Tempos de aflição no Pinoote

|Hélio Bernardo Lopes|
O tempo que passa é já conhecido de todos. Pelo menos, é conhecido dos mais interessados e dos mais atentos à vida em sociedade. 

Sendo um tempo de grande desgraça humana e social, a verdade é que ele acaba por se constituir num fantástico manancial de conhecimentos sobre o que realmente é a estrutura comportamental da natureza humana. E não faltam exemplos que nos ajudem a perceber esta realidade. Vejamos alguns exemplos que nos permitem percebê-la.

Em primeiro lugar, convém não perder a série televisiva francesa que agora se iniciou – vai no episódio quarto – na RTP 2, UM CRIME, UM CASTIGO, nos designados dias úteis, pelas dez da noite. É uma série que vale a pena ser acompanhada, porque por ela se pode ficar com uma muito boa ideia do estado moral da França de hoje – já nos foi possível ver isto com a anterior série francesa, OS INFLUENTES –, mas também com a correspondente situação nos espaços mundiais mais desenvolvidos nos domínios científico, tecnológico e social. Quem puder acompanhar esta série só virá a ganhar.

Em segundo lugar, e à luz daquelas duas séries, a recente candidatura de Henrique Neto ao Presidente da República, que suscitou o júbilo da nossa atual direita. Infelizmente para esta, não lhe é possível vir a apoiar Henrique Neto nesta eleição presidencial que se aproxima. A grande verdade é que estou firmemente convencido de que muitos dirigentes do PSD prefeririam, de longe, Henrique Neto a Marcelo Rebelo de Sou. Ou mesmo a Pedro Santana Lopes.

Em terceiro lugar, o significativo pânico que se tem criado junto dos principais defensores do Centrão político português, tanto pelo lado do PSD como do PS, coma hipotética candidatura presidencial de António Sampaio da Nóvoa. Um pânico gerado pela forte independência partidária do académico, mas também porque se trata de um concidadão com um currículo profissional realmente invejável e que nem vem queixar-se de que os políticos ganham mal. De molde que toca de lançar mão da mentira, da calúnia, da difamação e da falsa reconstrução histórica. É difícil conseguir-se um mínimo de esperança para o futuro de Portugal quando verdadeiros idiotas nos surgem a tentar minimizar aquele que é um dos nossos principais vultos culturais e da cidadania. Já assim se passou com José Saramago.

E, em quarto lugar, a entrevista de ontem de Ricardo Sá Fernandes ao i, onde nos veio salientar que o PS é um partido minado pela cultura do favor e da promiscuidade. E tem toda a razão, porque se trata de uma realidade que nunca passou ao lado da minha atenção. Simplesmente, tem dois aspetos que são esquisitos. E dois que podiam mesmo ser três: o de só agora ter percebido isso, para mais tendo sido secretário de estado de Guterres; e o de esquecer que o que refere (corretamente) é a marca essencial do Centrão político português, que de há muito engloba PS e PSD, e que, graças ao modo (clubístico) português de viver a política, permitiu que se criasse o sentimento de impunidade sustentável a que se chegou.

Ora, estes três casos que por aí surgiram, no meio do estertor da nossa III República, mostram que se vivem tempos de aflição e de pinote. Dizia eu na noite ontem, após ter lido a entrevista de Ricardo Sá Fernandes, e quando expunha a verdade do caso da reprovação de Saldanha Sanches nas suas provas de agregação, que se tudo tivesse sido diferente com o SYRIZA, ou se por aí surgisse um novo MFA, o que não seria o pinotear no seio da nossa sociedade... Ai o que não se daria!...

E é à luz de tudo isto que eu interpreto a recusa de António Guterres na sua candidatura ao Presidente da República. Para a História, restará que ele seria o natural e garantido vencedor, mas também que renunciou a tais prebendas, antes dedicando as suas qualidades a funções bem mais motivadoras e essenciais. É o que penso, claro está. E penso assim porque já quase não acredito num futuro capaz para os portugueses. Penso, de resto, situações ainda bem piores.

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