|Hélio Bernardo Lopes| |
Como se percebe facilmente, terá de existir um abismo entre a palavra de Francisco e os ecos dos seus subordinados, um pouco por todo o lado. E, olhando o episcopado português, logo se identifica facilmente esse mesmo abismo.
Assim, na Eslováquia, uma freira com três décadas de vida espetou a mão de um jovem com uma agulha de bordar, a fim de que este pudesse sentir o sofrimento por que passou Jesus durante a sua crucificação. De molde que me questiono: esta freira, se acaso acompanha o pontificado de Francisco I, encontrou nele um gesto, ou uma palavra, que apontem para um tal tipo de metodologia cultural católica?
A freira está já demitida das suas funções, mas a verdade é que tal iniciativa, num Estado da União Europeia, terá de ser considerada um ato criminoso. De molde que volto a questionar: a hierarquia católica da Eslováquia, ou mesmo a direção do referido colégio, entregaram esta freira à Justiça? Não acredito, porque de há muito me dei conta do abismo que separa as palavras e o exemplo de Francisco I dos que lhe têm o dever de obediência.
Já no nosso Portugal, eis que nos surgiu agora um caso de recusa de certo pároco em realizar o funeral de um concidadão nosso por este não ter pago a côngrua, ou seja, a verba anual, equivalente a um dia de trabalho. Foi o que se noticiou, sem que tivesse sido negado o facto em causa. De molde que me interrogo: Jesus procederia assim para com alguém, só porque este lhe não desse algumas roupas ou um jantarete?
Este nosso noticiado caso trouxe-me ao pensamento um outro, com muitas décadas, e que teve lugar em Cascais. Certo concidadão nosso estava separado judicialmente, vivendo com certa senhora, com quem tivera um filho. Um dia, pela lei da vida, faleceu, de molde que o pároco local recusou celebrar a correspondente cerimónia religiosa católica.
Contactado Henrique Tenreiro, amigo da família, de pronto este telefonou ao cardeal António Ribeiro, que de imediato determinou que certo padre realizasse a cerimónia desejada. Como não me passa pela cabeça que o cardeal determinasse uma cerimónia proibida à luz do Direito Canónico, tenho de concluir do caráter extremista e fundamentalista do primeiro padre. E compreendo, por estas e por outras deste tipo, a perda em que a Igreja Católica acabou por cair junto de muitas comunidades humanas. Mormente, das mais instruídas e dos países mais desenvolvidos.
Estes dois casos mais recentes mostram esta realidade simples, muito bem retratada num velho ditado popular digno de registo: um general não faz um exército. E permite compreender o desabafo de Francisco com certo padre seu amigo: olha, se me matarem, é o melhor que me poderá suceder. Ao que eu mesmo junto: o que é velho é velho, não volta para trás.