Tristeza

|Hélio Bernardo Lopes|
Foi com um sentimento de tristeza que anteontem acompanhei a entrevista que o nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, concedeu ao programa 360, da SIC Notícias. Uma tristeza que derivou, em mui boa medida, do valor que reconheço em Augusto Santos Silva e que há muito reputo de excecional.

Como se sabe, Augusto Santos Silva dispõe de uma experiência política relativamente invulgar e ampla em Portugal, para o que basta consultar, por exemplo, a Wikipédia. E, muito acima de tal realidade, é hoje professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, instituições de grande prestígio, interno e internacional, e desde há muito. À profunda e publicamente reconhecida profundidade académica, o nosso ministro deu provas de enorme capacidade no plano da intervenção política. Para já não referir as suas excelentes intervenções enquanto comentador político, mormente na TVI 24. Enfim, um palmarés notável.

Ora, foi por tudo isto que na noite de anteontem me vim a sentir bastante triste com a sua entrevista ao 360, da RTP 3. Infelizmente, Augusto Santos Silva limitou-se a lamentar as dezenas de mortos e milhares de feridos ocorridos na faixa de Gaza, ao mesmo tempo que se determinou a apelar à contenção das partes envolvidas! Uma autêntica atitude bissetriz, porque Israel viola tudo e todos desde o dia em que se tornou um Estado da Comunidade Internacional. E nem nunca se determinou a respeitar o Direito Internacional Público nem as suas instituições. Para já não falar dos homicídios de Estado praticados nos territórios de Estados estrangeiros contra os assassinos dos seus atletas olímpicos, ou sobre cientistas ligados a trabalhos no domínio da Física Nuclear. É espantoso que se possa vir dizer, depois de mais este massacre do exército de Israel, que lhe assiste o direito de autodefesa, mas havendo sempre que observar o princípio da proporcionalidade no uso da força, assim como respeitar o direito dos palestinianos a protestar pacificamente! Simplesmente inenarrável!!

Fora da mais ínfima dose de realismo objetivo, os nossos detentores de soberania insistem na solução de dois Estados, quando há muito se percebe que Israel nunca irá respeitar uma tal norma, até pelas sucessivas anexações que vem fazendo, desde há décadas, de territórios que nunca lhe pertenceram nem, nos termos da forma legal, lhe pertencem.

Portugal, ao menos por uma vez nesta III República, deveria assumir-se como portador de uma mensagem de realismo político sincero, apontando a constituição de um só Estado, o de Israel, como o que deverá vir a ser criado naquelas paragens. O que nunca deveria fazer é continuar a defender o politicamente correto, agora que volta a estar à vista a completa inutilidade das Nações Unidas, para mais com António Guterres como seu Secretário-Geral.

A solução a encontrar terá de ser de um outro tipo, reconhecendo, desde logo, o erro em que se constituiu a intervenção do Ocidente no Médio Oriente, e que, chegados a este ponto, as coisas só serão reversíveis por via de uma qualquer intervenção divina. Mas tudo ainda se torna mais triste quando nos é dado assistir a uma personalidade com o altíssimo nível de Augusto Santos Silva ter de defender o absolutamente inviável, mostrando-se também incapaz de condenar mais este massacre do exército de Israel. Será que o nosso embaixador em Telavive virá a ser chamado para consultas, à semelhança do que teve lugar com o embuste dos Skripal? Claro que não! E é pelo comportamento do Ocidente perante mais este massacre – só palavras sem nexo – que se percebe a guerra que se vem movendo contra o Islão. Tudo o resto é conversa para entreter telespectadores.

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