Em tempo de santos, os demos adam à solta

|Serafim Marques*|
O período pascal findo coincidiu, este ano, com umas condições climatéricas de pré-Verão, como benesse de S. Pedro. 

Esta dádiva veio, assim, contentar aqueles que puderam “ir à terra” celebrar a Páscoa, uma das festividades com maior relevo no mundo rural, embora a perder importância, e aos outros, os seguidores duma certa religião a que chamaremos “hedonismo”, partirem, para umas mini férias à beira mar, enchendo zonas turísticas, com os empresários do sector a agradeceram, porque estes “booms”, mesmo de turismo interno, são balões de oxigénio na economia local e nacional, e ainda mais quando se associam os estrangeiros, cujos países até estavam debaixo de condições climatéricas severas.

Sejam cristãos, islamistas ou outros religiões, incluíndo mesmo o culto “hedonista”, cada um segue a sua fé, desde que o faça em respeito pelas crenças e práticas dos outros, se estas forem feitas de acordo com as leis e com os valores democráticos das sociedades a que pertencem ou onde estão inseridos. Infelizmente, os atentados contra “inimigos” religiosos, cidadãos do mesmo país, está em crescendo, com barbáries cometidas sobre civis indefesos só porque professam outra religião ou servem de pretexto aos grupos extremistas, fazem-nos lembrar os tempos das cruzadas ou mesmo duma certa violência praticada sobre os nativos nos processos de evangelização dos descobridores nas colónias conquistadas aos indígenas, violência pouco mencionado na história.

Nos tempos de hoje e dum maior “desenvolvimento” do homem, estas barbáries e matanças humanas mostram-nos situações de inimaginável horror, mas afinal e apesar do progresso, embora muitas partes do globo tal ainda não tenha acontecido, relevam a “besta humana” que continua dentro de muitas organizações políticas, religiões etc que recorrem às barbaridades humanas, na prossecução dos seus fins político-religiosos, fazendo disso uma forma de vida, por exemplo, os jihadistas, muitos deles nados e criados nas nossas sociedades ocidentais.

Mas também há outros “demos” por aí à solta e que libertam as suas mentes perversas para fazerem o mal, por exemplo, os pirómanos que vão ateando fogos para satisfação dum ego doentio. Com é possível que com os campos ainda verdes do Inverno que há pouco acabou, a onda de fogos no país tenha atingido já várias centenas de fogos, alguns de grandes proporções? Segundo as autoridade e os especialistas, poucos são aqueles imputáveis aos efeitos naturais, pelo que os restantes têm o factor humano por detrás, seja por negligência seja por acção criminosa.

Repito, como é possível, sem o Verão ter ainda começado ocorrerem tantos focos de incêndio, alguns com início em plena noite, naturalmente ainda frias? O que falha na prevenção e na justiça aplicada aos “agentes” incendiários, aqui em sentido lato, porque o cidadão comum “fica de pé atrás acerca dos incêndios” ? Numa altura em que se discute a elaboração duma lista de condenados por pedofilia, dividindo os defensores dos prós e dos contra, mas esquecendo-se sempre das crianças indefesas vítimas dos mais horrendos crimes, não faria sentido, e sem o estigma daquela, elaborar uma lista dos condenados por atearem incêndios, funcionando como forma de persuasão preventiva para a repetição, que em muitos casos ocorre?

Esta “época santa” também não escapou, como excelente oportunidade, aos “gestores das greves” nos transportes (chamemos-lhes assim porque quando falam sobre os resultados das greves utilizam a mesma linguagem dos gestores: “a greve foi um sucesso”, ou , “conseguimos atingir os nossos objectivos”, etc), isto é, os sindicalistas justificam o seu “trabalho” (alguns deles há muito que não fazem outra coisa) pelas greves que determinam, sim, sublinho a palavra “derminam”, porque não creio que seja votada em maioria pelos trabalhadores abrangidos. A CP, praticamente parou nos “dias pascais” e, repare-se nos dias da greve: quinta e sexta feira santa, mas no sábado não houve greve, funcionando os comboios a pleno.

