Um bocadinho é sempre de mais

|Tânia Rei|
Quantas vezes (ou alguma vez?) deram por vocês a pensar no mais sensato, no melhor, no “tem que ser feito”, no “é o caminho lógico”, até para manter uma certa sanidade mental, para depois, no minuto seguinte, arranjaram mil e uma desculpas para não tomar porra de atitude nenhuma?

Aquelas situações em que entre a inércia e a acção só vai mesmo um bater de pestanas, só que ficamos ali especados, a jogar ao sério com a vida. Porque, normalmente, achamos que se aguentarmos mais um bocadinho tudo vai mudar, e que vamos conseguir cumprir todas as nossas malditas utopias. Algo como só falta mesmo a porcaria de uma etapa. E virar o leme num momento crucial destes era burrice. Era como atirar ao chão o raio de uma toalha ensopada em suor e, em grande parte, sangue.

É que se fizermos mais um esforcinho, vamos conseguir… Conseguir continuar a encher um copo que já transborda, mas ao qual teimamos em pôr uma caninhas no bordo, para ocupar com mais umas pinguinhas, que rebolam de imediato para o chão. Só nós não vemos. Ou fazemos por não ver. Se fecharmos os olhos, pensarmos em outras coisas, fizermos planos para o futuro glorioso que hipotecamos todos os dias, tudo vai passar. E melhorar. Passar e melhorar, passar e melhorar, passar e melhorar.

É só mais um bocadinho. É a derradeira prova, esta em que renunciamos. Esta hora, na que viramos as costas ao que julgamos ser uma parede, era a hora. Teria sido agora o ponto de viragem. Como aquela história do fulano de tal que jogava sempre a mesma chave no Euromilhões, e um dia, cansado de perder, mudou os números. E, nesse dia em que ele seguiu em frente, saiu a antiga combinação dele. Por não ser persistente o suficiente, não é hoje um milionário, daqueles que mete nojo de tão rico.

É só, portanto, mais um bocadinho.

“É só mais um bocadinho. Um bocadinho. Bo-ca-di-nho”, repetimos nós, enquanto tentamos alcançar a nossa mantinha para cobrir as pernas, numa manhã qualquer de Inverno no lar da terceira idade.

É que um bocadinho, para quem espera desconfortável, é sempre de mais.

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