Tudo nos conformes

|Hélio Bernardo Lopes|
Há muito deixei de atribuir a todo o tipo de sondagens um mínimo de importância. A verdade é que não deixo de tomar em conta os seus resultados, nem mudo de canal quando sei que vão ser os seus resultados dados a conhecer.

Estas sondagens são feitas nos termos das regras há muito consagradas, sempre naturalmente aperfeiçoadas em ordem a conseguirem espelhar com maior fidedignidade o que se passa na globalidade da população em estudo. Paralelamente, porém, cada um de nós dispõe também da sua própria sondagem, fruto de quanto vai vendo e ouvindo, mormente no âmbito das convivências correntes, mas por igual à luz de quanto possa estar-lhes a montante.

No que me diz respeito, é raríssimo ouvirem-se conversas nos ambientes públicos em torno destas eleições para deputados ao Parlamento Europeu. Objetivamente, trata-se de um não acontecimento. Mesmo entre grupos de amigos, até de familiares, é raríssimo terem lugar conversas sobre estas eleições que vão ter lugar no próximo domingo.

Em contrapartida, também não se escutam – não se têm escutado ao longo de toda esta legislatura – conversas que possam mostrar uma revolta forte e intrínseca por via da presente governação portuguesa. Se é verdade que, a um ritmo diário, nos surgem queixas, protestos e greves a esmo, a verdade é que a generalidade da população se mostra profundamente aliviada com o fim daquele calvário que a anterior Maioria-Governo-Presidente criou à generalidade dos portugueses, percebendo-se hoje facilmente que as medidas assim tomadas se inseriam numa atitude estratégica: destruir o Estado Social e gerar um ambiente de baixíssimos salários e pensões, acompanhados de uma redução ao mínimo das estruturas públicas.

É também à luz deste segundo silêncio que tem de compreender-se o anterior, referente às eleições do próximo domingo. Embora, como se sabe, cada um de nós se veja, e sinta, como português, não como europeu. Mas tudo seria diferente se a posição dos portugueses em face da atual governação fosse de reprovação. Numa tal situação, é perfeitamente expectável que estas sucessivas sondagens para as eleições de domingo tivessem uma outra estrutura. Porventura, muito mais perigosa para o PS de António Costa, e para Bloco de Esquerda e CDU.

Para se chegar a um tal desiderato existe uma vasta gama causal. Por um lado, a boa governação da equipa de António Costa. Por outro lado, a excelente imagem criada por Portugal no Mundo, mormente no seio da União Europeia e junto dos seus grandes Estados. E, por fim, os inenarráveis erros políticos praticados pela Direita: PSD e CDS. Até o Patriarcado de Lisboa!

Quem desempenha um alto cargo político e aspira a governar, tem de ter a essencial lucidez de não negar, ao menos perante si mesmo, que os resultados de quem está a governar são bons e vêm suscitando a quase plena aceitação dos cidadãos. Não se pode vir defender o Serviço Nacional de Saúde depois de tudo se ter feito para lhe pôr um cobro. Não se pode continuar a defender a privatização – de início parcial – da Segurança Social Pública, depois de se ter podido ver a altíssima sensibilidade que a ideia possui junto de uma população que pouco mais tem que a sua parca reforma. Não se pode vir a terreiro bramar contra os passes sociais, quando tal medida, para lá de perfeitamente exequível, apresentaria sempre um altíssimo efeito positivo junto das pessoas atingidas pela medida. Acima de tudo, faltou ao PSD apresentar uma atitude de diferença realmente para melhor em face do que já fizera a atual maioria parlamentar.

Por fim, as caras. Custa entender que Assunção Cristas não tenha ninguém no seu círculo de amizades, mesmo que de um outro partido político, que lhe diga que a sua imagem já hoje cansa os portugueses. Um pouco como o que se dá com os comentários do académico Domingos Xavier Viegas. O que dizem deixou de ser ouvido com interesse ou atenção. E quem diz CDS, diz PSD. Como pude já escrever, Rui Rio não nasceu para ser político. Mas uma prova da sua fraca liderança pôde agora ver-se, com este recurso a Pedro Passos Coelho, mas que foi, por sua vez, um outro erro, dado que a imagem deste ficará para sempre associada ao sonho (e à sua tentativa de materialização) de pôr um fim no Estado Social.

Perante tudo isto, não tendo ainda chegado o Diabo, faltou a tentativa de jogar na qualidade, ao invés do usual nas campanhas eleitorais. Claro está que, ainda que tivesse sido este o caminho, a derrota teria sempre uma elevadíssima probabilidade de assistir a Direita, porque o Governo de António Costa, apoiado pelo PS, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes, governou bem, dando segurança e esperança à generalidade dos portugueses. Nestas circunstâncias, porém, sempre é preferível perder com classe do que com uma campanha à base de casos por tudo e por nada. Até porque os portugueses, historicamente desinteressados da democracia, também não são parvos. Portanto, a ver pelas sondagens – as reais e as de cada um de nós –, tudo se mantém nos conformes.

www.CodeNirvana.in

© Autorizada a utilização de conteúdos para pesquisa histórica Arquivo Velho do Noticias do Nordeste | TemaNN