Depois, voltou a greve no domingo e segunda feira de Páscoa. Como grandes “estrategas”, os sindicalistas sabem escolher os dias de greve procurando causar o maior dano à entidade patronal (aos utentes e a todos nós que lhes pagamos os ordenados através da bilhética ou dos nossos impostos) com o menor custo possível para os grevistas (a perda do salário correspondente). Desta vez foi a CP, mas ela mesma e outras EPs dos transportes têm recorrido a um número elevado de greves e outras se anunciam (Carris e Metro de Lisboa), afectando aqueles que lhes pagam os ordenados, sejam os utentes ou os contribuintes, através dos subsídios de exploração àquelas Eps, a maioria deles sem alternativas e auferindo salários muito baixos.

A greve, que em democracia é um direito, deveria ser usada apenas em situações extremas e como “arma de recurso” e não de forma banal como tem sido utilizada ultimamente no nosso país, mas é usada como forma de protesto a actos de gestão empresarial e que, nesse caso, poderão ultrapassar as funções dos sindicalistas, embora a fronteira não seja clara, porque embora certos actos de gestão possam afectar alguns ou a totalidade dos trabalhadores duma empresa, estes actos são da responsabilidade e da autoridade do gestor/empresário (ou dono). Nalguns casos, é a própria sobrevivência da empresa que está em causa, pelo que será legítimo que os sindicalistas (às vezes agindo com outras motivações e a "mando" de interesses que não os dos trabalhadores, mas que dizem defender) se oponham a esses actos e determinem greves, por vezes levando à falência da empresa, como há muitos exemplos na nossa história empresarial destes últimos anos? Infelizmente, os exemplos mostram um certo “divórcio” entre as Comissões de Trabalhadores e os sindicalistas, estes movidos por outros interesses que me dispenso de citar. Quem ganha com estas greves? Alguém, mas não os utilizadores dos serviços prestados pelas EPs e pelo Estado, ou talvez percamos todos nós porque as greves afectam a sociedade e a nossa economia como um todo.

Quem são os responsáveis por este exagero grevista? Os sindicalistas “dinossauros” e os gestores maus negociadores? Provavelmente ambos, mas há reivindicações que vão para além do economicamente aceitável e da equidade e porque são interesses opostos.

Nos tempos que correm, e em especial no nosso país, a atravessar um período difícil e de sacrifícios para todos, custa a entender que os interesses dos trabalhadores duma qualquer empresa sejam assim tão antagónicos com a empresa, porque não há trabalho sem empresas (embora o Estado seja o maior empregador mas que não pode empregar toda a gente), tal como não há empresas sem trabalhadores. Temos que interiorizar que o factor trabalho é um “produto” de compra e venda e embora seja um direito (e não dever?), mas quem o garante? E, como tal, está sujeito à “lei da oferta e da procura” e são os trabalhadores melhor preparados que estarão na linha da frente nas contratações por parte das empresas e menos afectados pelas crises, sejam elas conjunturais ou estruturais. São necessários, cada vez mais, “novos trabalhadores” e “novos”empresários e gestores”, para que ambos os factores económicos ( capital e trabalho), interagindo correctamente e não como inimigos, criem riqueza que a todos beneficia. Banalizar as greves também descredibiliza os trabalhadores e os prejudica e não só a entidade visada pelas “greves pelas greves”.

* Economista

Os cofres estão cheios

|Serafim Marques*|
O Zé da Silva, influenciado pela euforia consumista de há poucos anos atrás, e também pelas palavras do então PM (apesar de ser de formação de engenharia) considerava-se “um grande mestre de economia”, que afirmou de que as dívidas não são para pagar, mas sim para renegociar, mesmo que vão crescendo, até por efeito da inclusão das taxas de juro não pagas, por incapacidade em reduzir despesas ou aumentar os rendimentos, gastou mais do que podia com a sua família, pelo que teve que contrair alguns empréstimos, mesmo quando os credores lhe exigiam condições penosas de prazos de pagamento e elevadas taxas de juro, porque estava com a “corda ao pescoço”.

