrio e Marte. Este evento marca a chegada da Terra ao seu afélio (ponto da orbita mais afastado do Sol) já madrugada seguinte. Mas, como por estes dias o hemisfério norte terrestre está voltado na direção do Sol, nesta parte do globo o Sol parece mais alto, e ilumina mais, do que há seis meses.

A maior aproximação entre Mercúrio e Marte dar-se-á na no dia 6, distado cerca de 4 graus um do outro (pouco menos da largura de três dedos vistos com o braço esticado). Mercúrio será o planeta mais à esquerda e o mais brilhante dos dois. Estes astros serão visíveis na primeira quinzena do mês, passando depois a ser ofuscados pelo Sol. Nessa noite a Lua estará ao lado de Régulo, um sistema estelar quadruplo situado a 79 anos-luz de nós, que associamos ao coração da constelação do Leão.

Aquando do quarto crescente de dia 9, o planeta Saturno estará em oposição, i.e. a posição diametralmente oposta à do Sol. Este é o período em que estamos mais perto desse planeta e em que o vemos completamente iluminado.

Na noite de dia 13 para 14 a Lua será vista ao lado de Júpiter, enquanto na madrugada de dia 16 já estará ao pé de Saturno Por ocorrer junto ao plano da órbita terrestre a Lua Cheia de dia 16 dará origem a um eclipse lunar. Este apenas será parcial pois a umbra (a parte mais escura da sombra) terrestre apenas cobrirá parcialmente a Lua. Este evento terá início pelas 19 horas e 42 minutos (hora no continente), atingindo o máximo às 22 horas e meia, e terminando pela 1 hora e 20 minutos da madrugada. O quarto minguante chegará na madrugada de dia 21 junto da constelação do Aquário.

Figura 2 - céu a sudeste pela meia-noite e meia hora de dia 17
Na madrugada de dia 28 a Lua nascerá lado de Aldebarã, o olho da constelação do Touro. Esta efeméride coincide com o pico de atividade da chuva de estrelas Delta Aquáridas, meteoros que parecem irradiar da estrela Delta da constelação do aquário (ou Skat). Não se sabe com certeza que cometa deu origem a esta chuva de estrelas, sendo o principal suspeito o cometa 97P Macholz.

A melhor altura para observar este evento será pelas 3 horas da madrugada. Esta chuva de estrelas é pouco intensa tendo no pico de atividade, e em condições de observação ideais, entre uma a duas dezenas de meteoros por hora. Porém, estas estrelas podem ser vistas do primeiro fim de semana de julho até à terceira semana de agosto.

O reaparecimento de Mercúrio na madrugada de dia 30 marca o final de mais um mês de observações astronómicas. Neste mês 3 estrelas ocuparão a posição mais cimeira no céu a meio da noite; Vega, Deneb e Altair, pertencentes respetivamente às constelações da Lira, do Cisne e da Águia. Estas são os vértices do celebre Triangulo de Verão.

Boas observações!

Fernando J.G. Pinheiro (CITEUC)
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Se não houvesse vento, não havia surf, nem bodyboard, nem certos processos naturais

Como toda a gente vê, estes dois desportos têm, por suporte natural, a vaga em rebentação na praia. Acontece que esta onda, um dos principais agentes da dinâmica actuante na zona litoral, não é mais do que a agitação da camada superficial das águas numa determinada “área de geração”, lá longe, no oceano, soprada pelo vento. 

A ondulação transporta quase toda essa energia (a do vento), sob a forma de ondas ou vagas, a caminho dos litorais, consumindo-a aí, quer na rebentação, quer nas “correntes litorais “, a que dão origem.

Ao aproximar-se de terra, e à medida que a profundidade se reduz, a crista da onda torna-se, progressivamente, assimétrica, tombando para a frente até rebentar.

As características físicas da ondulação (altura, período, frequência, etc.) reflectem a energia disponível e dependem da intensidade do vento, da duração da sua incidência e da “distância de colecta”, isto é, a extensão, em comprimento, da região do mar soprada pelo vento. Com poucas perdas durante a propagação, as vagas atingem os litorais, exercendo aí, sobretudo, erosão e transporte. Nos fundos arenosos não consolidados, situados a profundidades susceptíveis de sofrerem as acções das vagas, estas remobilizam uma parte mais superficial da cobertura móvel (em geral, areia, promovendo sedimentação (ou ressedimentação) muito particular, reconhecida pelas marcas de ondulação, ou “ôndulas”, que lhe são próprias.

A retenção, nas grandes albufeiras das barragens hidroeléctricas, da maior parte dos inertes, em trânsito nos rios, é uma das causas dos recuos verificados em certas linhas de costa. Outra causa reside na extracção industrial de inertes (areias e/ou cascalho), na ordem de muitos e muitos milhões de toneladas por ano, das praias, das dunas e dos rios, incluindo os estuários. O desassoreamento de portos e barras constitui uma outra causa dos referidos recuos. A construção de enrocamentos, como sejam os molhes e os esporões, com o fim de proteger determinados sectores da costa, acabam sempre por transferir o mesmo tipo de problemas para jusante e, geralmente, de forma agravada. A adulteração da paisagem física em nome do desenvolvimento é um facto que está a atingir proporções preocupantes.

Os reflexos no litoral da intervenção do homem são hoje bem visíveis e as soluções encontradas, para os minimizar ou eliminar, nem sempre são as melhores. A conclusão a tirar desta realidade é a de que não se pode continuar a planear o litoral de costas viradas para os conhecimentos que a ciência já está apta a fornecer. Há, pois, que saber conviver com o mar e respeitar os seus códigos que já conhecemos com razoável pormenor. No sentido de minimizar estes inconvenientes, tem-se recorrido a ensaios realizados em tanques especiais, onde, em modelos reduzidos, se procuram simular as condições naturais e as alterações a introduzir, a fim de estudar os seus efeitos. Modernamente, com o desenvolvimento dos meios informáticos, estão a utilizar-se modelos matemáticos com idênticos propósitos.

Em conclusão e resumidamente, pode afirmar-se que a geometria e as características dinâmicas desta franja “onde a terra se acaba e o mar começa” resultam de um conjunto de factores e condicionantes naturais, a que se têm vindo a sobrepor outros, próprios da civilização, que não é despiciendo conhecer melhor. Para além das oscilações do nível do mar, ou eustáticas , e das deformações da crosta, quer epirogénicas quer orogénicas , sobressaem, por serem mais visíveis: a natureza e a estrutura das rochas (e a sua maior ou menor vulnerabilidade à erosão); o clima, em especial no que diz respeito à pluviosidade, à temperatura e aos ventos; e, ainda, outros factores, próprios do mar, como sejam as vagas (intensidade e orientação), as marés e as correntes marinhas. Em complemento das acções mecânicas destes agentes forçadores, são ainda importantes as de alteração química e/ou de dissolução que a água do mar exerce sobre as rochas do litoral, com efeitos variáveis em função das respectivas naturezas. Por outras palavras, pode dizer-se que esta interface da hidrosfera com a litosfera se define pelas leis naturais, ou seja, pelas leis da física e da química, sempre subjacentes aos processos geológicos e biológicos.

As vagas, desencadeadas por acção do vento, transmitem até ao litoral a energia que dele recebem e têm a sua acção erosiva grandemente potenciada pelo efeito abrasivo dos materiais (areias, seixos, blocos) que põem em movimento. Em resultado desta acção formam-se os litorais de erosão, ou catamórficos, caracterizados por arribas, ou falésias alcantiladas, que recuam à medida que aumenta a plataforma litoral ou de abrasão marinha. Deste recuo restam como testemunhos pontas rochosas, promontórios ou cabos escarpados, muitas vezes prolongados mar adentro por pontuações igualmente rochosas (ilhéus, baixios, escolhos, abrolhos, calhaus, pedras, etc., nos diversos modos de dizer locais), com destaque para a Costa Vicentina e para os cabos da Roca, de S. Vicente, de Sagres e do Carvoeiro, com a conhecida e elegante Nau dos Corvos.

A.M. Galopim de Carvalho
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Monitorização global da biodiversidade

A Universidade do Minho representa Portugal no BIOSCAN, o programa revolucionário de inventariação e monitorização da biodiversidade à escala global, baseado na análise de segmentos padronizados do ADN.

