Responsabilidade política

|Hélio Bernardo Lopes|
Já com a garantia de que o Diabo não chegou nem chegará, para mais com Wolfgang Schäuble a cognominar Mário Centeno como Cristiano Ronaldo do Eurogrupo, a Direita entrou em delírio. Em pânico, deita mão de tudo o que lhe passa perto e pense poder ser usado como arma de arremesso. Tenha ou não um mínimo de fundamento de verdade. Para a Direita de hoje passou a valer quase tudo.

Infelizmente, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa começa a mostrar uma das suas caraterísticas há muito conhecidas: só vai apenas a quase todas, de pronto se remetendo ao silêncio naquelas situações em que possa estimar a existência de uma parte mais forte na contenda. E eu bem referi esta realidade a tempo e horas...

Ora, um dos temas de que a Direita vem deitando mão e em crescendo é o da responsabilidade política. Um caminho de pronto secundado pela grande comunicação social televisiva. Surge um facto político-social complexo, e de pronto se pede a assunção de responsabilidade política. Já foi assim com Luís Capoulas Santos, depois com Constança Urbano de Sousa, agora com José Azeredo Lopes. Mais uns dias, e lá nos chegarão, entre outros, Adalberto Campos Fernandes e Francisca van Dunem. E se um abanão tiver lugar e Almaraz, será aí a vez de Matos Fernandes. Portanto, vejamos três casos que tiveram lugar na nossa vida política, todos diferentes entre si.

Em primeiro lugar, o do antigo Ministro do Ambiente de Aníbal Cavaco Silva, Carlos Borrego, professor na Universidade de Aveiro. A perda de confiança política deu-se logo ao nível do próprio Primeiro-Ministro, porque Carlos Borrego foi simplesmente demitido por Aníbal Cavaco Silva. Quase com total certeza, a tal piada do Alumínio no sangue nunca teria tido um ínfimo impacto na comunicação social, da grande à simplesmente local. De resto, hoje, já com muitos anos sobre o caso, há quem refira que saiu a taluda ao então Primeiro-Ministro, porque há muito se viria mostrando cansado com a sua prestação política. E, com boa verdade, Carlos Borrego não tinha uma grande imagem política, que nada tem que ver com a eficácia da sua ação.

Em segundo lugar, o caso da saída de Jorge Coelho. Acontece que existia já, vindo de trás, um estudo sobre o descalçamento do pilar da ponte que ruiu. O tribunal que tratou o caso entendeu não ter meios de decidir em consciência, decisão que, muito mais tarde, num JORNAL DAS NOVE, viria a ser apontada como muito correta e corajosa por parte do então Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Luís de Noronha Nascimento.

Acontece que também se diz que Jorge Coelho, tendo em conta a existência do tal relatório anterior, procurou defender-se, mostrando o seu desapego face ao poder. A verdade é que o ttribunal considerou não dispor de meios para tomar outra decisão sobre a quesrão da culpabilidade.

Ora, neste caso, ninguém pediu a cabeça de Jorge Coelho, antes foi ele que decidiu deixar o lugar, usando aquela frase que ficou célebre e que foi a de que, com ele, a culpa não morreria solteira. A verdade, porém, é que ninguém foi culpado, pelo que, num sentido que me parece correto, essa dita culpa morreu mesmo solteira. Para lá disto, Jorge Coelho acabou até por capitalizar com uma boa imagem, fruto do seu desapego do poder. Porém, convém notar que ninguém foi culpado, o que pode ser algo plenamente justificável, porque existem factos insuscetíveis de explicação. Basta recordar, por exemplo, as previsões da localização do carro e do atocarro, operadas, em plena televisão, por um académico muitíssimo conceituado. Bom, estavam cabalmente erradas. Como erradas se mostraram as previsões do capitão-de-mar-e-guerra sobre a possibilidade de certo corpo ter ido para Norte. Disse que não, mas a realidade foi a contrária.

E, em terceiro lugar, o caso mais recente de José Azeredo Lopes, ao redor das armas furtadas em Tancos. Pouco mais poderei dizer, sobre este caso, que o que escrevi no meu texto de hoje, TRÊS LAMENTÁVEIS SITUAÇÕES. Ainda assim, justifica-se uma abordagem ao conceito de responsabilidade política, embora operado aqui por alguém que não é jurista.

Quando se desmpenha uma função política está-se investido de certo grau de responsabilidade. Essa responsabilidade deriva das consequências da materialização da política definida e posta em prática. Quando uma dessas consequências deriva de uma errada aplicação do que está estabelecido superiormente, essa responsabilidade não pode ser assacada politicamente ao detentor da parcela de soberania em jogo. Ela pssa, naturalmente, para a alçada dos que, no terreno, têm a incumbência de materializar a política definida e as regras ou leis em vigor.

Veja-se, por exemplo, o caso do Colégio Militar e a homossexualidade. José Azeredo Lopes teria responsabilidade política se, sabendo do que se passou, nada tivesse feito ou determinado. E é essencial salientar que o ministro nem demitiu o antecessor de Rovisco Duarte, antes foi este que se demitiu. E o mesmo teria lugar com o caso dos instruendos comandos, mas se as coisas não tivessem seguido, com todo o rigor, a trajetória que se viu e que nunca foi obstaculizada pelo Ministro da Defesa Nacional.

O mesmo se dá com o caso de Tancos. O que estava estabelecido é que a videovigilância – não garante nada, como se percebe – só teria lugar no próximo oçamento. Simplesmente, o armamento estava nos paióis, pelo que o comando militar local tinha o dever de o defender adequadamente, e não através da estratégia de derrota que pôde ver-se. Ora, o ministro José Azeredo Lopes não tem nada a ver com isto, a não ser a exigência do apuramento de responsabilidades. E se o mesmo não o satisfizer, poderá sempre solicitar a apreciação do tema à Procuradoria-Geral da República.

Por fim, a imagem das instituições no estrangeiro. Embora com desagrado, e não concordando com tudo o que se contém no telegrama em causa, a verdade é que a WikiLeaks deu a conhecer ao mundo que a embaixada do Estados Unidos em Lisboa dissera para a Secretaria de Estado, em Washington, que Portugal possuía um exército de generais sentados, com um rácio superlevado entre oficiais-generais e soldados. E mais: que apenas se sonhava em Portugal com os Descobrimentos. Ao que eu junto a histórica e significativa vitória de Salazar no concurso sobre O MAIOR PORTUGUÊS DE SEMPRE.

E mesmo por fim, as férias do Primeiro-Ministro. É mais um tema do tal leque do vale-tudo, porque as instituições estão a funcionar normalmente, o que se compreende ser terrível para a Direita de hoje. Mas esta Direita tem agora um dever: apresente uma moção de censura ao Governo. Quem sabe se o PCP, Verdes ou Bloco de Esquerda não voltam a repetir o abandono a que votaram, ao tempo de Sócrates, os portugueses?...



www.CodeNirvana.in

© Autorizada a utilização de conteúdos para pesquisa histórica Arquivo Velho do Noticias do Nordeste | TemaNN