Mais um empate técnico

|Hélio Bernardo Lopes|
Tenho aqui que dizer ao leitor que, num certo sentido, estava mais ansioso com o resultado das eleições gregas de ontem do que com as nossas de 4 de outubro. E a razão era dupla: porque tomo por certo que os portugueses, mau grado tudo, terão bom senso e não voltarão a reconduzir a atual coligação governativa e porque desejava voltar a testar a mais recente jogada política que vem correndo o mundo – a do designado empate técnico – e que lá acabou por chegar.

Como o leitor certamente recorda, já nas anteriores eleições gregas nos surgiam os nossos jornalistas a papaguear o tal empate técnico que, supostamente, estaria a ter lugar. Passavam os dias, e mais ainda os noticiários, e lá nos surgia a garantida boa nova: há um empate técnico na Grécia. Simplesmente, mesmo na Grécia não há duas sem três, de molde que o tema do empate técnico foi sendo passado em profusão em tudo o que era canal televisivo. Bom, caro leitor, eu estava em franja. Até que chegaram as cinco da tarde em Portugal. Abri o televisor e eis que, afinal, à boca das urnas, ... não existia nenhum empate. Tudo não havia passado de mais uma leva de sondagens com a previsão do tal empate técnico.

Afinal, o SYRIZA terá conseguido 35,54 %, com a Nova Democracia a ficar-se a sete pontos percentuais de distância. Um dos nossos diários chamava a esta diferença uma margem curta. De molde que passei a olhar para o tema dos mandatos, tão badalado entre nós. Tal como o empate técnico. Mas tudo não passou de mera olhadela, porque a coligação irá ser a mesma e porque já disporá de uma vantagem de dez deputados sobre o resto do parlamento. Tudo coisas escassas, portanto. Ou seja, o empate técnico, que tão previsto vem sendo por todo o lado...

Recordo aqui, para lá do que se tem passado na Grécia, o que se passou no Reino Unido, nas mais recentes eleições, onde também Ed Miliband ia vencer e dar um novo fôlego aos trabalhistas. Bom, o resultado é conhecido. Ou a histórica eleição presidencial nos Estados Unidos, que teve direito a fotografia e tudo. O problema, como se sabe, é que houve um erro. Ou os mil e um casos que nos foram referidos por Jerónimo de Sousa, num destes dias, ou por Pedro Santana Lopes e Paulo Portas, ao redor do livro, INSONDÁVEIS SONDAGENS, de Diogo Agostinho e Alexandre Guerra.

Estes nossos dois políticos salientaram que estes estudos – usando sondagens – de mercado influenciam o discurso político e as eleições, podendo tornar-se armas de destruição política. O que significa que compete aos cidadãos não lhes darem grande crédito. Não há outro caminho, a não ser o por mim defendido e que referirei adiante.

Simplesmente, no posfácio da obra, Paulo Portas salienta que uma sondagem pode influenciar o discurso político e as eleições, pelo que se as sondagens podem condicionar ou influenciar a democracia, também a sua apresentação, ou a formatação da respetiva interpretação, são um problema grave. Mais uma vez, só os eleitores podem relativizar este realíssimo efeito. E como? Bom, do modo que em tempos certo juiz conselheiro se referiu, à saída do Supremo Tribunal de Justiça, ao livro de Rui Mateus, já com o caso Emaudio acabado de transitar em julgado: só agora o vou ler. Espere, pois, pelas eleições de 4 de outubro, e logo perceberá o real valor das mil e catorze sondagens que por aí andam.

Mas Pedro Santana Lopes foi até mais contundente, ao classificar a questão das sondagens como uma perversão do funcionamento do sistema político, porque é permitido que empresas privadas influenciem de um modo determinante, sem o devido escrutínio, aquele que é o sentido de voto dos cidadãos, considerando ainda que não têm nada de científico e que carecem dos maiores aperfeiçoamentos.

Esta última afirmação – não têm nada de científico…– pode até ser verdadeira, mas desde que se tenha em conta que o português, com enormíssima frequência, não viu, não ouviu, não sabe, não pensa, obedece. Entre diversos outros casos – são muitos –, eu conheço toda uma família que garante não ter votado Cavaco Silva nem PSD, mas que realmente o fez. Por razões de falta de coragem psicológica, são incapazes de dizer que mudaram. E porquê? Porque essa mudança está ligada à ascensão de um dos descendentes a um lugar de relevo e imensamente bem pago. Desconheceram todos, durante muito tempo, que eu conhecia esta realidade, mas falta-lhes agora a coragem para assumir a sua atitude essencialmente interesseira, porque desde há trinta e sete anos se diziam do PS... De molde que pergunto ao leitor: o que responderá este casal – e o resto da família – num questionário? É essencial recordar o que todos têm de conhecer: ainda há quem vá votar por medo de se saber que não votou. Assim, podem sempre dizer que foram para o lado mais conveniente no momento... É o que se passa, por exemplo, com o dito voto em branco.

Por fim, uma pergunta: o que ganha o leitor em ter conhecimento de sondagens? Eu até compreendo que os partidos as mandem fazer – e as paguem –, mas não vejo nenhuma vantagem em conhecê-las. No fundo, procedo como o tal juiz conselheiro, certo de que a minha decisão, porventura errada, é essencialmente minha, resultando da minha apreciação das circunstâncias, da anterior governação e dos projetos apresentados para o futuro. Ora, nós já conhecemos tudo: sabemos o programa do PS, com as contas, e sabemos que a coligação vai continuar a fazer o que fez, dado que tal constitui uma opção ideológica. Ou seja: eu proibiria as sondagens surgidas nos meios de comunicação social. Todos ganhavam exceto, porventura, as empresas de sondagens. Mesmo assim, os partidos poderiam sempre mandá-las fazer. E toda esta barafunda resultando do já histórico empate técnico...

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