Filipe Costa
A Universidade do Minho (UMinho) representa Portugal no BIOSCAN, o programa revolucionário de inventariação e monitorização da biodiversidade à escala global, baseado na análise de segmentos padronizados do ADN. O projeto – que foi lançado a 16 de Junho de 2019 em Trondheim, na Noruega – envolverá mais de mil investigadores de 31 países e tem um financiamento de 180 milhões de euros para os próximos sete anos. A iniciativa surge face ao forte declínio da biodiversidade e à urgência de esta ser integrada nos modelos socioeconómicos, no quadro de um comércio cada vez mais global.

O BIOSCAN permitirá a descoberta de plantas, animais, fungos, algas e seres unicelulares a um ritmo sem precedentes, além de aprofundar o conhecimento das simbioses entre as espécies e permitir monitorizar à escala global a dinâmica das comunidades biológicas. O sistema de identificação baseia-se em códigos de barras de ADN, análogos aos códigos de barras dos produtos comerciais, ao definir para cada espécie um conjunto específico de carateres genéticos.

“Conhecemos cerca de dois milhões de espécies, mas estima-se existirem possivelmente entre 10 a 20 milhões, há um trabalho gigante por fazer. Por isso, esperamos até 2026 compilar códigos de barras de ADN de pelo menos os cerca de dois milhões de espécies formalmente reconhecidas, revelando pelo caminho numerosas novas espécies", refere Filipe Costa, investigador do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) e professor do Departamento de Biologia da Escola de Ciências da UMinho. Por via da expansão da biblioteca global de códigos de barras de ADN, o BIOSCAN vai auxiliar na verificação da autenticidade de alimentos, na deteção facilitada de pragas agrícolas, no controlo de produtos nas alfândegas, na bioprospecção e na conservação da biodiversidade.

Ou seja, caminhamos para saber logo se a lata de conserva tem cavala ou sarda, se a planta do bosque tem perfil medicinal, se um mosquito é da espécie que transmite malária, se uma determinada erva é considerada invasora na União Europeia ou, então, inferir se determinada pesca é sustentável com base na ocorrência e distribuição das larvas de peixe.

O maior consórcio para a biodiversidade

Raia-de-quatro-olhos e o código de barras de ADN que a identifica(1)
“Através dos códigos de barras de ADN, pode-se também fazer avaliações em larga escala sobre o impacto das alterações ambientais na estrutura dos ecossistemas. Isso permitirá à humanidade gerar informação suficiente para formular políticas que protejam a biodiversidade global”, diz Filipe Costa. Com o mundo a perder espécies mais rápido do que elas são descobertas, os cientistas recorrem à tecnologia.

O BIOSCAN é o segundo projeto lançado pelo International Barcode of Life (iBOL), o maior consórcio de sempre para a biodiversidade, que tem por alvo de estudo todas as espécies multicelulares e ecorregiões do planeta. A UMinho, através de Filipe Costa, é a representante nacional. Este responsável já presidiu a secção europeia do subprojeto “Fish Barcode of Life” e contribuiu em especial para a compilação de uma biblioteca de códigos de barras de DNA para a vida marinha, detetando novas espécies de peixes e invertebrados de Portugal continental, Açores, Madeira e outros pontos da Europa. Coordenou ainda um projeto-piloto sobre a fiabilidade da aplicação dos códigos de ADN na identificação de espécies crustáceos.

O consórcio iBOL – liderado por Paul Hebert, da Universidade de Guelph (Canadá) – decidiu iniciar em 2010 uma proposta de inventariação da biodiversidade baseada no ADN. A primeira fase de trabalho durou até 2015, com o programa Barcode 500K, que gerou DNA barcodes para 500 mil espécies e teve 125 milhões de euros de investimento. A segunda fase, com o programa BIOSCAN, vai analisar até 2026 as interações entre espécies e estabelecer as bases de uma rede monitorização da biodiversidade para a terceira fase, designada Missão para a Biodiversidade Planetária, a qual pretende completar em vinte anos o inventário total da vida e implementar um sistema global de biovigilância. O site oficial é ibol.org/programs/bioscan.

Gabinete de Comunicação, Informação e Imagem - Universidade do Minho
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Ocupação humana na Sibéria nos últimos 31 mil anos

Estudo genético publicado na revista Nature revela novas evidências sobre ocupação humana na Sibéria ao longo dos últimos 31 mil anos. Sabe-se que o nordeste da Sibéria é habitado por humanos há mais de 40 mil anos. 

O crânio com 10 mil anos encontrado no local arqueológico perto do rio Kolyma - Crédito da foto Elena Pavlova
Os registos arqueológicos já descobertos deixavam antever a complexidade da história da ocupação humana desta região – um dos ambientes mais remotos e extremos a ser ocupado por humanos - mas a escassez destes registos não permitia ainda tirar conclusões sobre qual terá sido a dinâmica destas populações.

Os resultados do estudo agora publicado na revista Nature () – o primeiro a analisar e comparar 34 genomas antigos oriundos de restos mortais humanos encontrados em diferentes locais da Sibéria, desde há 31 000 anos até à atualidade – revelam que a história da ocupação humana da região envolveu no mínimo três migrações e subsequentes substituições em grande escala.

“A nossa hipótese inicial era de que as populações atuais da Sibéria descendiam dos humanos que se sabia terem vivido há cerca de 30 mil anos na Sibéria. Mas os genomas que analisámos ao longo da linha temporal desde esse passado remoto até hoje mostram grandes diferenças entre si – e contrariam essa hipótese. Por exemplo, as amostras com cerca de 30 mil anos são mais semelhantes às de indivíduos que vivem atualmente no oeste da Europa do que às de indivíduos das populações atuais da Sibéria”, explica Vítor Sousa, um dos autores deste artigo e investigador do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Entre os genomas antigos analisados estão os genomas extraídos de dois dentes de leite, que correspondem aos mais antigos restos mortais humanos encontrados até hoje na região, com cerca de 31 mil anos. Foram encontrados num grande local arqueológico na Sibéria, perto do Rio Yana. O local, conhecido como Yana Rhinoceros Horn Site – Yana RHS – foi encontrado em 2001 e possui mais de 2500 artefactos de ossos de animais e marfim, juntamente com ferramentas de pedra e evidências de habitação humana.

Este estudo também revela que um dos genomas analisados, correspondente aos restos mortais de um homem com 10 mil anos, encontrados num local próximo do rio Kolyma, na Sibéria, estão geneticamente relacionados com os indígenas americanos. Já se sabia que os humanos chegaram primeiro às Américas a partir da Sibéria até ao Alasca, através de uma ponte de terra que atravessava o estreito de Bering, submersa no final da última Era Glacial. Mas trata-se da primeira vez que tais ligações genéticas tão estreitas são descobertas fora dos Estados Unidos da América, representando uma peça-chave para a compreensão da genética dos ancestrais dos americanos nativos.

“As nossas estimativas mostram que há 31 mil anos a Sibéria era ocupada por uma população ancestral que chegou a estar distribuída por uma grande área, representada pelos genomas obtidos a partir dos dois dentes de leite encontrados perto do Rio Yana. Essa população depois desapareceu – foi quase totalmente substituída por uma população mais semelhante aos asiáticos, que colonizou a Sibéria há entre 15 e 29 mil anos, representada pela amostra do crânio do Rio Kolyma com cerca de 10 mil anos. Esta população é muito importante porque é a mais semelhante a todos os nativos americanos actuais. No entanto, na Sibéria, essa população também foi substituída numa terceira vaga migratória por populações do sudeste asiático, há entre 10 e 18 mil anos, ancestrais directas das populações actuais. Note-se que as vagas migratórias foram acompanhadas por trocas genéticas entre populações, por exemplo, a amostra de Kolyma tem entre 7% a 22% de Yana”, explica o investigador.