Quando se apercebeu do “aperto” em que estava, pelo elevado endividamento e sujeito a ser penhorado nalguns dos seus bens patrimoniais, convocou a família para lhes comunicar que teriam que enveredar por um novo modo de vida, isto é, “apertar o cinto” ou, melhor dizendo, implementar um plano de austeridade, de modo a poderem solver os compromissos assumidos no tempo das “vacas gordas” .

Mas os credores, que mesmo que tenham abusado da publicidade apelativa ao consumo e ao endividamento, “encostaram a família Silva à parede” e impuseram-lhe um plano rigoroso de amortização dos empréstimos e, caso a família Silva falhasse alguma das mensalidades, implicaria o vencimento imediato das restantes amortizações vincendas, levando não só a família à bancarrota mas também à penhora dos bens.

Com a crise, o Zé Silva foi tomando juízo e aprendeu que, afinal, o dinheiro que nos emprestam tem dono e, como tal, terá que ser pago. Foi também aprendendo algumas noções de gestão financeira e passou a estar atento aos mercados de capitais, variação das taxas de juro, liquidez, etc, coisas de que todos deveriam saber para não cometerem os erros que ele próprio cometeu, vivendo acima das suas reais posses, ainda por cima gastando dinheiro que pedia emprestado, em bens ou serviços não indispensáveis.

Não fica mal a ninguém querer ser rico, aliás todos o deveriam querer, e sem vergonha, mas lutando por isso com bases sólidas, investindo na sua formação e atitudes pessoais e profissionais, apesar dos riscos da vida, às vezes com grandes reveses que se reflectem na nossa conta bancária.

E a melhor forma é aprender sempre e estar atento ao universo que nos rodeia, pois só assim poderemos vencer. O Zé Silva aprendeu mais nestes últimos anos do que nas mais de quatro dezenas de vida que já leva. Até aprendeu a fazer uma “jogada de mestre” em assunto financeiros, quando se apercebeu que o preço do dinheiro nos mercados (taxas de juro) estavam bem mais baixas do que aquelas a que estava “amarrado”, contratualmente nos empréstimos que terá que pagar.

Assim, conseguiu que lhe emprestassem dinheiro, antecipadamente, para poder liquidar, definitivamente, os “maus empréstimos” substituindo-os por este.

Assim, num repente, os seus “cofres ficaram cheios” (a sua conta bancária) e logo alguns dos familiares lhe exigiam que os libertasse da austeridade em que viviam. – Pai, então tens tanto dinheiro na conta bancária e não podemos “alargar o cinto”? Estás a ser um ditador ou és insensível aos sacrifícios que temos feito? Tem pena de nós e vamos gastar mais, enquanto temos esses dinheiro no cofre. O Zé perdeu as estribeiras e lá puxou não só da sua autoridade de patriarca da família e agora de também “gestor financeiro”, para dizer aos familiares que aquele dinheiro não provinha de qualquer aumento de rendimento familiar nem do euro milhões, mas sim duma mera operação de tesouraria e que se destinaria a pagar os empréstimos cujo vencimento ocorreriam nos próximos tempos. Foi difícil entenderem este tipo de operação que o pai, inteligente e preventivamente, tinha efectuado junto do novo credor. O Zé Silva também não soube utilizar os termos e as justificações adequadas, ainda mais para leigos nas matérias financeiras, pelo que a família só foi vencida pelos “argumentos” do poder do chefe da família.

