|Hélio Bernardo Lopes| |
Parece que o Bloco de Esquerda não irá cair no isco hoje lançado por Mário Nogueira, líder da FENFROF, sendo de acreditar que os partidos que constituem a CDU, por razões de firmeza histórica, não irão agora enfileirar com a nova doutrina da Direita parlamentar – PSD e CDS. Se assim for, a crise passará apenas a ser História. Mas vamos, então, à realidade que teve lugar.
O Governo de José Sócrates, de um modo indubitável, lançou Portugal e os portugueses numa crise há muito não vista entre nós. Uma realidade objetiva, que não se discute, mas que teve também outros fatores que contribuíram par o seu desenlace, como a crise mundial que Roubini previu, a solução adotada nesta situação pela União Europeia, que o ex-Ministro das Finanças da Alemanha já reconhece ter sido um erro, ou as mil e uma iniciativas da oposição parlamentar do tempo, sempre acarretando acréscimos de despesa, para mais já com as taxas de juro em rápido crescimento para Portugal. O centro culposo, porém e bem acima do resto, foi o Governo liderado por Sócrates.
Seguiu-se o tempo da primeira Maioria-Governo-Presidente da Direita. Esta realidade marcou uma diferença de fundo, mormente por parte do PSD de Passos Coelho: a coligação governativa atuou estrategicamente para mudar a natureza da vida e da organização social do País e dos portugueses. Não se tratou apenas de, temporariamente, se exigirem custos sociais aos portugueses, mas de operar, em seu nome, mudanças estruturais de fundo e, tanto quanto possível irreversíveis: privatizar tudo o que pudesse ser privatizado, mormente pondo um fim no Estado Social.
Fruto de sabedoria política, PS, PCP, Verdes e Bloco de Esquerda foram capazes de colocar os portugueses à frente dos indicadores económicos e da máquina financeira do nosso tempo, juntando forças para operarem a retoma, tão vasta quanto possível, do que a generalidade dos portugueses havia perdido. O resultado, como todos hoje reconhecem – excetuam-se os interessados ou clubistas da Direita –, foi exemplar. Simplesmente, nunca seria possível apagar toda a História já decorrida.
Convém aqui recordar que esta retoma se sustentou em objetivos políticos, fortemente ligados à Constituição da República, mas também num suporte técnico mui qualificado, constituído por um conjunto de economistas, de onde sobressaiu Mário Centeno. E até Manuela Ferreira Leite, colocada perante o plano antes referido, respondeu sensivelmente deste modo, no seu programa dominical: bom, perante um trabalho de uma diversidade grande de economistas muito qualificados, para mais liderados por alguém como Mário Centeno, o que é que eu posso dizer?... De molde que volto a repetir: o resultado, como todos hoje reconhecem – excetuam-se os interessados ou clubistas da Direita –, foi exemplar.
À medida que o tempo vem decorrendo, fruto, talvez acima de tudo o mais, do constante brandir intriguista da grande comunicação social, sempre à procura do que possa soar a caso e permitir audiências, começaram a entrechocarem-se sonhos, dúvidas e receios. Sonhos de uma Direita sem outro objetivo que não sejam concessões do PS com vista à minimização da atual estrutura do Estado Social; dúvidas sobre o potencial da atual estrutura da Esquerda, que continua bem amplo; e receios dos partidos da Esquerda sobre uma possível viragem do PS de António Costa para o PSD de Rui Rio, que bem precisa do primeiro para parar a sangria que, aparentemente, se estará a dar em favor do CDS. Quem não tem dúvida sobre a ausência de uma maioria absoluta é António Costa e os seus camaradas do PS.
À luz deste modelo explicativo, que me parece evidentíssimo, a crise há dias surgida nada tem que ver com dificuldades do PS, incluindo os resultados das eleições de deputados para o Parlamento Europeu. O silêncio ao redor da candidatura do PS só se deve ao facto de os portugueses simplesmente não terem interesse neste tipo de temática política. Nem por via de poder o PS sonhar com uma maioria absoluta nas eleições para deputados à Assembleia da República, porque António Costa tem uma noção clara da realidade política da sociedade portuguesa hoje.
A recente crise resultou da tentativa de repetir o que já se dera ao tempo do Governo Sócrates, já pelo seu final: todos os partidos que não estão no Governo, por razões diferentes, tentaram encalacrar o Governo, procurando deitar por terá a excelente obra realizada pelo atual Governo de António Costa ao serviço de Portugal e dos portugueses.
Perante uma tal realidade, o Primeiro-Ministro, António Costa, fez o que um político sério e que respeita os seus concidadãos sempre faria: desapegou-se do poder e recusou tentar salvar o lugar a qualquer preço, deixando-se ir a reboque da onda de promessas desastrosas e operadas sem um ínfimo de estudo e ponderação, como tão bem expôs Mário Centeno a José Rodrigues dos Santos. De resto, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa também já referira dados essenciais a ter em conta, na sua participação no programa O OUTRO LADO.
É sempre bom reconhecer que se errou, como agora, de facto, fizeram Assunção Cristas e Rui Rio. Com elevada probabilidade, se a CDU e o Bloco de Esquerda não fizerem agora o que PSD e CDS cometeram de errado, a crise ficará terminada dentro de poucos dias. E é pouco provável que os resultados eleitorais, nos três atos que estão para vir, se modifiquem: probabilidade grande do poder continuar nas mãos do PSD Madeira, e de vir o PS a sair um forte vencedor na Europa e nas eleições ora marcadas para outubro.
Finalmente, um dado muito importante a ter em conta: os portugueses tiveram agora a oportunidade de poder perceber, a menos de um mínimo de dúvida, o que lhes voltará a acontecer se, por distração eleitoral, voltarem, um dia, a colocar a Direita no exercício do poder. Objetivamente, não foi o PS que se mostrou em pânico nesta situação recente. Pelo contrário: mostrou-se, até, profundamente desapegado do poder, mostrando que se movimenta por princípios políticos destinados a servir Portugal e os portugueses. E é bom ter percebido que António Costa, ao contrário de Rui Rio, respondeu a perguntas dos jornalistas...