“Compreender a história da ocupação humana da Sibéria é muito importante para compreender a história da humanidade como um todo. Por um lado, porque se trata de uma região com um clima extremo e inóspito – o que nos ajuda a perceber como as alterações climáticas ao longo dos últimos milhares de anos afetaram as populações humanas. Por outro lado, por se tratar de uma região que esteve ligada à América por uma passagem de terra, pelo atual estreito de Bering, é crucial para compreender a colonização humana das Américas. Os nossos resultados mostram que a análise do ADN antigo consegue resolver muitas questões sobre a relação entre as populações actuais, e mostra que populações que se extinguiram podem ter deixado um legado genético importante”, explica Vítor Sousa, um dos investigadores que trabalhou nas análises genéticas deste estudo internacional, coordenado por Eske Willerslev, investigador da Universidade de Copenhaga (Dinamarca) e da Universidade de Cambridge (Reino Unido).

A par das análises genéticas, os investigadores desenvolveram também modelos climáticos para compreender como o clima evoluiu na região ao longo dos últimos milhares de anos. Embora não seja possível afirmar com certeza quais os fatores que determinaram o desaparecimento destas populações e subsequente substituição por outras populações durante vagas migratórias, os resultados da modelação climática sugerem que períodos de acentuado arrefecimento e de clima inóspito durante as últimas glaciações poderão estar relacionados com o seu desaparecimento.

As várias migrações que se verificaram no nordeste da Sibéria ao longo dos últimos 30 mil anos revelam que estas várias populações geraram a diversidade genética dos humanos contemporâneos que habitam uma vasta área da Eurásia e das Américas, representando uma parte significativa da história da humanidade. “Esta descoberta muda muito do que pensávamos saber sobre a história da população do nordeste da Sibéria, mas também sobre aquilo que sabemos sobre a história da migração humana como um todo”, afirma Martin Sikora, investigador do Lundbeck Foundation Centre for GeoGenetics (Dinamarca) e co-autor do estudo.

Referência do artigo:
Sikora M. et al. (2019) The population history of northeastern Siberia since the Pleistocene. Nature .


Gabinete de Comunicação do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

“Máquina de Ouver” da FCTUC distinguida na Rússia

Um projeto experimental inovador sobre tipografia reativa – letras que reagem e representam o som –, desenvolvido por João Couceiro e Castro no âmbito da sua dissertação de Mestrado em Design e Multimédia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), fez furor na Rússia, tendo arrecadado um dos nove cobiçados prémios do Festival Internacional de Moscovo Typomania.

Da esquerda para a direita: Penousal Machado, Ana Boavida e João Couceiro
Instituído em 2012, o Typomania é um festival anual dedicado à tipografia, caligrafia, lettering, motion-design, e design interativo. Tem como missão a divulgação de trabalho desenvolvido na exploração da letra, da palavra e da linguagem. O evento em destaque no festival é um concurso de vídeo tipográfico que distingue os 9 melhores trabalhos (um por cada letra do nome do festival). Nesta edição foram selecionados 40 dos cerca de 500 vídeos submetidos por 340 autores de 28 países e, pela primeira vez na história do festival, há um português entre os vencedores.

O jovem investigador do Centro de Informática e Sistemas da Universidade de Coimbra (CISUC) conquistou o júri com um vídeo realizado através da sua “ máquina de ouver ”, um sistema capaz de transformar gravações de voz em composições tipográficas desenvolvido no âmbito do seu mestrado, sob coordenação dos professores Ana Boavida, Pedro Martins e Penousal Machado.

Este sistema «representa visualmente a expressividade do discurso humano através da manipulação da letra. Dito de outra forma, traduzimos as caraterísticas do som em variáveis tipográficas, ou seja, alteramos as letras consoante as medições que extraímos do som (por exemplo, a duração das pausas entre palavras ou sílabas, a intensidade com que falamos, a frequência da voz, etc.) e tentamos representar visualmente a voz humana», explica o jovem natural de Coimbra.

Para o concurso, João Couceiro e Castro recorreu à sua “máquina” para gerar um vídeo onde se podem «“ouver” excertos do poema “Cantiga dos Ais” de Armindo Mendes de Carvalho, interpretado por Mário Viegas no programa “A Dificuldade está na Escolha — Poesia Portuguesa I” (07-04-1984), retirado do arquivo da RTP». E impressionou de tal forma o júri que um dos membros, o suíço Niklaus Troxler, afirmou que o trabalho do jovem português foi o seu «favorito dos favoritos» por ser «o mais simples e o mais forte». Niklaus Troxler é também membro da AGI - Alliance Graphique Internationale, considerada a elite do design mundial.

João Couceiro e Castro refere que gosta de «explorar a ligação entre a oralidade e a representação visual da linguagem. Ao longo do meu percurso académico sempre explorei o uso do som como matéria-prima no processo de design, mas foi em 2017, quando iniciei o mestrado em Design e Multimédia na FCTUC, que encontrei a forma ideal de conjugar as minhas áreas de interesse, focando-me nas propriedades acústicas responsáveis pela expressividade da fala e que, até então, não teriam forma de ser apresentadas na escrita de um modo sistemático».

Sobre possíveis aplicações para esta “máquina de ouver”, o aluno frisa que se trata de um projeto «experimental inovador, de caráter subjetivo, não se focando em qualquer aplicação em concreto». No entanto, tem potencial para ser usado, por exemplo, «na preservação de património que está unicamente de forma oral, que não existe escrito».

Para Penousal Machado, docente e diretor do CISUC, este prémio «confirma o reconhecimento crescente da qualidade da investigação desenvolvida na FCTUC na área do Design para Meios Computacionais. Por exemplo, vários alunos nossos estão nomeados para prémios importantes, como Sonae media art, European Design Awards e Independent Music Awards».

Elite mundial da ciência polar reúne-se em Coimbra para debater o efeito das alterações climáticas na vida da Antártida

Vinte e sete cientistas polares de 12 países vão reunir-se na Universidade de Coimbra (UC), entre 24 e 27 de junho, para identificar o progresso científico na região Antártica em relação às alterações climáticas nos últimos 10 anos na vida dos animais que lá vivem.

José Xavier. Créditos: Stacey Adlard 
Nesta reunião, cuja sessão de abertura decorre às 16 horas do dia 24 no Museu da Ciência, vão ser discutidos e analisados vários problemas que preocupam os cientistas que estudam a Antártida, entre os quais, o tipo de respostas dos animais às alterações climáticas, as mudanças no oceano Antártico no que respeita à vida dos animais marinhos, a adaptação e resiliência de espécies às alterações climáticas e o impacto da poluição na Antártida.

Deste encontro, que surge no âmbito do programa internacional SCAR AnT-ERA, resultará um documento que deverá ser publicado como um produto do Comité Científico para a Investigação Antártica (Scientific Committee on Antarctic Research – SCAR), por forma a ajudar todas as partes interessadas: decisores políticos, o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), mas também cientistas, as gerações mais jovens e o público em geral.

José Xavier, docente do Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) e investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), e um dos coordenadores (e único cientista português) do SCAR AnT-ERA, realça que esta iniciativa «reúne alguns dos melhores cientistas do mundo com o objetivo claro de se tentar perceber quais as espécies que irão sobreviver e quais as que se poderão extinguir numa região que mais tem sido afetada pelas alterações climáticas, com lições para o resto do planeta».

Por seu lado, Julian Gutt (Alfred Wegener Institute, Alemanha), coordenador-chefe do programa internacional SCAR AnT-ERA, evidencia que «estamos desejosos de reunir os mais recentes resultados sobre alterações em ecossistemas antárticos, desde pequenas algas aos carismáticos pinguins e baleias».

Já Enrique Isla, do Institut de Ciéncies del Mar (Espanha), também coordenador do programa, afirma que «esta iniciativa irá fornecer importantes informações para ações futuras na investigação e na criação de decisões políticas eficientes em direção a uma sociedade global sustentável».

ESO contribui para proteger a Terra de asteroides perigosos

O Very Large Telescope do ESO permitiram obter imagens muito nítidas de um asteroide duplo que passou próximo da Terra no dia 25 de Maio.

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As capacidades únicas do instrumento SPHERE, montado no Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), de que Portugal é membro, permitiram obter imagens muito nítidas de um asteroide duplo que passou próximo da Terra no dia 25 de Maio. Apesar deste asteroide não ser um objeto perigoso, os cientistas aproveitaram a oportunidade para testar respostas a objetos do mesmo tipo que possam constituir uma ameaça para a Terra (Objetos Próximos da Terra), mostrando assim que a tecnologia de vanguarda do ESO pode revelar-se crítica na defesa do nosso planeta.