Afinal, parece que a nossa Ministra das Finanças Maria Luis Albuquerque aprendeu com o Zé Silva e aproveitando-se das boas condições dos mercados de capitais, contraiu, antecipadamente, novos empréstimos para serem utilizados nos pagamentos das dividas pública do Estado a vencer nos próximos tempos, ganhando nas condições, isto é, garantido os fundos e poupando nos juros bastante mais baixos do que os anteriores.

Encheu os cofres de “liquidez” (dinheiro) mas que é apenas isso mesmo uma operação de tesouraria e não provem de aumento de receitas do Estado português e, como tal, não contar para as contas operacionais do Estado (OE). Se a jogada foi de mestre, já as palavras que a ministra utilizou foi duma grande ingenuidade política , ao dizer que “o país tem os cofres cheios”.

Assim, deu oportunidade aos opositores ao governo de enveredarem pela demagogia, a campanha eleitoral há muito que começou, dizendo que este Governo é duma grande insensibilidade, porque tem os cofres cheios e não os distribui pelos portugueses carenciados! Ao líder do PS António Costa, candidato a futuro PM, fica muito mal ter dito isto, porque, sabe que aquele dinheiro tem um fim específico, pelo que com a sua “acusação” ao Governo chamou ignorantes aos portugueses que entendem alguma coisa, mesmo que mínima como o Zé Silva, das questões financeiras.

Mas mais grave, lançou mais uma “acha para a fogueira” no povo que é , sistematicamente , “envenenado” e enganado por todos aqueles que o deveriam informar, ainda mais com grandes responsabilidades governativas, directas ou indirectas, pelo estado a que chegou o nosso país. Por isso, não fiquemos admirados pelo “divórcio” entre o povo e os políticos que nos (des) governam e nos tratam como “burros”. “Porca da política”, esta que temos.

*Economista

Amor, a Realidade e a Utopia

|Serafim Marques|
“Amor? É uma loucura do sangue que o espírito consente”- W. S. “Vi-a, corei e empalideci, elevando-se um tumulto na minha alma enlouquecida. Os meus olhos deixaram de ver, não conseguia falar e todo o meu corpo parecia que ardia”- J.R.. Estas duas citações, levam-nos para aquilo que se designa por paixão, porque o amor, no sentido incondicional do termo e tão difícil de definir, poderá acontecer, ou não, depois de “saciada” essa emoção mais corporal do que afectiva.

O amor, nessa fase de maturidade, digamos assim, contém, dentro de si, emoções que nos podem destruir, como seja o medo, a tristeza, a cólera, o desejo sexual, a insegurança afectiva e da intimidade, etc. Se não houver outros suportes nos desejos e sentimentos das partes envolvidas, passada a fase da paixão, poderá surgir a rotura, por vezes violenta ou, no mínimo frustrante porque reveladora de incompatibilidades perante uma vida em comum que se tornou mais difícil ou entrou em rotura e desregulação.

O dia de S. Valentim é, em termos de negócios muito importante e a lenda (melhor, as duas lendas com origens e versões diferentes mas todas com o mesmo sentimento: celebrar o enamoramento e o amor) é ternurenta mas o marketing aproveitou-se dela e , assim, o dia dos namorados foi pervertido.

Nesse dia, os “namorados” procuram celebrar o enamoramento e o amor (aqueles que o têm) ou fingem que ainda há amor para que o ambiente e as relações conjugais não se esfriem ou fiquem mais tensas. E de modo a evitar males maiores, pode “mentir-se ao amor”, ofertando algo que tente substituir o amor que é feito de entregas ao outro, de reconhecimento e de envolvimento mútuo, pois o amor profundo é feito de dádivas e amar o outro como desejaria ser amado.

Como sintomas de que “namorar e amar dá muito trabalho”, precisamos de inventar festas e atitudes que preencham um certo carnaval da nossa vida, muito “materialista” e, mesmo que inconscientemente, esvaziarmo-nos, pelo que há muitos lares onde apenas restam os escombros, porque está vazio ou cheio de feridas, por vezes carregadas de ódio ao outro. Ali restam as memórias e as recordações do que foi um lar cheio de sonhos assente num objectivo comum : o amor.

