Sintomático

|Hélio Bernardo Lopes|
Num dia destes tive oportunidade de escrever sobre o meu Natal, mormente ao redor das lembranças recebidas e oferecidas. E tudo isto no seio de uma família razoavelmente grande e onde acabou por assentar arraiais a prática da oferta de livros, com base numa lista já previamente combinada, de molde a conseguir um acesso bom, ao longo de meses, a um leque vasto e interessante de obras. E obras de tipo diverso.

Pelo meu lado e pelos relativos ao meu filho e nora, os livros foram adquiridos numa muitíssimo boa livraria da nossa zona residencial. Creio mesmo que alguns dos restantes familiares também assim procederam, dado que a zona residencial é a mesma. Ali se adquiriram, numa estimativa próxima da realidade, cerca de uma vintena de obras. Talvez um pouco menos, uma vez que duas das famílias presentes na Noite de Natal moram longe da minha zona de residência.

Ao longo do ano, de um modo muito geral, fui passando por esta livraria duas ou três vezes por semana, adquirindo, volta que não volta, algum livro. A verdade é que raramente ali encontrei alguém a efetuar uma compra. Mesmo no dia em que ali estive a adquirir as obres que oferecemos, também não estava mais ninguém, embora com gente a passar ao redor a cada segundo.

Pois, ontem mesmo, aí pelas onze e meia, depois de termos tomado uma ligeira refeição matinal, lá fui, mais uma vez, à livraria, agora para saber do custo de certa obra de que ouvi mui boas referências. Ao sair, reparei num papel afixado na porta e que não deixxava dúvidas: informamos que a livraria encerrará a partir de 15 de janeiro.

Confirmada a suspeita evidente, lá fui conversando com a minha mulher sobre o enorme desinteresse hoje mantido em face da leitura de livros. E também de muitas outras coisas de natureza cultural. E recordei-lhe que nesta quarta-feira, no Museu da Música, muito próximo de nossa casa, terá lugar uma intervenção de certa orquestra portuguesa. Quase com toda a certeza, lá estaremos, aproveitando para jantarmos num restaurante chinês muito próximo e igualmente bom. Até porque, nos termos do quase certo, não ocorrerá chuva a essa hora.

Também lhe referi que, em todo tempo das ditas férias do Natal dos meus netos, nos cafés que frequento, tirando a leitura de jornais desportivos, raramente vi alguém a ler livros. Talvez umas duas pessoas, uma delas muito conhecida das televisões. Se a este panorama somarmos as noites em casa, em geral passadas com a televisão, ou os jogos de consolas com a rapaziada, percebe-se que o desinteresse pela cultura é hoje muito grande.

Esta livraria perto de nossa casa é, afinal, mais uma que vai encerrar. Há perto de uma semana, à distância de três paragens de autocarro, fechou uma outra, a Ulmeiro. O que significa que é muito limitado – talvez em decrescendo – o interesse pela cultura. E a todos os níveis. De molde que expus esta realidade ao meu filho ontem à noite, por termos tido de encontrar-nos. Salientei-lhe a necessidade de incrementar a visita da minha netinha a museus e galerias de arte. E, no mínimo, a uma récita operática anual que se mostra apelativa. Se aqui conseguir lugares na primeira fila da plateia, ela vai ter o maestro a um metro de distância, podendo igualmente ver a orquestra atuar. O que lhe será muito agradável, porque adora as aulas de guitarra que frequenta a título particular.

Espero agora que a nova programação da RTP Memória venha trazer-nos bons programas de natureza cultural e histórica, e que a RTP 2 continue a debitar excelentes programas e séries. E que a minha junta de freguesia incremente o número de conferências e debates. Há que lutar pela cultura!

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