A Rede Internacional de Alerta de Asteroides (IAWN, sigla do inglês) coordenou uma campanha de observação, que envolveu diversas organizações, do asteroide 1999 KW4 quando este passou próximo da Terra, chegando a uma distância mínima do nosso planeta de 5,2 milhões de km [1] no dia 25 de Maio de 2019. O 1999 KW4 tem uma dimensão de cerca de 1,3 km e não constitui qualquer perigo para a Terra. Uma vez que a sua órbita é bem conhecida, os cientistas puderam prever esta passagem e preparar uma campanha de observação.

O ESO juntou-se à campanha com a sua infraestrutura emblemática, o Very Large Telescope (VLT). O VLT está equipado com o SPHERE — um dos poucos instrumentos do mundo capaz de obter imagens suficientemente nítidas para distinguir os dois componentes do asteroide, os quais estão separados de cerca de 2,6 km.

O SPHERE foi concebido para observar exoplanetas; o seu sistema de óptica adaptativa de vanguarda corrige a turbulência atmosférica, fornecendo-nos imagens tão nítidas como se o telescópio estivesse no espaço. O instrumento está igualmente equipado com coronógrafos que diminuem o brilho das estrelas, tornando assim possível observar os exoplanetas ténues que as orbitem.

Tirando uma folga do seu trabalho noturno usual de caçador de exoplanetas, as observações do 1999 KW4 obtidas pelo SPHERE forneceram dados que ajudaram os astrónomos a caracterizar o asteroide duplo. Em particular, é agora possível sabermos se o asteroide mais pequeno tem a mesma composição que o objeto maior.

“Estes dados, combinados com todos os outros obtidos pelos vários telescópios da campanha IAWN, serão essenciais para avaliar estratégias eficazes de deflexão de asteroides, na eventualidade de encontrarmos um destes objetos em rota de colisão com a Terra,” explica o astrónomo do ESO Olivier Hainaut. “No pior dos casos, este conhecimento é igualmente essencial para prever como é que um asteroide interagiria com a atmosfera e superfície terrestres, permitindo-nos assim mitigar os estragos na eventualidade de uma tal colisão.”

“O asteroide duplo passou pela Terra com a velocidade de 70 000 km/h, o que tornou as observações do VLT bastante difíceis,” disse Diego Parraguez, que operou o telescópio. O astrónomo precisou de usar toda a sua perícia para conseguir apontar o telescópio ao rápido asteroide e capturá-lo com o SPHERE.

Bin Yang, astrónomo no VLT, declarou “Quando vimos o asteroide nas imagens corrigidas por óptica adaptativa, ficámos muito entusiasmados. Nesse momento sentimos que todas as dificuldades e esforços tinham valido bem a pena.” Mathias Jones, outro astrónomo do VLT envolvido nestas observações, falou das dificuldades sentidas. “As condições atmosféricas estavam um pouco instáveis. Adicionalmente, o asteroide é relativamente ténue e move-se muito depressa no céu, o que dificultou bastante as observações e faz com que o nosso sistema de óptica adaptativa bloqueasse diversas vezes. Foi extraordinário ver que no fim todo o nosso trabalho valeu a pena, apesar das dificuldades!”

Apesar de não representar nenhum perigo para a Terra, o 1999 KW4 é bastante parecido com outro sistema binário de asteroides chamado Didymos que poderá constituir uma ameaça para a Terra num futuro distante.

Didymos e o seu companheiro “Didymoon” são o alvo de uma futura experiência pioneira de defesa planetária. A sonda DART da NASA irá chocar com Didymoon numa tentativa de alterar a sua órbita em torno do seu irmão maior, num teste pensado para determinar a viabilidade de deflexão de asteroides. Após o impacto, a missão Hera da ESA irá em 2026 observar os asteroides Didymos de modo a obter as suas características, incluindo a massa de Didymoon, as propriedades da sua superfície e a forma da cratera de impacto da DART.

O sucesso de tais missões depende de colaborações entre organizações e o seguimento de Objetos Próximos da Terra é um ponto principal da colaboração entre o ESO e a ESA. Este esforço cooperativo ocorre já deste o primeiro seguimento bem sucedido de um destes objetos potencialmente perigosos que foi levado a cabo no início de 2014.

“Estamos muito contentes por poder desempenhar um papel na defesa da Terra contra asteroides,” disse Xavier Barcons, Diretor Geral do ESO. “Para além de estarmos a usar as capacidades sofisticadas do VLT, estamos também a trabalhar com a ESA para criar protótipos para uma grande rede de deteção, seguimento e caracterização de asteroides.”

Este encontro recente com o 1999 KW4 ocorre um mês antes do Dia do Asteroide, um dia oficial das Nações Unidas para a educação e tomada de consciência relativa a asteroides, que será celebrado a 30 de Junho. Haverá eventos a ocorrer em cinco continentes e o ESO estará entre as principais organizações astronómicas que participam. O Planetário & Centro de Visitantes Supernova do ESO oferecerá nesse dia aos seus visitantes uma enorme variedade de atividades sobre asteroides, estando o público desde já convidado a participar nestas celebrações.

Observatório Europeu do Sul
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Investigadores da FCTUC desenvolvem software para nova geração de robôs colaborativos

Um novo software – o primeiro de interface em MATLAB - para robôs colaborativos KUKA (um dos líderes mundiais de robótica), desenvolvido no Laboratório de Robótica Colaborativa da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), já está a ser utilizado em grandes empresas, como é o caso do Grupo BMW, na Alemanha, e em várias universidades de todo o mundo.

Mohammad Safeea
O “Kuka Sunrise Toolbox”, assim batizado pelos autores, é um software de licença livre e dispõe de mais de 100 funcionalidades, permitindo, por exemplo, o controlo dos movimentos do robô e guiamento manual de precisão. Funcionalidades de matemática e algoritmos avançados estão também disponíveis, nomeadamente para utilização em trabalhos de investigação.

Mohammad Safeea, o principal investigador deste projeto, cujos resultados foram publicados na “IEEE Robotics & Automation Magazine”, revista de referência internacional em robótica, explica que «este software permite que um utilizador com conhecimentos básicos em robótica possa em poucas horas estar a operar um robô, não sendo necessário conhecimentos avançados e grandes tempos de adaptação ao equipamento. É bom saber que este trabalho de mais de dois anos está a criar um impacto positivo na sociedade».

Por seu lado, Pedro Neto, responsável pelo Laboratório de Robótica Colaborativa da FCTUC, salienta que «pretendemos que os robôs sejam acessíveis a qualquer pessoa, por isso este software é um contributo nesse sentido. Este é um ponto-chave considerando que os robôs colaborativos trabalham lado a lado com os humanos, por exemplo em fábricas ou hospitais, e onde a interação com o equipamento é constante e contínua ao longo do dia».

«As moléculas orgânicas são fundamentais para o nosso modo de vida»

Entrevista a Nuno Maulide , Professor Catedrático de Química Orgânica na Universidade de Viena.

Nuno Maulide
Pode descrever de forma sucinta (para nós, leigos) o que faz profissionalmente?


A nossa investigação prende-se com a síntese de moléculas orgânicas, isto é, moléculas que são compostas essencialmente por átomos de carbono e hidrogénio. As moléculas orgânicas são fundamentais para o nosso modo de vida: a esmagadora maioria dos medicamentos que tomamos quando estamos doentes, os têxteis com que nos vestimos, os cosméticos e produtos de higiene e limpeza que utilizamos, os materiais de que são feitos os nossos smartphones ou os painéis solares de maior eficiência – todos são compostos de moléculas orgânicas e a lista podia alongar-se quase ad infinitum. O problema é que a maioria destas moléculas são sintetizadas usando reacções que geram por vezes muitos produtos secundários – o nosso grupo procura, pois, desenvolver reacções mais eficientes e com menos “lixo”.

Agora pedimos-lhe que tente contagiar-nos: o que há de particularmente entusiasmante na sua área de trabalho?