Mas e aqueles que não têm um amor, aqui este amor no sentido conjugal e não nas outras formas de amor, essas mais genuínas e puras, como vivem? Há estudiosos desta matéria que concluíram que não existe amor entre adultos, mesmo que sejam “conjugais”. Entre esses, existe uma relação que se baseia, por vezes,dependendo da idade e duração das mesmas ou dos pares, noutros factores como sejam atracção física, sexual, interesses sócio-económicos, etc.

Mas os interesses pelo amor, tema que factura milhões em várias áreas (cinema, literatura, música, espectáculos diversos, festas de celebração, etc.), aumentaram desde que o casamento no ocidente começou a ter como base o “amor” e não apenas um contrato, como ainda o é em muitos países, religiões, etc. Obviamente, com esse “amor” é muito provável que depois surja o “desamor”, seja no conceito da perda da paixão e da atracção ou convertida mesmo numa forma de intolerância e que pode levar à violência conjugal (com mau historial no nosso país, tal o número de factos e mortes de mulheres, que ocorrem em cada ano) cuja origem está nas roturas conjugais onde o amor ou nunca existiu ou a roturas fizeram emergir graves defeitos das mentes de muitas pessoas, algumas elas próprias vítimas de violência familiar anterior.

Segundo alguns estudiosos, o único, genuíno e verdadeiro amor é aquela sensação e as relações de e para com as crianças, principalmente para com os nossos filhos. Depois e porque estes crescem e se convertem em adultos, o amor já não tem a mesma riqueza e surgem até divergências, por vezes violentas. Ademais, embora cada vez mais raro, porque o “amor conjugal” se desviou para outros campos (consumismo, hedonismo, zoomania - mania em ter animais ou interesse e “amor “ excessivos pelos mesmos -, etc) a natalidade desceu e, por isso, há cada vez menos netos, privando-nos, assim, de voltarmos a sentir o verdadeiro amor para com e das crianças. Porque o amor abre e fecha ciclos nas nossas vidas e pobres daqueles que não têm a felicidade de voltarem a saborear esse enorme prazer. Diria até que que é indescritível o amor que podemos sentir por uma criança, desde que ela nasce até se converter num adulto, por vezes já numa adolescência sem a mesma pureza ou mesmo muito problemática e conflituosa para com os seus ascendentes (pais e avós).

O amor é uma utopia, contudo se para uns é “um faz de conta”, para outros, é algo sublime, mesmo até entre dois adultos, agora sem preconceitos sexuais, que pode ocorrer até já nas idades dos “entas”. E se ambos puderem partilhar esses amor com os netos, que até podem ser - “os meus, os teus e os nossos” - se a saúde ajudar, então o nosso “final de vida” pode ser maravilhoso e terno.

Até lá e porque a vida é feita de gerações, embora com uma séria ameaça de rotura, celebremos o dia dos “namorados”, mas façamo-lo com muito mais do que a troca dum objecto de consumismo ou de marketing ou praticar um gesto hipócrita, tipo faz de conta. Será uma oportunidade para nos envergonharmos do número de mulheres mortas (quarenta e três no ano de 2014), e da violência doméstica, pelos seus companheiros, alguns ainda e apenas como namorados.

Neste ano de 2015, o número de casos parece estar na linha da do último ano, revelando que as relações e as roturas conjugais são um problema grave e a merecer, por isso, a atenção de todos nós, porque há ainda as crianças afectadas por esses homicídios e orfandade, até porque, em muitas situações, acabam em suicídios dos autores.

