O terrorismo e as secretas

|Hélio Bernardo Lopes|
Nada poderia ser melhor para os políticos dominados por espírito falcão que os recentes atentados de Bruxelas. Num ápice, esquecendo todas as responsabilidades do próprio Ocidente, os falcões de pronto surgem a pedir mais medidas. Mormente as realizadas pelas secretas, em geral sem controlo público.

O mesmo se pode dizer dos ambientes militares, onde de pronto todos surgem a pedir mais dinheiro e meios. E isto apesar dos fantásticos meios de que dispõem as potências que realmente contam, mas que parecem não servir de muito. Não fora a ação da Força Aeroespacial da Rússia, e ainda hoje o Estado Islâmico estaria no seu auge e a financiar-se com o petróleo e as riquezas arqueológicas vendidas a Estados do Ocidente.

Sem grandes meios acrescidos, se eu fosse o líder da Polícia Judiciária, ou do Serviço de Informações de Segurança, de há muito tinha posto em prática uma boa estratégia preventiva contra a possibilidade de virem a ter lugar em Portugal acontecimentos como os de França e da Bélgica. Mesmo com os meios atualmente disponíveis, pode fazer-se muitíssimo mais e melhor.

Invariavelmente, no caso português, pede-se a possibilidade de operar escutas pelos serviços de informações. Algo inacreditavelmente, o nosso fraco jornalismo não vislumbra esta contradição: sem a possibilidade de operar escutas, não temos atentados; os que as fazem, são alvo de violência terrorista vasta. Claro está que pode sempre dizer-se que muitos outros atentados foram já evitados, o que, de facto, não se sabe. O que se sabe é que mui boa informação esteve sempre disponível mas não aproveitada. Uma realidade que vem já do 11 de Setembro. Mas mesmo depois deste acontecimento, as medidas de segurança tomadas foram as que acabaram por permitir o suicídio e o homicídio múltiplo do piloto alemão nos Pirenéus. O crime só foi possível por via das medidas de segurança entretanto implementadas.

O terrorismo a que estamos a assistir tem causas longínquas e outras recentes. As primaciais, contudo, são as recentes. E a razão é dupla: por um lado, a loucura dos Estados Unidos, ao pretenderem cercar a Rússia de hoje, que se deitou a não vender as suas riquezas a pataco; por outro lado, a mania de fabricar democracias à força, em geral a partir de uma ignorância histórica profunda, mas também com um desprezo supremo pelos povos que estiverem colonizados até há décadas atrás.

O Ocidente vive hoje com os olhos postos no dinheiro e na negociata, esquecendo as pessoas e a sua dignidade. Até mesmo os próprios ocidentais. No espaço europeu esta atitude tornou-se mais aguda, dado o modo muito aberto como o mesmo funciona: tudo entra, tudo sai, tudo se vendo, tudo se compra. Um ambiente que se aproveitou, em matéria da grande criminalidade organizada transnacional do mecanismo de Schengen. Porque este ou existe ou não existe. Se existe, há negociata vasta, mas risco acrescido. Se não existe, aumenta a segurança global, mas perde-se na negociata. Como se sabe, tem aqui um enorme predomínio a negociata.

É neste ambiente, em face do seu fracasso, que as secretas pedem cada vez mais poderes. Mas facilmente se percebe que tudo acabará por saldar-se num autêntico ambiente de perda forte de liberdade democrática. Democracia hoje completamente reduzida a mera fachada periódica, apenas destinada a poder gritar que os governantes têm a legitimada dada pelos votos dos eleitores. Uma conclusão é hoje certa: depois do que já pôde saber-se pelo julgamento do antigo líder do SIED, Jorge Silva Carvalho, aumentar, mais ainda, os poderes das secretas é correr um risco completamente inútil. Até porque sem escutas – é o que diz a legislação em vigor – não temos tido atentados, sendo que os que os vêm sofrendo são os que possuem as tais escutas legais. É essencial ter muito cuidado, porque o direito à asneira é muito livre...

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