Que silêncio...

|Hélio Bernardo Lopes|
Malgrado os meu setenta e um anos de vida, a verdade é que ainda consigo admirar-me com certos acontecimentos que nos vêm chegando. Um desses acontecimentos foi tudo o que nos foi revelado pelo programa da TVI, na passada semana, ao redor da Universidade Católica Portuguesa.

Como pude já expor, trata-se de uma realidade conhecida de muita gente ligada ao ambiente académico e desde há muito. Desta vez, porém, a temática foi levada ao conhecimento da generalidade dos portugueses que acompanham estes programas de investigação, por aí chegando a muito mais. O que me vem causando aqui algum espanto é o tumular silêncio com que a nossa grande comunicação social televisiva abafou esta realidade, quase não se tendo voltado a tratar da mesma. Para já não referir os nossos intelectuais, sempre tão ágeis hoje a passear-se pelos nossos canais televisivos, mas evitando, com embaraço notório, abordar esta questão.

Num outro programa semanal recente – O ÚLTIMO APAGA A LUZ –, a escritora Teolinda Gersão, salientando logo nada ter lido sobre o tema, mas de que ouvira falar, contou um episódio que decorreu ao seu redor, por via de certo descendente de uma família sua conhecida. Certo jovem que completara o secundário mas era um aluno muito fraco, conseguira aceder a um curso de licenciatura da Universidade Católica Portuguesa. Estranhando a situação, Teolinda procurou saber como se conseguira tal, tendo-lhe sido explicado que aquela universidade dispõe de uma quota de entradas para filhos de famílias benfeitoras da Igreja Católica, tendo sido essa a razão da entrada daquele jovem. Bom, terá ficado fortemente surpreendida.

Acontece que eu fui explicador de certo aluno da Universidade Lusíada em diversas disciplinas de Matemática no Curso de Gestão de Empresas. Em certo dia, o jovem, lá me contou que havia tentado entrar para a Católica, tendo o pai proposto à reitoria oferecer 3 000 contos, mas que a universidade não havia aceitado. Achei graça e referi até que essa prática era muito utilizado nos Estados Unidos, onde gente quase sem saber ler nem escrever, mas materialmente poderosa, ia conseguindo entrar para as universidades. E referi também a infeliz ideia do Bastonário da Ordem dos Médicos do tempo, Germano de Sousa, de escolher os alunos que seguiriam Medicina através da estrutura do seu perfil, tendo-me rido bastante, tal como o referido aluno.

Esta prática da Universidade Católica Portuguesa é em tudo idêntica à que muitas entidades sociais de utilidade pública aplicavam em tempos, até ter sido proibida: recebiam utentes idosos, que pagariam a mensalidade exigida, mas com a condição de oferecerem bens de valor à entidade em causa, de molde a fortalecer o respetivo património. Com frequência, os bens oferecidos eram habitações. Em contrapartida, ocorre-me sempre que o Vaticano doou para as vítimas do terramoto no Haiti...25 000 euros. E, no caso do mais recente tsunami no Pacífico, o valor em jogo simplesmente não foi (ainda) revelado. Fantásticos exemplos.

Estamos numa segunda-feira, pelo que sempre estou para ver o que nos irá dizer Miguel Sousa Tavares na sua intervenção no noticiário da noite. Enfim, está aqui, bem à vista de todos, como o facto de se viver numa dita democracia, para lá de não inviabilizar estas situações, também não consegue evitar a histórica medufa dos portugueses. A tal medufa que permitiu que o regime constitucional da II República tivesse vigorado, nas calmas, durante quase meio século.

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