Da Representatividade dos Povos

|Daniel Conde|
No dia 18 de Setembro, a Escócia, nação com quase 9 séculos de independência, seguidos de 4 de união dinástica e 3 de união governativa imposta com a Inglaterra, foi a votos num referendo histórico. Não fossem as histéricas ameaças proferidas por James Cameron de “doloroso divórcio”, de um “adeus definitivo” e até de uma fronteira “fortemente armada”, este referendo teria sido imaculado.

Nesse plebiscito, era perguntado aos residentes na Escócia – a estes apenas, e a mais nenhum no Reino Unido – se esta deveria ser um país independente. Falamos de um universo de 5 milhões de habitantes, inserido num Estado com 63 milhões. O “Não” venceu, e a Democracia seguiu o seu caminho.

Agora é a Catalunha, nação independente entre os séculos X e XV, quem quer que os seus habitantes exerçam o seu direito ao voto para aceder à auto-determinação plena. São 5 séculos de independência, seguidos de várias lutas por recuperá-la, uma delas coincidente com a Restauração Portuguesa. Mas “Aqui d’El-Rei!”, que os catalães não se podem pronunciar sozinhos: toda a Espanha teria de ir a votos. É esta a visão do Governo em Madrid, que rapidamente interpôs em Tribunal Constitucional um pedido de ilegalidade desta consulta, imediata e unanimemente aceite pelo destinatário.

Em Portugal, Costa ganhou a Seguro, e a parangona desta vitória é a queda da proposta “populista” do derrotado em se reduzir o número de deputados no Parlamento. Se do populismo e sentido de oportunidade da mesma não teço comentários, algo na denúncia de Costa me fez lembrar o populismo em se pegar numa proposta séria de um adversário – ainda que fragilmente construída – e a etiquetar, pelo seu timing, de populista.

O que faltou a cada candidato explicar foi que o actual sistema de voto, circunscrito a círculos eleitorais, esse sim é um entrave à Democracia, tanto mais que, afinal de contas, um deputado no Parlamento fala pelo país inteiro – que digo, pelo Partido inteiro – e não pela região administrativa que o elegeu – ou que elegeu o seu Partido – o que é à partida um ardiloso contra-senso.

Contudo, uma proposta baseada num círculo nacional, juntaria as dezenas de milhares de votos em partidos que separadamente em cada círculo não chegam para eleger deputado nenhum, somando assim o suficiente para nomear 1, 2, ou quem sabe mais deputados. Um simulador na blogosfera mostra que com a proposta de Seguro de 181 deputados, em havendo um circulo nacional, nas últimas legislativas ter-se-ia ainda assim eleito 2 deputados para o PCTP/MRPP, e outros 2 para o PAN. Populista? Não, democrático. E se a comparação com outros parlamentos mostra que em média temos menos deputados por habitante que outros países, pergunte-se o que fazem de facto grande parte deles em cada legislatura, que contributo dão à nação, e quanto do seu Tesouro subtraem em algumas benesses escandalosas.

Para a representatividade regional, seria altura de instituir a procrastinada regionalização, que a Constituição pede que se conceba desde há 40 anos, e criar uma câmara de senadores, onde cada região elegeria um e um só senador, zelando pelos interesses regionais. Sim, porque as esperanças de círculos como os de Bragança, Portalegre, Évora e Beja, com 2 a 3 deputados cada, de serem alguma vez ouvidos de forma séria no Parlamento, estão entre nada e coisa nenhuma.

Esta Europa de Estados com fobia aos Povos balança-me entre a preocupação e o euro-cepticismo. A mesma Europa, cujo lema oficial é “Unidos na Diversidade”, treme de medo da sua própria História, com mais de dois milénios de uma interminável valsa de uniões de impérios e secessões de Povos. Escócia, Catalunha, País Basco, Córsega, são todos perigosos patinhos feios, que se recusam a seguir a mãe pata do seu Estado, mas que abraçam de igual forma o projecto europeu de cooperação e concórdia.

E não nos riamos desta fobia aparentemente externa: o chamado “bairrismo nortenho” não tem absolutamente nada a ver com rivalidades entre Porto e Lisboa, ou o brejeiro “nortenhos versus ‘mouros’”. Tem a ver sim com o Norte ser histórica e culturalmente uno com a Galiza desde os tempos da Galécia pré-romana, e o restante território nacional estar ligado à Lusitânia e outros povos do Sul. Mas, se chamar de luso a um nortenho e de lusa uma língua que nasceu no Norte não é crime, que seria de nós se estes se lembrassem agora de uma união mais forte com os irmãos da Galécia do Norte? Que São Bento* nos proteja!

*Padroeiro da Europa

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