A maravilha europeia

|Hélio Bernardo Lopes|
Já hoje ninguém duvida do desastre a que chegou a União Europeia, por mim designada agora por UDEDE, ou seja, União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus. Ninguém já duvida da realidade hoje presente no continente europeu, embora uma ligeira minoria se mostre colada àquela estrutura. Ou porque beneficia lautamente da mesma, ou porque já não tem a coragem de expor a realidade que já todos veem.

Foi, pois, muito interessante a entrevista concedida por Porfírio Silva, do PS, ao i, dado que teve aí a coragem que tem faltado a tantos outros. Ainda assim, continua a persistir num erro de há muito evidente, mas que é difícil de ultrapassar, tal foi a dimensão do mesmo. Assim, o entrevistado conta-nos, na sua entrevista, que há responsáveis em Bruxelas que têm andado a chamar jornalistas para, em off, envenenar a comunicação social contra Portugal, mostrando documentos que deviam ser reservados e dando pretensas explicações que são afinal falsidades. Bom, caro leitor, nem duvido um mínimo desta afirmação de Porfírio Silva.

Há já muitos anos que tive a oportunidade de perceber que a União Europeia – a União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus – é hoje comandada, de facto, pelo Partido Popular Europeu, centrado o seu poder na Alemanha de Angela Merkel. Trata-se, indiscutivelmente, da aplicação de um modelo ideológico imposto a todos os povos europeus e que deita completamente por terra a vontade dos cidadãos expressa em eleições livres.

Acontece que Porfírio Silva fica bastante longe de reconhecer alguns dados muito importantes da atual situação. Portanto, vejamo-los. Em primeiro lugar, a realidade que corretamente aponta só foi possível porque os partidos da antiga Internacional Socialista – PS, PSOE, PASOK, Trabalhistas, PSI, PSF, etc. – deram todo o seu apoio ao modelo que agora, com toda a correção, apontam como fora de tudo o que sempre terá suportado a construção europeia. Sem eles e a sua infeliz intervenção o desastre de hoje nunca podia ter chegado ao que se vê.

Em segundo lugar, Porfírio Silva esquece que o fim da URSS, com tudo o que consigo arrastou, teria sempre de potenciar o desenvolvimento do imperialismo norte-americano, ao mesmo tempo que favoreceu a incontrolável globalização, apoiando, em toda a linha, o modelo neoliberal: desprezo pelas pessoas e pela sua dignidade, com o dinheiro e o lucro como únicas referências supremas. Para os escroques que hoje lideram o mundo, só a morte consegue preocupar.

Em terceiro lugar, olhando o caso português, a grande verdade é que José Sócrates tudo fez para não recorrer ao resgate. Tinha até conseguido o apoio de Merkel – portanto, também da famigerada União Europeia, a minha União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus – para o seu PEC IV. Acontece, como se sabe bem, que o Presidente Cavaco Silva se remeteu, por essa altura, ao silêncio, com o PSD e o CDS/PP a exigirem o recurso ao resgate, mas por igual com Mário Soares a elogiar Pedro Passos Coelho – era o tal político simpático e com quem se podia dialogar – e a gritar a Sócrates, em sua casa, que o FMI não era um papão, até porque ele mesmo já lhe tinha recorrido por duas vezes. Como se vê hoje, não era um papão, porque era, isso sim, um inferno terreno.

Em quarto lugar, Porfírio Silva também evita reconhecer o facto de que os tais pais fundadores nunca apresentaram um plano para o que quer que fosse. Pretenderam apenas criar uma espécie de Nações Unidas ao nível europeu, embora sem conseguirem compreender que a Europa, naturalmente, comporta conflitualidade no seu seio, dado que a História assim o determina. Se a guerra, em geral, já é coisa natural, a conflitualidade de interesses no seio da Europa é um dado definitório. Temos provas, mais diretas ou menos, a cada dia que passa.

Em quinto lugar, também não tem razão o entrevistado quando compara – e bem – a União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus com a velha URSS, embora com a primeira sem KGB. E a razão é simples: ainda não chegou a criação aberta dessa estrutura repressiva, porque já vamos a caminho. De resto, a democracia perdeu cabalmente o seu sentido lógico, visto que a vontade dos cidadãos deixou de poder materializar-se através de eleições. As eleições são hoje uma simples forma, mas com resultados, sempre que a Esquerda vence, inaplicáveis. Por isso eu mesmo expliquei, um dia, a um conhecido meu, que gritava diariamente em nome do socialismo democrático: não vê que a democracia só serve se for a Direita a ganhar?! Já lá vão mais de vinte anos, e a coisa era já assim e bem visível.

E, em sexto lugar, esta questão pertinente: perante o que nos conta Porfírio Silva e em face de quanto e vê a cada dia que passa, já praticamente sem uma democracia minimamente efetiva, o que se propõem fazer os que por aí andaram a defendê-la e a bater-se contra a II República e contra Salazar? Com uma democracia objetivamente inexiste, com gente estrangeira não eleita a ditar o que cada Estado pode fazer, com os Estados já tratados como de primeira ou de segunda, o que se propõem fazer os históricos democratas de sempre? Bom, Porfírio Silva nada diz sobre tudo isto.

Em tudo o que nos diz na sua interessante entrevista Porfírio Silva tem a mais cabal razão. Fica apenas a faltar uma identificação do caminho a seguir para lá do atual, que é o de continuarem os nossos políticos do PS, PSD e CDS/PP a dizerem-se campeões do europeísmo, mas já com a União Europeia reduzida à tal União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus. Porfírio Silva compara a União Europeia de hoje à velha URSS, embora sem KGB. E então? Que fazer? Ficamos com o silêncio europeísta dos políticos do PS, PSD e CDS/PP. E – note-se – os dois últimos constituem autêntica claque de apoio aos ditames da famigerada União Europeia, hoje a União Ditatorial dos Estados Decadentes Europeus. A tal URSS sem KGB.

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