Aceitemos que o amor, embora também noutras áreas, é a arma mais poderosa contra muitas doenças das sociedades modernas (ódio, racismo, solidão, depressão, egoísmo, materialismo, etc), pelo que devemos adoptar as nossas atitudes , gestos e assertividade de modo a que se evitem os conflitos. Até a medicina reconhece que o viver enamorado das pessoas e da vida (namorar, amar, autoestima, positivismo, etc) é das melhores receitas para proteger o coração, aqui no sentido físico, porque libertamos grandes quantidades de hormonas que ajudam a proteger-nos, também contra a depressão, esta já considerada uma epidemia dos tempos modernos, etc.

Aquilo que recebemos, através do amor verdadeiro, é muito mais do que quanto damos, seja a crianças, adolescentes, adultos e idosos, porque em todas estas faixas etárias existe muita falta de amor e solidão e que, em muitos casos,a dor mata.

Contudo, o amor é como uma planta que, para não morrer antes do seu tempo, tem que ser cuidada de modo a resistir às tempestades da vida, mas também à bonança e gerar os frutos que alimentam a alma. Amar é cuidar e saberemos como fazer isso? Para a vida profissional e até para o lazer, tiramos cursos e investimos dinheiro e tempo, mas para a nossa vida afectiva, familiar e social, somos autodidatas.

Não é suficiente, dizem os “psis”, pelo que as sociedades modernas pagarão um custo elevado pelas consequências do desamor. Que S. Valentim nos acuda, apetece-nos gritar em prece e vale a pena meditar: "Este amor tão violento, tão frágil, tão terno, tão desesperado. Este amor, belo como o dia e mau como o tempo, quando está mau tempo. Este amor tão verdadeiro, tão feliz, tão alegre, mas tremendo de medo como uma criança no escuro "- do livro Saber Amar.

O Vazio do Pós Festas Natalícias

|Serafim Marques|
Neste Natal, S. Pedro bafejou-nos com temperaturas amenas e soalheiras, mais parecendo uma primavera extemporânea. Então o dia pós Natal foi um dia radiante de sol, permitindo a muitos cidadãos e muitos turistas usufruírem desse privilégio. 

Fui daqueles que ousei deixar o meu bairro, onde parecia pairar um “ar de tristeza” e viajar até à beira-rio (mar), onde poderia encontrar, o sol de inverno e espraiar os já muito vistos horizontes, mas sempre diferentes porque diferente é sempre o nosso estado de alma. Escolhi um dos destinos e a opção tomada recomendava mesmo a utilização dos transportes públicos, em vez do automóvel.

Planeei, sem grande rigor, o percurso que iria fazer, tentando descobrir coisas novas, apesar dos cinquenta e dois anos a viver na cidade, e revisitar espaços renovados que vão embelezando a cidade, sem , contudo, esta deixar de exibir muitas das coisas que nos deveriam envergonhar, como seja prédios devolutos e a ameaçar ruínas em zonas nobres e turísticas, cenários idênticos a muitas das nossas vilas e cidades, cujos centros históricos mais parecem ruínas duma qualquer guerra ou bombardeamentos. Fiquei surpreendido com a imensidão de gente, de várias idades e nacionalidades que passeavam pela zona ribeirinha e pela baixa da cidade e eu, turista solitário na minha cidade, ia observando, como se fosse a primeira vez, e fotografando, ao mesmo tempo que sentia alegria, mas também uma certa vergonha pelas coisas feias que ofuscam as nossas belezas.