A síntese de uma molécula de estrutura complexa, com uma função valiosa (por exemplo: um promissor novo agente anti-cancro com elevada selectividade), pode ser comparada com a concepção e construção de uma casa. Há que decidir: que tipo de tijolos vamos utilizar? Que portas e que janelas vamos escolher? Em que sequência construimos a casa? Há também muita liberdade do ponto de vista estético e, porque estamos em ambiente académico, onde é fundamental questionar paradigmas e desafiar dogmas instalados. A imaginação é o limite. Ninguém nos impede de tentar construir a casa começando pelo telhado ou usando apenas três blocos pré-fabricados ou misturar elementos de estética Vitoriana com uma estrutura do século XXI: um exercício fascinante de criatividade e persistência!

Por que motivos decidiu fazer períodos de investigação no estrangeiro e o que encontrou de inesperado nessa realidade académica?

Em 2001, ainda estudante de Licenciatura no Técnico, comecei a aperceber-me de que poderia ser muito útil realizar o trabalho final de curso no estrangeiro para obter outras perspectivas da minha área de predilecção, a Química Organica. Os caminhos que segui até acabar por realizar dois períodos consecutivos de seis meses na Suíça e depois na Bélgica davam um romance (risos). O mais inesperado que encontrei no grupo de investigação a que me juntei como estudante Erasmus na Bélgica foi um ambiente de investigação muito dinâmico e entusiasmante, com muitos estudantes de doutoramento e mais de 30 projectos de pesquisa diferentes. Até hoje não terei visitado outro grupo de pesquisa em Quimica com tamanha diversidade de temas – a prática corrente em ciência é as pessoas especializarem-se em determinados sub-domínios de uma (sub)disciplina, mas essa não era de todo a abordagem que o meu orientador de Erasmus (Prof. István Markó, que viria a ser também o orientador de Doutoramento, na Universidade Católica de Louvain, entretanto falecido em 2017) preferia. E quando a investigação é bem feita, é mesmo assim – as pessoas devem ter liberdade para escolher o caminho que pretendem trilhar independentemente do que seja o habitual ou standard.

Que apreciação faz do panorama científico português, tanto na sua área como de uma forma mais geral?

Há pessoas excelentes a fazer investigação em condições relativamente complicadas em Portugal, sobretudo na área da Química. O que talvez falte no nosso país é uma estratégia coerente de desenvolvimento que seja independente do poder político, aliada a um plano e perspectiva de carreira que permitam aos investigadores realmente poderem abraçar projectos de alto risco com alguma segurança em termos pessoais.

Que ferramentas do GPS lhe parecem particularmente interessantes, e porquê?

A rede GPS é um conceito inovador que procura mapear e interligar os investigadores portugueses fora do país. Este levantamento é muito importante, até porque na realidade nao sabemos quantos são, onde estão e o que fazem. É uma plataforma com enorme mais-valia porque este mapeamento e interacção entre investigadores portugueses de outra forma não seria possível.

GPS/Fundação Francisco Manuel dos Santos
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“A luz pesa”: quando Einstein se tornou Einstein

No dia 29 de Maio de 1919 – fez há poucos dias exactamente cem anos – observações realizadas na ilha do Príncipe, então uma colónia portuguesa, e na cidade de Sobral, no Nordeste do Brasil, de um eclipse solar total permitiram confirmar uma previsão efetuada quatro anos antes, em 1915, por Albert Einstein relativas ao desvio de raios de luz emitidos por estrelas que se encontravam na região do céu por detrás do Sol. 

A antiga teoria de Newton previa o valor de 0,87’’ de arco para o desvio na posição das estrelas, mas a teoria de Einstein previa o dobro, 1,74’’. Quem teria razão? O valor era muito pequeno, mas era mensurável com o equipamento da época: câmaras fotográficas aplicadas a telescópios. As observações penderam claramente para o lado de Einstein, que assim se tornou uma celebridade. Foi nessa altura que Einstein, então com 40 anos, se tornou o famoso Einstein, um ídolo da ciência.

O sábio, quando lhe perguntaram o que teria pensado se o resultado tivesse sido diferente, respondeu: “Nesse caso, eu teria pena do Bom Deus. A teoria está correcta.” Convém lembrar que Einstein usava a palavra Deus como metáfora da Natureza ou, melhor, da harmonia da Natureza. Para ele, “pensamentos de Deus” era uma expressão que queria significar leis da Natureza. Ter pena de Deus significava lamentar que a Natureza não seguisse uma teoria que era não só coerente como bela, e que por isso era verdadeira.

As notícias do triunfo das ideias de Einstein só chegaram à imprensa passados uns meses mais de cinco meses após as observações, uma vez que os cientistas tiveram de medir as posições nas chapas fotográficas. O jornal “Times” de Londres do dia 7 de Novembro anunciou em título: “Revolução na ciência / Nova teoria do Universo / Ideias de Newton derrubadas”, e dois dias depois o jornal “New York Times”, do outro lado do Atlântico, titulava: “As luzes estão tortas no céu / Homens da ciência na expectativa quanto aos resultados do eclipse/ A teoria de Einstein triunfa / As estrelas não estão onde pareciam estar ou deviam estar, mas ninguém precisa de se preocupar.” A 15 de Novembro subtitulava “O Século” de Lisboa num tom poético: “A luz pesa,” depois do título “Descobertas científicas.”

Nesse encontro, com Newton a observar de dentro da moldura do seu quadro pendurado na parede, foram anunciados ao mundo os resultados das observações do eclipse que “canonizaram” Einstein, não tendo sequer faltado um “advogado do diabo”, cujas alegações contrárias não tiveram acolhimento. Reportou o referido jornal português: “No Príncipe, apesar de se ter apresentado nebulosa a atmosfera, conseguiu-se obter algumas fotografias, em que ficava perfeitamente comprovado que a luz estelar sofre uma inflexão ao passar junto da orla do disco solar. Em Sobral, os resultados foram ainda mais numerosos e patentes, Os sábios reunidos para examinar as fotografias obtidas e ouvir as explicações dos expedicionários, tiveram de admitir que, com efeito, a luz aparece atraída pela gravitação solar, isto é, que a luz pesa.”

Nenhum astrónomo português esteve presente no Sobral, o que contrasta com a expedição ao Brasil, na qual os britânicos tiveram a companhia de uma equipa brasileira. Em 1925 Einstein, que tinha recebido o Prémio Nobel da Física de 1921, foi recebido no Rio de Janeiro com todas as honras. Não se esqueceu de referir que a sua teoria tinha sido confirmada pelo “céu radiante do Brasil.” Na sua viagem de barco para o Brasil parou em Lisboa, onde não foi reconhecido. Mas ele, conforme deixou registado no seu diário, apreciou os monumentos históricos portugueses e reparou, em particular, na graciosidade das varinas que vendiam o peixe. Foi ao Brasil gabar os encantos das mulheres portuguesas…

Carlos Fiolhais (Professor da Universidade de Coimbra)
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Matéria escura poderá ser uma relíquia da inflação

O inflatão, a partícula que poderá ter sido responsável por um período de expansão extremamente rápido no princípio do Universo designado por inflação, poderá também constituir a matéria escura, cuja origem permanece desconhecida. 

Os investigadores Luís Ventura e João Rosa 
A teoria é assinada por uma equipa de investigadores da Universidade de Aveiro (UA) que mostra, em particular, que esse cenário é uma consequência natural dos cenários de inflação quente, em que o Universo não arrefece drasticamente durante a inflação.

O trabalho, assinado por João Rosa e Luís Ventura, cientistas do Departamento de Física e do Centro de Investigação e Desenvolvimento em Matemática e Aplicações da UA, foi publicado este mês na prestigiada Physical Review Letters.

A teoria da inflação foi proposta em 1981 pelo físico americano Alan Guth, postulando a existência de uma nova partícula – o inflatão – que nas primeiras frações de segundo da sua existência levou a que o Universo se expandisse muito rapidamente, acabando por ficar extremamente uniforme, como o observamos hoje.

