Ligeiras reflexões

|Hélio Bernardo Lopes|
Terminaram as minhas Férias Grandes, como usa dizer-se, e assim regressam hoje os meus textos, caminhando para o ritmo que desde há muito se conhece. Como teria de dar-se, mesmo durante o mês de agosto, não faltaram temas que justificam uma reflexão, ainda que rmuito ligeira, como irá aqui dar-se.

O CASO DE PONTE DE SOR
As minhas primeiras palavras vão para o jovem hospitalizado e para a sua família, formulando votos muito sinceros para que o mínimo dos mínimos possa sobrevir no jovem em causa. Faço minhas as palavras e o ato recentes do embaixador do Iraque, mas multiplicando- os por um inteiro muito elevado.

As minhas segundas palavras dirigem-se ao anterior embaixador do Iraque, hoje colocado na Roménia, dado que a sua atitude seria sempre impensável numa situação do tipo, mas inversa. Desde logo porque nenhum embaixador português teria um comportamento similar para com um seu colega e o seu país. E depois porque, dentro da nossa mais plena tradição, não faltam casos similares, também entre jovens e até com piores resultados. Num ápice, surgiram logo dois em Gondomar.

A minha terceira palavra vai para o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, porque continuo sem saber se também já terá telefonado à família do jovem que faleceu em Gondomar. E dos mil e um outros que, a um ritmo quase diário, infirmam completamente as infelizes e desleais considerações do atual embaixador do Iraque em Bucareste.

E, por fim, a minha quarta palavra, dirigida à sensacionalista comunicação social televisiva, que fez um péssimo trabalho neste caso de Ponte de Sor, condenando de imediato na praça pública os dois jovens iraquianos e nada dizendo sobre o que entretanto veio a lume sobre alguns dos elementos do grupo de jovens alentejanos. A uma primeira vista, santos e diabos... Um trabalho parcial e completamente à revelia de tudo o que sempre se vai ouvindo noutros casos de gente graúda. Que é feito, por exemplo, do caso do padre condenado em primeira instância no Fundão? E o de Domingos Duarte Lima no Brasil? E o dos Papeis da Mossack Fonseca? E os dos nossos excecionais banqueiros, que levaram o nosso Sistema Financeiro a uma situação de pré-colapso? Silêncios sepulcrais na comunicação social...

O BURKINI
Não deixo de olhar com algum espanto o modo suicida como o Ocidente se mostra incapaz de compreender o aspeto ideológico e religioso do burkini. Os nossos intelectuais não parecem compreender, mesmo depois de quanto pode já ver-se pelo mundo, que a democracia simplesmente não funciona e já nem mesmo tem utilidade para os que, de facto, dirigem os interesses do mundo.

Assim como as bombas de Assad, ou do Estado Islâmico, ou da Turquia, ou da Arábia Saudita acertam sempre em crianças, senhoras grávidas, velhinhos e hospitais, as norte-americanas só atingem malandros do Estado Islâmico... E é espantoso como os nossos jornalistas televisivos continuam a debitar esta conversa sem mais nem menos, sempre de um modo acéfalo ou malandreco!

Neste sentido, o que se coloca é esta questão: e se, nas nossas praias, o burkini for crescendo, em número e variedade, atingindo perto de metade dos banhistas? Será assim tão difícil perceber o que logo surgirá ao virar da esquina? Será possível que os nossos jornalistas e os nossos comentadores televisivos não compreendam que se desenrola hoje no mundo uma guerra de natureza religiosa? É tanta e tão sôfrega a liberdade de que querem usufruir os nossos intelectuais, que acabarão por abrir a porta aos que pretendem pôr um fim no nosso modo de viver em sociedade.

MENTES ESTÁTICAS
Num destes dias, pouco antes de partir para Roma, o nosso padre Nuno Gonçalves lá nos veio com a velhinha e histórica cassete, a cuja luz discorda do rumo da Educação em Portugal, ao mesmo tempo que nos brinda com este miminho ideológico: há riscos no excesso de secularismo nalguns países europeus!

Bom, caro leitor, fiquei espantado com esta tomada de posição, embora não tanto por não ser a mesma verdadeiramente definitória do próprio pensamento da Igreja Católica. O facto do Estado ser laico em nada impede que cada um prossiga a sua prática religiosa. Ou antes e entre nós, se for católico, porque se os islamitas pretenderem construir uma mesquita na Mouraria, bom, surge logo a nossa Direita a protestar de todo o modo e feitio. E já agora: onde estaria este padre Nuno Gonçalves quando o seu colega da Academia Militar não consentiu na colocação do corpo do major-general Fernando Passos Ramos na capela da instituição? Um tal lugar religioso é só para os militares católicos? Ecumenismo?...