Cansado e porque estava na hora do regresso a casa, preparava-me para esperar pelo autocarro, quando deparei com um antigo colega da faculdade que, como eu, tinha descido até à baixa para matar saudades dos tempos em que ali trabalhávamos, porque era ali o centro de negócios da cidade, hoje deslocado para várias zonas novas, deixando a baixa numa espécie de cidade morta. Depois do olá como estás e tens passado, logicamente teria que vir à baila o tema das festas de Natal e notei um certa tristeza na voz do meu amigo. Desafiei-o a abrir-se e, então, lá foi dizendo que, afinal, este dia de Natal tinha sido complicado para ele e quase que se arriscou a passar o dia sozinho, porque esta nova realidade dos modelos de famílias alterou-se profundamente, isto é, famílias reagrupadas, monoparentais, uniões de facto, etc, que obriga os diversos elementos (netos, filhos, genros, noras, sogros, ex-sogros, novos cônjuges, etc) a gerirem, às vezes com dificuldade, as presenças nos diferentes lares, por força dos cruzamentos conjugais e familiares, por vezes, geradores de conflitos familiares, porque a homogeneidade tornou-se mais difícil. Em muitas ceias ou almoços de Natal o stress pode ser difícil de gerir e nalguns emergem conflitos latentes.

Mas voltando aquilo que o meu amigo ia contando, dizia ele que o que o salvou da solidão em dia de Natal foi lembrar-se de que um seu amigo, também ele divorciado, tinha um problema semelhante porque desejava almoçar com os seus filhos adolescentes e não o podendo fazer na casa da sua ex-mulher, já a viver uma nova relação, também não o poderia fazer na casa onde vive com a nova companheira, porque os filhos não aceitam essa relação.Tinha que encontrar um restaurante aberto no dia de Natal e, para isso, percorreu, uns dias antes, uma parte significativa da cidade à procura dum que estivesse aberto nesse dia e ali pudesse levar os filhos para o almoço de Natal. Acabou por encontrar um, bastante simples, e lá foram os quatro almoçar, cumprindo um dever paternal.

Depois da despedida dos filhos, ficaram ambos os amigos a falar dos velhos tempos, mas o tema natal também foi abordado. Desabafou-lhe o amigo que a refeição lhe “caiu mal”, talvez porque as lágrimas invisíveis, aquelas que são geradas na alma, lhe “azedaram” o estômago, porque, disse com mágoa, o almoço não terá despertado entusiasmo nos filhos, porque as roturas familiares, por divórcio, são feridas difíceis de sarar.

Continuou o meu amigo a dizer que no período de Natal, com um stressante frenesim, tentamos fazer crer, aos outros e a nós mesmos, que é a festa da alegria, da família, do amor, do perdão, da solidariedade, etc .

Pura hipocrisia, porque é um período para dar largas ao consumismo, ao materialismo, às gulas gastronómicas e ao faz de conta de falsos perdões e amizades, porque o espírito genuíno do Natal assenta noutros valores que se foram perdendo. Como disse o Papa Francisco, há católicos incoerentes, porque se dizem cristãos, mas vivem como pagãos, porque o Natal está transformado numa festa pagã, pois não assenta nos valores originais da família, muito bem “retratada” pelo presépio, paradoxalmente, agora muito na moda, talvez para contra balançar essa carga pagã do Natal, mesmo nos seio dos cristãos.

Por isso e antes que se percam ainda mais os valores que vão resistindo, é urgente que o espírito de Natal deixe de ter esse cunho vincadamente mercantilista, acabando por sermos vítimas desse culto do consumismo, porque sofremos com a ansiedade da festa pagã e depois arriscamos a sentirmos um vazio posterior. Essa frustração, para não lhe chamarmos mesmo revolta ou egoismo, é também visível em muitas crianças, para muitas famílias e onde elas existem, o centro do Natal, mas cuja mente já foi por nós pervertida.

Acabei por compreender a tristeza revelada pelo meu amigo, que só é uma doença se ela for causa e efeito em simultâneo. Ela faz parte da lista das emoções humanas e estar triste pode até ser salutar porque nos permite dar valor a certas coisas que não temos ou já tivemos e perdemos. Ademais, ela molda os nossos sentimentos humanos e só é doença se for persistente e ou patológica. Nesse caso, deve ser objecto de diagnóstico das causas e do respectivo tratamento nas área das “psico” (Psicologia ou Psiquiatria), conforme a gravidade da situação.