Nos modelos convencionais de inflação fria, a expansão rápida leva a que a temperatura do Universo decresça muito rapidamente durante a inflação (tal como um gás arrefece quando expande). No final deste período, os inflatões transformam-se nas partículas que conhecemos, como o eletrão e o fotão (partículas de luz), num processo semelhante ao decaimento radioativo, e a energia assim libertada é usada para “reaquecer” o Universo.

Nos modelos de inflação quente, pelo contrário, os inflatões transferem energia para o plasma cósmico sob a forma de calor, mantendo o Universo a uma temperatura elevada, sem haver necessidade de o “reaquecer” no final. Apesar de esta ideia ter mais de duas décadas, só em 2016 foi possível desenvolver um modelo teórico apelativo para a inflação quente, num artigo da coautoria do investigador João Rosa e também publicado na prestigiada revista americana Physical Review Letters.

Modelo da UA abre novos caminhos

No contexto deste modelo, a equipa da UA mostrou pela primeira vez que os inflatões não se transformam noutras partículas após o final da inflação, apenas interagindo significativamente com outras partículas, incluindo os fotões, a temperaturas suficientemente elevadas que o Universo só atingiu durante a inflação. Isto significa que os inflatões não desapareceram, apesar de não os conseguirmos ver visto a sua interação com a luz ser hoje extremamente débil.

Desde 1933, através das observações do enxame de galáxias Coma realizadas pelo astrónomo suíço Fritz Zwicky, sabe-se que mais de 80 por cento da matéria no Universo é escura, isto é, não emite luz, e apenas conseguimos inferir a sua presença através da força gravitacional que esta exerce sobre a matéria luminosa e que altera, por exemplo, a velocidade com que as estrelas rodam em torno do centro das galáxias.

Sabe-se também que esta matéria escura é também relativamente fria, pois caso contrário teria impedido a formação das galáxias e outras estruturas cósmicas como os enxames e super-enxames de galáxias que hoje pintalgam o Universo observável.

Os inflatões que, segundo o modelo desenvolvido na UA, sobreviveram desde o período de inflação até aos dias de hoje têm exatamente estas propriedades. Além de praticamente não emitirem luz, são extremamente frios, essencialmente por terem perdido energia sob a forma de calor durante a inflação para manter o Universo quente e depois deixado de interagir com o plasma cósmico. Assim, se a hipótese dos investigadores da UA estiver correta, a inflação e a matéria escura poderão ser explicadas por uma só nova partícula.

No contexto da inflação fria, é bastante difícil que os inflatões se transformem noutras partículas (libertando energia suficiente para reaquecer o Universo) e que simultaneamente alguns sobrevivam até aos dias de hoje. No cenário de inflação quente, a unificação da inflação e da matéria escura é natural, porque os inflatões não só não se terão convertido em matéria luminosa como também ter-se-ão mantido frios durante os milhares de milhões de anos de expansão do Universo após a inflação.

Além disso, este modelo pode ser testado de diversas formas, e com tecnologia que deverá estar disponível nos próximos anos. Por sobreviverem até aos dias de hoje, os inflatões terão provocado ligeiras alterações na abundância cósmica dos elementos químicos mais leves como o Hidrogénio ou o Hélio. Terão também deixado a sua marca nas pequenas flutuações na temperatura da Radiação Cósmica de Fundo, uma relíquia do plasma cósmico primordial.

A forma como a temperatura desta radiação de micro-ondas varia no céu poderá dizer-nos inequivocamente se o Universo se manteve ou não quente durante a inflação e se os inflatões são ou não a matéria escura. Resta esperar por observações astronómicas mais precisas para perceber se uma só partícula chega para resolver estes dois importantes mistérios do cosmos.

Quanta água e alimentos precisamos até 2050?

Novo estudo avalia necessidades globais de água e alimentos até 2050 para garantir futuro sustentável.

Um novo estudo agora publicado na revista Nature Sustainability apresenta uma nova avaliação integradora das necessidades globais de água e alimentos até 2050, tendo em conta o aumento da população mundial e a proteção dos ecossistemas aquáticos. Os resultados indicam que, para corresponder de forma sustentável à procura crescente de alimentos, será necessário redistribuir culturas agrícolas a nível regional, adoptar práticas agrícolas mais sustentáveis e aumentar o comércio internacional de alimentos.

Os recursos globais de água doce estão sob crescente pressão. Atualmente, cerca de 70% da água doce a nível global é utilizada para culturas agrícolas irrigadas, que asseguram cerca de 40% dos alimentos a nível mundial. As Nações Unidas prevêem que a população mundial alcance os 9 mil milhões de pessoas até 2050, o que irá aumentar a pressão sobre a necessidade de água no futuro.

No trabalho agora publicado, os investigadores desenvolveram uma nova avaliação integrada das necessidades globais de alimentos e água até 2050, e de como estes recursos limitados se relacionam entre si, com o objetivo de perceber de que forma devem ser geridos os recursos hídricos tendo em conta as necessidades humanas e os requisitos dos ecossistemas de forma a garantir um futuro sustentável.

“Os resultados revelam que, para produzir a nossa alimentação de forma sustentável e respeitando as necessidades ambientais, será necessário expandir a área de terra utilizada para agricultura em 100 milhões de hectares – aproximadamente 100 milhões de estádios de futebol – até 2050, de forma a corresponder às necessidades de alimento tendo em conta o aumento da população mundial. Para que tal seja possível, tendo em conta os recursos hídricos limitados, será necessário reduzir as culturas intensivas em áreas secas e redistribuir a produção agrícola de alimentos em regiões abundantes em água”, explica Amandine Pastor, colaboradora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e primeira autora deste estudo. Amandine Pastor é também investigadora do Instituto de Investigação para o Desenvolvimento (IRD), em França.

Esta é uma das primeiras avaliações integradoras que quantifica de forma rigorosa o efeito da proteção dos ecossistemas aquáticos nas captações de água, na produção global de alimentos e nos fluxos comerciais: os resultados do estudo indicam que será necessário um fluxo adicional de 10% a 20% de comércio desde regiões abundantes em água para regiões com escassez de água a fim de respeitar as regulações ambientais que asseguram a saúde dos ecossistemas – sendo que os principais fluxos comerciais vão da América Latina para o Médio Oriente e China.

Para este estudo, os investigadores utilizaram cenários de mudanças climáticas e cenários de mudanças socioeconómicas desenvolvidos pela comunidade científica para o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) e compilaram vários conjuntos de dados, incluindo dados sobre restrição do uso de água de forma a respeitar os requisitos de conservação dos ecossistemas de água doce.

“É importante perceber que os recursos naturais são limitados. Os resultados do nosso estudo indicam que será possível manter a segurança alimentar e os requisitos de conservação dos ecossistemas de água doce até 2050, apesar da crescente poluição e dos crescentes impactos das mudanças climáticas. Mas, para que isso seja possível, devem ser adoptadas práticas sustentáveis e inovadoras, como cultivar em zonas agro-climáticas apropriadas – por exemplo, plantar culturas menos intensivas em água em áreas secas -, desenvolver a agricultura urbana e vertical e reduzir o consumo de carne na dieta humana”, conclui Amandine Pastor.

Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

O céu de junho de 2019

Junho é o mês em que Júpiter e Saturno voltam a ser visíveis logo no início da noite, e que nos vão acompanhar nos meses de verão. No início do mês, Júpiter nasce ao pôr-do-Sol, nascendo cada vez mais cedo de dia para dia. 

Figura 1: O céu virado a Noroeste, às 22:15 do dia 16 de junho, com os planetas Marte e Mercúrio, na constelação dos Gémeos, praticamente “colados” um ao outro (Imagem: Ricardo Cardoso Reis/Stellarium).
No final do mês este planeta está já cerca de 20 graus acima do horizonte, ao anoitecer. Já Saturno nasce praticamente à meia-noite no início do mês, mas no fim do mês já está visível ao anoitecer. No dia 3 a Lua está em fase de nova e no dia 5, um fino crescente da Lua passa a 3 graus do planeta Marte, ao anoitecer.

No dia 10 a Lua atinge o quarto crescente e nesse mesmo dia, Júpiter atinge a oposição (ponto em que o planeta está oposto ao Sol, no céu). Este é também o ponto em que o planeta está mais próximo da Terra, e por isso, em que está mais brilhante no nosso céu.

