|Hélio Bernardo Lopes| |
A primeira parte, não sendo desinteressante, versou sobre a sua obra poética, que já conheço e sobre a qual quem o pretendeu escutar não teria nunca um grande interesse.
Em primeiro lugar, constatei o que de há muito percebi: Alegre tem uma terrível dificuldade em reconhecer que a globalização, a União Europeia – a possível, que é que existe – e a democracia estão a anos-luz de serem compatíveis. Mesmo que apenas pouco.
Manuel Alegre tem a natural dificuldade em reconhecer que o socialismo democrático faliu. E que faliu pela completa entrega doutrinária aos comandantes dos grandes interesses. A generalidade dos dirigentes dos partidos da histórica Internacional Socialista colocaram-se completamente ao lado dos detentores dos grandes interesses e do poder real, dimanado a partir dos Estados Unidos.
Se olharmos o que se passou com o grego PASOK, compreende-se que, perante as caraterísticas históricas do povo grego, outro não iria ser o resultado. E terá sido um resultado que veio para ficar e por muitas décadas. O mesmo se pode dizer das expectativas do PSOE, hoje completamente secundarizado em Espanha, apesar do borracho que agora o dirige. Em França, o líder do Governo, Manuel Valls, chegou mesmo a propor que fosse retirada a palavra Socialista do nome do partido. Em Itália e na Holanda, é o que se vê. E o mesmo só não se dá entre nós por via do desinteresse dos portugueses pela política. Como pude já escrever, o português não é, está.
Em segundo lugar, Manuel Alegre nem sequer ainda consegue reconhecer o que já explicou João Ferreira do Amaral e também agora reconhece o Ministro das Finanças da Grécia: foi um erro aderir à Zona Euro. Eu mesmo vou mais longe: foi um erro a nossa adesão à Europa, porque as medidas adotadas, com ou sem euro, seriam sempre feitas para servir uma estratégia favorável aos poderosos da Europa. A própria França, com Sarkozy ou com Hollande, acabou por ficar para trás, como a História sempre mostrou. Muito mais inteligente foi o Reino Unido, que sempre perseverou em manter a libra e poderá mesmo vir a deixar a União Europeia. Só terá vantagens.
Manuel Alegre olha a União Europeia como uma estrutura dogmática, haja frio ou calor, chuva ou granizo, ciclones de vento frio ou de fogo. E, embora reconheça a real e inaceitável perda de soberania que Portugal sofreu, a verdade é que não consegue encontrar uma saída para a crise, porque essa saída, no seio da União Europeia, simplesmente não é possível. Os Estados da União Europeia são de primeira, de segunda, de terceira, etc.. Não são iguais em deveres passíveis de aplicação igual entre todos. Seria como um campeonato de boxe organizado à revelia do peso dos competidores. O resultado, se Alegre tiver coragem, está à vista de todos.
Em terceiro lugar, por via da sua visão dogmática da Europa, nem consegue reconhecer que o desastre humanitário a que se chegou foi completamente construído à revelia da decisão democrática da generalidade dos povos. Basta olhar a Constituição Europeia e o Tratado Orçamental, este que o PS apoiou, mas já lamenta tê-lo feito, defendendo agora uma aplicação inteligente...
Em quarto lugar, a montanha de contradições ao redor do caso que hoje envolve José Sócrates. Afinal, Alegre acabou por ser mais um a tratar o caso na praça pública. Algo inacreditavelmente – ou não –, ele acha que tudo o que se escreve na grande comunicação social provirá de quem investiga! Sem espanto, António José Teixeira não o questionou sobre o evidente: isto serve quem, Sócrates ou o juiz e o procurador?
Referiu até que o juiz, sendo o das liberdades, devia atuar para defender o arguido, fosse a realidade apresentada pelo procurador a que fosse! Ora, o juiz das liberdades o que tem é de garantir que estas não são postas em causa, arbitrariamente, pela investigação, decidindo de acordo com a sua consciência em função do que lhe foi mostrado e das leis em vigor. O chamado juiz das liberdades não é advogado de defesa de nenhum arguido, mas um decisor que, defendendo as liberdades, direitos e garantias do arguido, tem em conta o que lhe é apresentado pela investigação.
E, em quinto lugar, uma ideia muito certeira: o PS, no futuro, depois de vencer a eleição que se aproxima, deve evitar misturar-se com o PSD ou com o CDS/PP, antes operando com algum radicalismo democrático. É o meu ponto de vista, embora haja que ter em conta que o FMI já está a tentar minar o terreno para o tempo futuro da governação do PS. Enfim, foi uma segunda parte interessante, mas sem mostrar que Alegre já tenha percebido que a democracia, tal como o socialismo democrático, faliram.