|Hélio Bernardo Lopes| |
Quanto ao primeiro tema, ele pode parecer mais importante do que realmente é, até porque poderá trazer acrescidas complicações sociais a um prazo mais ou menos médio, ou mais ou menos longo. Em todo o caso, não é deste tema que pretendo aqui escrever, mas sim do segundo, ou seja, da situação atual do País e dos portugueses. Sobretudo, em face dos dois atos eleitorais que se aproximam.
Mantendo sempre o respeito e a consideração que merece um português como Adriano Moreira, a verdade é que as suas intervenções, invariavelmente, são redondas, pouco precisas e, pior ainda, mui pouco claras naqueles casos em que a clareza é essencial. E foi isto, mais uma vez, que se pôde observar nesta sua mais recente intervenção.
Instado por Ana Lourença a pronunciar-se sobre os programas eleitorais do PS e da atual Maioria, eis que Adriano Moreira, afinal, ainda não os leu! E, tal como disse, ele é mais um dos nossos políticos ou comentadores que nos surge a botar opinião e conselhos sobre um tema de cujo conteúdo não conseguiu ainda tomar conhecimento!!
Adriano Moreira explicou que está a morar em Sintra, o que limitará um pouco o seu acesso ao que se vai passando por entre nós. Nem mesmo a sua filha Ana Moreira parece ter tido a gentiliza de fazer chegar ao pai um exemplar dos três documentos já dados à estampa pelo PS, que tão solicitados foram e que tão escalpelizados têm sido. Nem sequer lhe terá chamado a atenção para o facto de que a Maioria atual não quantificou nada do que apresentou, apenas apresentando intenções.
Simplesmente, se acaso lê a grande comunicação social, lá deverá ter encontrado os resultados de mais uma sondagem do JN na sua edição online, onde se perguntava se a devolução da sobretaxa de IRS é uma medida eleitoralista? Pois, às duas horas e vinte e dois minutos da madrugada, o sim recebia cerca de 81 % de votos, com o não a ficar-se pelos 19 %. Portanto, mesmo vivendo em Sintra, e dispondo apenas dos dados surgidos na grande comunicação social, estes resultados não significarão nada para Adriano Moreira?
Acontece que, a dado momento, Ana Lourenço foi claramente direta, questionando Adriano Moreira sobre se achava que valia a pena manter esta Maioria, ou se achava preferível mudar de força política governativa. Pois, Adriano Moreira mostrou-se como sempre o conheci: é essencial mudar a Europa que temos. E deste modo lá voltou a tratar o caso da ausência de conceito estratégico europeu, o problema do desaproveitamento do Conselho Económico e Social das Nações Unidas, as limitações históricas e antigas de Portugal, a sua defesa intransigente do Estado Social, mas ao nível dos princípios – o leitor já provou algum dia empadão de princípios? –, enfim, um sem número de ideias sem consubstanciação real, dado que há décadas que vem falando delas sem que nada aconteça.
Ora, há algumas semanas atrás – talvez três ou quatro –, questionado sobre se apoiaria António Sampaio da Nóvoa, sorriu e respondeu que o voto é secreto. Nada, pois, de clarificar o seu pensamento político, e quando o tema é importante e, por isso mesmo, lhe é colocado. Do mesmo modo, também agora voltou a não ser claro: o problema – o verdadeiro, como se percebe – está é na Europa. Na Europa e no mundo. Basta reparar, como referiu, na tal loucura de Hollande. Esqueceu-se – é o problema de morar em Sintra – de referir a opinião de Wolfgang Schauble, sobre a necessidade de diminuir os poderes da Comissão Europeia e do seu presidente.
Eu acredito que Adriano Moreira consiga acreditar na União Europeia. Na verdadeira, claro está. Mas tenho de achar esta fezada algo de estranho, porque a sua idade, o seu saber, a sua sabedoria e a sua experiência de vida – caramba! – ter-lhe-ão mostrado à saciedade que a Europa não é uma unidade, suscetível de ser federada, mas um conjunto de Estados com História própria de cada um e com maneiras distintas de estar na vida. O que Adriano Moreira deseja, simplesmente não é possível. Tudo o que hoje temos é o resultado do processo iniciado pelos tais estadistas por ele constantemente brandidos. E uma coisa era a sua (difusa) ideia, outra a realidade que sobreveio, e, necessariamente, lhes fugiu das mãos.
O mesmo se passa, por exemplo, com o tal Conselho Económico e Social das Nações Unidas. Ele sempre esteve lá, na estrutura da organização, mas nunca pôde ser levado a sério, porque quem triunfou, ao tempo de Bretton Woods, foi Dexter Wite e não Keynes. Também lá está a referência aos Direitos Humanos, embora a realidade de hoje nos coloque no desenrolar de uma III Guerra Mundial a decorrer aos pedaços, como tem referido Francisco I.
É por esta razão que o conceito estratégico da Europa não existe: é que a própria Europa, tal como imaginada por Adriano Moreira, também não existe, nem mesmo ao nível de uma estrutura própria de defesa, sendo essencial a OTAN, comandada, a todos os níveis, pelos Estados Unidos. A teoria de Adriano Moreira, a cuja luz o que aqui se passa não conta – o problema central estaria na Europa –, deita o papel da democracia em Portugal para o cesto das velharias. No fundo, vendo as coisas à sua maneira, talvez até tudo fosse idêntico com o PCP no poder, ou com o Bloco de Esquerda. Objetivamente, não é possível desvalorizar mais a democracia. Nem há melhor maneira de pôr um fim no Estado Social: há que defendê-lo abertamente, mas ao nível da principiologia...
Mas, enfim, talvez tudo não passe de uma consequência de viver em Sintra, longe, portanto, do essencial centro do saber e do conhecimento seguro. Um dado é certo: no tempo da II República, Salazar sabia o que queria e para onde ia; hoje, com a mais ampla liberdade, Adriano Moreira ainda não leu os programas do PS – já lá vão semanas ou meses –, da Maioria, do PCP, do Bloco de Esquerda, etc., não podendo, por tudo isto, opinar sobre o que é, de tudo isto já conhecido, melhor para o futuro de Portugal. Os problemas que se criam por se viver longe da capital, como é o caso da histórica Sintra.