A estrela avermelhada à direita de Júpiter é Antares, uma supergigante vermelha a aproximadamente 550 anos-luz. Esta estrela é cerca de 750 vezes maior que a nossa estrela, ou seja, se estivesse no lugar do Sol, ocuparia todo o espaço até um pouco para lá da órbita de Marte.

Figura 2: O céu virado a Sudeste, às 22:00 do dia 30 de junho, com os planetas Júpiter e Saturno já acima do horizonte (Imagem: Ricardo Cardoso Reis/Stellarium).
Esta estrela é conhecida como o coração do Escorpião, e embora as histórias divirjam, quase todas concordam que este Escorpião terá sido o que matou Orion, razão pela qual, no céu, Orion e Escorpião estão em lados opostos, para nunca se encontrarem. Assim, Orion é uma constelação que se vê melhor no inverno, enquanto o Escorpião vê-se melhor durante o verão.

No dia 16 a Lua, praticamente cheia, passa a apenas 2 graus de Júpiter, e no dia seguinte atinge a fase de lua cheia. Dia 18 os planetas Mercúrio e Marte estão praticamente um em cima do outro, a menos de meio grau um do outro, com os ambos visíveis ao anoitecer, virados mais ou menos a Noroeste. Na madrugada de 18 para 19 a Lua passa a 1 grau do planeta Saturno.

No dia 21 de junho, às 16:54, ocorre o solstício de Verão (no hemisfério Norte). Neste dia, o Sol atinge o ponto mais alto no céu (e passa mais tempo acima do horizonte) em todo o ano. Neste dia o Sol em Bragança nasce às 5:52 e põe-se às 21:05, enquanto no Porto nasce às 6:02 e põe-se às 21:11. Em Coimbra o dia dura das 06:04 às 21:07, em Lisboa das 06:12 às 21:05 e em Faro das 06:12 às 20:55. No Funchal (arquipélago da Madeira) o Sol nasce às 07:00 e põe-se às 21:19. Já em Ponta Delgada (nos Açores), nasce às 06:21 e põe-se às 21:08. Finalmente, no dia 25, a Lua atinge a fase de quarto minguante.

Boas observações.

Ricardo Cardoso Reis (Planetário do Porto e Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço)
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Canetas e mãos: para o cérebro é quase a mesma coisa

Qual é a semelhança entre uma mão e uma caneta? À partida, nenhuma, mas os cientistas sabem que, por alguma razão, estes objetos estão intimamente ligados no nosso cérebro.

 Lénia Amaral
O reconhecimento de objetos é feito em frações de segundo, sendo o córtex visual a zona onde este processamento de informação é feito. Sabe-se que diferentes categorias de objetos ativam áreas diferentes nesta mesma região. No entanto, a visualização de mãos e objetos manipuláveis (como uma caneta ou um martelo) ativam duas áreas cérebro em comum. E ninguém sabe muito bem porquê.

O processamento visual no cérebro inicia-se no córtex visual primário (área cinzenta), podendo percorrer a via dorsal (área verde), que é responsável pela interação visual e motora com objetos, ou a via ventral (área lilás), relacionada com a identificação dos objetos através da forma.

O objetivo é perceber como é que estas categorias que, à partida, não teriam muito a ver uma com a outra, se relacionam”, diz Lénia Amaral, aluna de Doutoramento no Proaction Lab , Universidade de Coimbra. Para isso utiliza técnicas de eletroestimulação para ativar ou inibir áreas específicas no cérebro - uma técnica chamada de tDCS. “O nosso objetivo com a tDCS é exatamente perceber o que é que pode estar aqui em causa” Compreender o funcionamento do cérebro é essencial para desenvolver tratamentos para áreas do cérebro que fiquem danificadas, por exemplo, após um acidente vascular cerebral. “Se percebemos que processos cognitivos é que são afetados nestas lesões, a sua reabilitação poderá ser mais fácil”, continua a estudante.

Lénia Amaral vai apresentar a sua investigação usando uma linguagem acessível a não-especialistas no dia 16 de maio, enquanto participante da iniciativa PubhD Coimbra , a realizar-se pelas 22h no Aqui Base Tango. A jovem investigadora deixa o convite para uma “aula no jeito de conversa” sobre o que se poderá estar a passar, afinal, na nossa cabeça.

Daniel Ribeiro (Proaction Lab)
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

Projeto europeu liderado pela FCTUC dá passo decisivo para aumentar eficiência na produção de energia eólica

Para se conseguir aumentar a produção de energia eólica são necessárias torres metálicas mais altas do que as atuais, que não vão além dos 100 a 120 metros, capazes de suportar turbinas mais potentes. O problema, na construção tubular em aço, é que esse aumento de altura implica um maior diâmetro do tubo, que vai para além dos limites permitidos no transporte em vias públicas. Por outro lado, o custo de instalação aumenta exponencialmente devido à necessidade de utilização de gruas de maior altura.

Carlos Rebelo
Este grande obstáculo à evolução da energia eólica poderá ter os dias contados graças a uma solução desenvolvida por um consórcio europeu liderado por Carlos Rebelo, docente e investigador do Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC).

O projeto SHOWTIME, acrónimo de “Steel Hybrid Onshore Wind Towers Installed with Minimum Effort”, foi realizado durante os últimos três anos em parceria com várias instituições europeias de investigação e empresas ligadas à construção em aço, com um financiamento de cerca de dois milhões de euros da Comissão Europeia através do programa Research Fund for Coal and Steel (RFCS).

A solução proposta consiste, tal como o título do projeto sugere, num sistema eficiente de instalação baseado numa estrutura em forma de treliça. «Apostou-se numa solução eficaz e economicamente sustentável alicerçada numa torre híbrida, constituída por uma parte em treliça e uma parte tubular. Basicamente, a nossa solução é idêntica à estrutura das torres de suporte de linhas elétricas, mas muito mais forte e resistente porque as forças que estão envolvidas são também muito maiores. Esta estrutura, que inclui um sistema de elevação, permite que as torres possam ser montadas no local de construção sem a necessidade de gruas de grande envergadura, dado que os tubos de aço poderão ter menores dimensões», explica o coordenador do projeto SHOWTIME.

As vantagens das torres treliçadas são várias, refere o especialista em engenharia de estruturas da FCTUC, principalmente «design e modelagem simples, bom comportamento dinâmico (ideal para turbinas eólicas), redução de custos de fabricação e economia de transporte, já que são mais fáceis e mais leves de transportar quando comparadas com estruturas tubulares atuais».

Com esta tecnologia, num futuro próximo poderemos ter torres eólicas onshore muito mais altas – a solução desenvolvida está direcionada para torres com 220 metros-, tornado exequível a instalação de turbinas com maior potência. Para se ter uma ideia, a solução desenvolvida pelo consórcio permite «instalar turbinas com potência 10 vezes superior à das atuais, possibilitando que uma só turbina triplique a produção de energia, ou seja, a produção de energia a partir do vento pode aumentar significativamente», nota Carlos Rebelo, realçando ainda que «o desenvolvimento de conceitos estruturais inovadores é um passo decisivo para aumentar a competitividade da energia eólica».

Durante a execução do projeto foram realizados vários ensaios em laboratório e construído um protótipo à escala reduzida 1:4, que foi testado nas instalações de um dos parceiros industriais portugueses (Martifer). A equipa está agora em contacto com a indústria do setor eólico para testar a tecnologia à escala real. Imagens e vídeo do processo de montagem e de elevação do teste realizado estão disponíveis para visualização: aqui.

O projeto SHOWTIME teve a participação da Lulea University of Technology (Suécia), Technical University of Aachen (Alemanha), University of Birmingham (Reino Unido), Steel Construction Institute (Reino Unido); e das empresas SIDENOR (Espanha), Martifer (Portugal) e Friedberg (Alemanha).

PubhD UMinho de Maio trata de assuntos das Ciências de Comunicação e de Engenharia Têxtil

A sessão de Maio do PubhD UMinho traz para a mesa do Barhaus, em Braga, dois comunicadores: um trabalha com cientistas, outro com moda e criatividade. O que os une é mais do que aquilo que os separa, mas é para ouvir falar das diferenças que o público será chamado a participar. Encontro marcado para o dia 23 de maio, pelas 21h15. Entrada gratuita.