O IMI CATÓLICO
Mas se Nuno Gonçalves nos brindou com esta sua preocupação, logo os bispos portugueses vêm apontar a não aplicação da Concordata e da legislação em vigor, embora de há um bom tempo caída no desleixo conveniente: querem que as instalações da Igreja Católica, sejam elas as que forem, estejam isentas de IMI!! Mesmo que sirvam para excelentes negócios de lares ou de escolas, ou sejam casas de padres! O que pensará disto José Gomes Ferreira, que logo nos veio brandir com os benefícios recebidos pela igualmente rica Igreja Ortodoxa Grega? E o Governo de Portugal, que assinou a mais recente versão da Concordata com a Santa Sé? Nas aflitinhas?

E já agora um novo tema: e os partidos políticos, não pagam IMI?! E este escândalo vai continuar? Será que CDS/PP, PSD, PCP, Verdes e Bloco de Esquerda se irão determinar a defender uma mudança nesta escandalosa realidade? Já há uma petição muito alargada, mas os interessados ligar-lhe-ão? É o que se vai ver.

E já agora: quais são as paróquias que já responderam ao apelo papal de receberem uma família refugiada? O leitor conhece alguma? E na Madeira, em que lugares do património da Igreja Católica foram hospedados os madeirenses desalojados? O leitor conhece algum? Muito sinceramente, não creio.

SINAIS DE GUERRA
Pouco mais de um quarto de século tendo passado desde a queda do Muro de Berlim, os alemães voltam agora a experimentar um dos condicionalismos da então chamada Guerra Fria, devendo armazenar água e víveres suficientes para sobreviver durante perto de uma semana, seja no caso de ataque ou de catástrofe. Ataque que, como se percebe, pode bem ser a guerra. Uma guerra que os Estados Unidos desde há tanto vêm tentando pôr em andamento contra a Rússia. Uma parte, precisamente, da guerra religiosa, em primeiro lugar, e económica, logo de seguida. Enfim, resta-nos a democracia...

DA LIBERDADE À IMBACILIDADE
Na sequência do sismo italiano de Amatrice, as nossas televisões deitaram-se a alarmar os portugueses, mormente os lisboetas e os algarvios, com casos similares em Portugal. Num verdadeiro despautério, as nossas televisões puseram-se a alertar para a suposta elevada probabilidade de algo de similar poder ter lugar em Portugal, mas aqui com cerca de dezassete mil mortos! É, em boa verdade, não ter que fazer com o tempo disponível.

Como facilmente se percebe, a generalidade dos sismos causa desgraça, mas não pode tal ser impedido. E muito menos se podem mudar as cidades tal como as mesmas existem e foram construídas. Como Christopher Alexander escreveu, uma cidade não é uma árvore. O que significa que todo o alarme lançado pelas nossas televisões, para nada rigorosamente mudar, simplesmente acaba por criar ansiedade entre os portugueses. Tempos de televisão que nos mostraram a estrada que liga a liberdade à imbecilidade.

SE ESTÁ MAL, MUDE-SE
No passado fim-de-semana o Bloco de Esquerda esteve reunido, tendo no mesmo usado da palavra, entre outros, o académico Francisco Louçã. Com a mais plena lógica, este salientou que a União Europeia é um projeto falhado, porque não pode representar aquilo que promete e o que representa é o contrário do que prometeu, já que prometia convergência e tem divergência, prometia melhoria social e tem, pelo contrário, a degradação das condições de vida das classes populares.

Nunca duvidei de que a nossa entrada para o clube europeu se saldaria num desastre, tendo-o dito a gente conhecida e hoje muito ligada aos interesses que por ali passam. E também hoje concordo com Francisco Louçã, quando refere que a saída é sempre imperativa para que haja uma alternativa em que se possa recuperar soberania, decisão, democracia, capacidade do povo poder fazer escolhas.

O que hoje é certo é que a desilusão com esta famigerada União Europeia é total junto do universo dos nossos concidadãos. E se alguns ainda conseguem tentar esquecer o desastre e o seu desenvolvimento expectável, a maioria aceitaria de bom grado a saída desta – esta sim – verdadeira geringonça falhada e trucidadora da soberania dos povos, das suas democracias e de um futuro minimamente digno para os seus povos. Portanto, haja quem tenha a coragem de materializar o sentimento muito geral dos portugueses.