PubhD UMinho de Maio trata de assuntos das Ciências de Comunicação e de Engenharia Têxtil
Nuno Passos - Ciências da Comunicação 
Entre cientistas e jornalistas venha o comunicador e resolva 

O processo de mediação é exigente em qualquer situação, mas quando um comunicador é chamado a mediar a interação entre cientistas e jornalistas essa exigência amplifica-se. Nuno Passos, Mestre em Ciências da Comunicação, conhece bem essas dificuldades.

No seu projeto de investigação, realizado no Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho, aprofundou dinâmica de tensões permanentes entre “mundos” que funcionam com objetivos e singularidades distintas.

Cientistas e jornalistas “precisam perceber melhor a realidade mútua” explica o investigador. A mediação entre cientistas e jornalistas, defende, “requer especialistas na área, com respostas rápidas, eficazes, que protejam o cientista e também a instituição, à qual pertence”. E a resposta envolve estratégias integradas e que envolvam todos os atores. Uma tarefa difícil, pois embora muito importante e centrada no cientista, afirma, “a atividade de comunicar ciência, sendo recente e gerando dúvidas, está ainda no fundo da lista de muitos cientistas e professores”.

Valesca Bender – Engenharia Textil 
Criatividade e inovação para encontrar novos caminhos 

Somos os únicos responsáveis por criar aquilo que é novo” é o ponto de partida para a reflexão de Valesca Bender, que iniciou em 2017 o seu mestrado em Comunicação de Design de Moda, no Departamento de Engenharia Têxtil da Universidade do Minho.

No seu projeto trabalha conceitos como a criatividade, a empatia, a experiência e o design thinking e a sua relevância para “revolucionar transformações significativas” enquanto fatores de diferenciação facilitadores de penetração no mercado.

Formada em design de produto e pós-graduada em arquitetura e design de interiores para o mercado de luxo, Valesca Bender sabe reconhecer o valor do jogo entre criatividade, inovação e design empático. “É preciso coragem e deixar que o amor vença o medo de reaprender a sermos mais criativos, já que velhos mapas não levam a novos caminhos e talvez os mais rebeldes tenham o GPS do futuro rumo às mudanças” afirma a investigadora.

«Estamos a colher os frutos de um investimento de décadas na ciência portuguesa»

Entrevista a Gilda Lopes , post-doc na Universidade de Bergen, Noruega, e investigadora na Universidade do Algarve.

Fotografia tirada por Gunn Mangerud, em 2014, na ilha de Bjørnøya (Arquipélago de Spistbergen, Círculo Polar Ártico.
Pode descrever de forma sucinta (para nós, leigos) o que faz profissionalmente?

O meu campo de especialização leva-me à descoberta de esporos, pólenes e fitoplâncton fossilizados. Normalmente trabalho com material mais antigo do que os dinossáurios, são fósseis microscópicos com centenas de milhões de anos. Graças ao seu diminuto tamanho, estes fósseis depositam-se no solo, no fundo de um lago ou do mar, e acabam por ser incorporados em rochas sedimentares durante o processo de formação destas. Para poderem ser observados hoje em dia, passam por um processo laboratorial moroso no qual é destruída toda a componente mineral da rocha ficando apenas os resíduos orgânicos que podem conter desde esporos, pólenes, algas, ou mesmo pequenos pedaços de vegetação, os quais são identificados ao microscópio. Neste momento estou a iniciar um projeto na Universidade do Algarve (PALEOCLIMOZ), no qual vou estudar esporos e pólenes com cerca 300 a 250 milhões de anos provenientes de Moçambique. Este fascinante mundo microscópico é geralmente desconhecido do público em geral e, com esta entrevista pretendo ajudar a disseminar esta incrível área de investigação.

Agora pedimos-lhe que tente contagiar-nos: o que há de particularmente entusiasmante na sua área de trabalho?

Primeiramente, para alguém que é alérgico a esporos e pólenes, posso dizer que estes fósseis não provocam alergias! Segundo, graças a esta área de investigação já consegui viajar um pouco por todo o mundo, incluindo fazer trabalho de campo numa das ilhas mais remotas do Ártico – Bjørnøya. Por último, ao estudo deste material fossilizado dá-se o nome de paleopalinologia. Pode não parecer um nome muito fácil de decorar, no entanto, esta área de investigação criada na década de 40 do século XX continua a fornecer dados cruciais para a caracterização dos primeiros ambientes terrestres e aquáticos que existiram no nosso planeta, fornecendo dados sobre alguns dos primeiros seres vivos que existiram, ou das primeiras plantas que colonizaram a Terra. Igualmente, o seu estudo é importante para a compreensão dos eventos de extinção que se verificaram ao longo do tempo geológico, constituindo-se como uma janela para compreender melhor o passado do nosso planeta. As informações provenientes do estudo destes fósseis também são importantes para a reconstrução de paleoclimas, podendo fornecer dados importantes para a compreensão das alterações climáticas atuais. Por fim, esta área de investigação é muito útil na caracterização de bacias sedimentares, podendo auxiliar em diversos projetos como os estudos que envolvem o sequestro de carbono.

Por que motivos decidiu fazer períodos de investigação no estrangeiro e o que encontrou de inesperado nessa realidade académica?

Em 2018 terminei um pós-doutoramento na Universidade de Bergen, Noruega, onde estive por 4 anos a trabalhar com esporos e algas do Ártico com cerca de 360 a 330 milhões de anos. Resolvi candidatar-me a esta vaga logo após finalizar o meu doutoramento na Universidade do Algarve, em 2013, e posso dizer que esta escolha foi motivada por razões profissionais e pessoais. Do ponto de vista pessoal, conhecer e viver intensamente uma nova cultura era uma oportunidade que não poderia perder. Já ao nível profissional, ao aceitar este projecto sabia que ia estudar material do Ártico, algo com o qual nunca tinha sequer sonhado. Enquanto investigadores, poder trabalhar e viajar para locais tão inacessíveis é um privilégio, por isso, a escolha foi bastante simples. Além disso, conheci a fundo uma nova realidade académica, diferente da nossa. A cultura de investigação norueguesa tem particularidades diferentes, nomeadamente na forma como tratam os pós-docs e investigadores em termos de contratos e direitos laborais. Talvez seja essa a característica que mais me tenha chamado a atenção. Na Noruega não há uma margem cinzenta, como em Portugal, lá somos considerados trabalhadores com plenos direitos.

Que apreciação faz do panorama científico português, tanto na sua área como de uma forma mais geral?

Nas últimas décadas a ciência em Portugal tem evoluído de forma exponencial. Os cientistas portugueses têm feito muita e boa ciência, sendo reconhecidos mundialmente nas mais diversas áreas. Eu acho que em parte esse esforço se deve ao incentivo que os governos têm dado à ciência em contexto escolar nas últimas décadas, apostando na formação de excelentes professores. Por outro lado, a aposta no desenvolvimento de atividades em contexto extra-escolar e respectivas infra-estruturas (por exemplo, a Universidade Júnior ou a criação dos centros de Ciência Viva) têm aproximado o povo português da Ciência. Estamos agora a colher os frutos daquilo que tem sido um investimento de décadas. No entanto, tal como referido na questão anterior, a questão da precariedade laboral ainda necessita de ser resolvida. Se não o for, acredito que este modelo não se torne sustentável a longo prazo, penalizando grande parte da massa crítica do país.

Que ferramentas do GPS lhe parecem particularmente interessantes, e porquê?

O GPS é cada vez mais uma plataforma de referência para os cientistas portugueses, nomeadamente em termos de networking e disseminação de informação. Faço parte de diversos grupos do GPS, e por diversas vezes procurei a base de dados tentando encontrar colegas de determinada área que estejam registados em determinado país para onde vá. Não encontrei muitos geólogos portugueses em Bergen, mas consegui saber que tinha diversos colegas lá a trabalhar em outras áreas científicas. Parece pouco mas, para quem não conhece ninguém quando chega a um país novo, dá uma sensação de alento que conforta o coração. Obrigada, GPS!

GPS/Fundação Francisco Manuel dos Santos
conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

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