PASSOS COELHO JÁ ULTRAPASSA HOJE O PRÓPRIO SALAZAR
Causou-me uma estranheza profunda escutar de Pedro Passos Coelho a afirmação de que o investimento externo não surge por aqui por via de estarem o Bloco de Esquerda, o PCP e Os Verdes na coligação de apoio parlamentar que suporta o atual Governo de António Costa. Disse mesmo para a minha mulher, logo que desliguei o televisor: esta, hoje, nem o Salazar diria! A verdade é que Salazar era inteligente, ponderado e um estadista, não recorrendo ao disparate político.

Estas palavras de Pedro Passos Coelho mostram a sua visão da democracia: mera formalidade, mas a ser praticada tendo em conta a vontade alheia ao suporte da soberania nacional, que são os portugueses com direito a voto e que entendam exercê-lo. Precisamente o contrário de Salazar, para quem as Forças Armadas haviam definido o rumo a dar a Portugal, mas sem estarem dependentes da opinião de quem não fosse português. Quem se determinar a ler a obra, CONFRONTO EM ÁFRICA, de Whitney Schneidman – foi a sua tese de doutoramento –, verá como Salazar deixava passar ao lado os cantos de cisne dos que sempre acharam que os portugueses não tinham capacidade para manejar um tão vasto e rico território por todo o mundo. Ou seja, os que hoje escarnecem de Putin por este não fazer como Gorbachev ou Yeltsin, vendendo as riquezas russas a pataco. Em síntese: Pedro Passos Coelho ultrapassa, neoliberalmente e pela direita, o próprio Salazar!

A BURRICE NUNCA ACABARÁ
A condição inerente à nacionalidade de quem quer que seja nunca desaparece. Quem disponha de certa nacionalidade só por verdadeira burrice poderá refugiar-se da liderança da mesma num Estado que esteja em guerra de vida ou de morte com o seu Estado de origem. Precisamente o que deverá ter tido lugar com Alexander Shchetinin, conhecido jornalista russo e crítico do presidente Vladimir Putin.

Pois Alexander Shchetinin, a viver em Kiev, determinou-se a ser um crítico feroz de Vladimir Putin, o que se transformou em ouro sobre azul para o Governo da Ucrânia e para os Estados Unidos. Como usa dizer-se, Alexander Shchetinin pôs-se a jeito. De molde que lá veio a ser, ao que parece, assassinado.

A uma primeira vista, as coisas serão logo vistas, superficialmente, como tendo origem no Governo de Putin, que é quem os Estados Unidos pretendem ver sair do poder, dado que não vende as riquezas da Rússia a pataco. Além do mais, a Rússia é ortodoxa. Simplesmente e tal como já se havia dado com os caso de Litvinenko e com o avião malaio abatido por um míssil também possuído pelos tropas de Kiev, Putin era quem nunca teria um ínfimo interesse em ver aniquilado o tal jornalista, porque seria sempre sobre o Governo da Rússia que impenderiam as suspeitas aparentes.

Foi pena que Alexander Shchetinin tenha perdido a vida, mas a verdade é que, ao pôr-se a dizer mal de Putin na Ucrânia, e sendo russo, pôs-se completamente a jeito: cavou o seu próprio fim. Uma realidade que me causa uma terrível estranheza, porque o resultado, em tais circunstâncias, é sempre quase certo: é-se taticamente assassinado por razões do Estado onde se está refugiado.

O GOLPE BRASILEIRO
Aí nos foi dado escutar as palavras de Dilma Rousseff, em pleno Senado do Brasil. Desde que com um mínimo de boa-fé, já não é possível deixar de compreender o que realmente esteve por detrás de tudo o que se tem vindo a passar com Dilma. Pôde ela ver, deste modo, como a democracia pode, de facto, não passar de mera formalidade e de uma farsa.

O SOCIALISMO DEMOCRÁTICO DE SANCHEZ
Quando escrevo este texto ainda não conheço o quase certo chumbo do PSOE à proposta de Governo de Mariano Rajoy em Espanha. Mas aguardo também, quase com toda a certeza, o essencial jogo de números no parlamento espanhol de molde a que Mariano Rajoy prossiga com a sua governação ligada aos interesses financeiros e europeus. Que o cão a pôs é certo, mas o resto...

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