Contudo, numa época em que vivemos o Natal apenas durante dois ou três dias, menosprezando, nos restantes dias do ano, os valores do natal, é um indicador de doença que urge curar, para defesa da humanidade, porque o Natal deve ser vivido o ano todo, nos valores que ele encerra. So poderemos viver normalmente o Natal, se o vivermos o ano todo.

Anima-te, disse-lhe, na despedida, porque a seguir vêm as festas da “passagem de ano”, com um cariz diferente, mas com a mesma loucura dos “faz de conta”, em vez de se aproveitar para fazer o balanço dum ano que acaba e projectar objectivos para o outro que começará. Haja “festas”, porque o povo gosta e o mercantilismo agradece, mesmo com a crise e o elevado endividamento de muita gente.

A Falta do Pai

|Serafim Marques|
Quando caminhamos, pelas ruas, dominados pelos nossos sentimentos e problemas, normalmente com a cabeça baixa, nem nos damos conta dos dramas de muitos com quem nos cruzamos, mas, se mais libertos dos nossos “egocentrismos”, poderemos olhar no rosto dos transeuntes com quem nos cruzamos e tentarmos “ler” o que lhe vai na alma, sim porque “o rosto são os olhos da alma” de cada um de nós, que pode ser de felicidade ou tristeza ,de angústias ou reflexo dos problemas que as afligem.

Por mim, e porque me apaixonei pela Psicosociologia, essa parente pobre das ciências (sociais,) e cujo atraso, em relação às demais ciências, provoca muitos “danos” nas pessoas, essa percepção das emoções e sentimentos, dizia eu, é feita sem qualquer sentido de “voyerismo”, mas apenas porque me apaixona observar as pessoas e tentar penetrar na sua alma que, mesmo pela observação, não é assim tão difícil de se conseguir. Pelo menos, poderemos ler no rosto o seu “mundo”. Não destaco, no meu interesse de observação, qualquer faixa etária em especial, porque cada uma tem o seu interesse psicosociológico de observação. Da pureza e ingenuidade das crianças, do desabrochar dos adolescentes, da maioridade ou maturidade dos jovens adultos, até aos idosos, muitos deles duma ternura comovente, são todos universos de interesse de observação.

Mas nem tudo são rosas, porque a “ruindade” é, muitas vezes, detectada à vista de desarmada, isto é, pela simples observação, ou então cruzarmos-nos com um deficiente e, neste saco, é como se a nossa alma fosse trespassada por um punhal e nos provoca uma enorme dor, sentimento esse atenuado ao olharmos-nos ao espelho ou em redor e darmos graças a Deus, ao Deus de cada um e eu tenho o meu, por termos tido bafejados pela sorte de, pelos menos, não termos uma enfermidade tão grave, embora possamos “esconder” as nossas doenças. Tocam-me bem fundo, no coração e na alma, muitos dos casos dramáticos que observamos ou nos são mostrados pelos “medias” e deixam-nos confusos e ousamos perguntar a Deus, porquê, ainda mais quando as vítimas são crianças!

Há dias, já em plena época natalícia, propícia ao desabrochar de sentimentos de fraternidade, de solidariedade, de família, etc, muitos deles genuínos mas outros autêntica manifestação de “faz de conta” ou mesmo de hipocrisia e frieza, em crescendo nas sociedades modernas dominadas pelo “ter” (consumismo e materialismos) e não pelo “ser”, não pude ficar indiferente ao que ia ouvindo, ao mesmo tempo que me aproximava duma jovem senhora que, ao telemóvel, falava alto para alguém que estava do outro lado.

Já mais próximo, foi-me possível ouvir algumas das palavras que ela proferia e também verificar que ela tinha no seu colo, dentro do “canguru”, uma criança de poucos meses que, dormia como um anjo, indiferente ao que a mãe dizia. Deu para ouvir que ela protestava contra o pai do seu filho, dizendo ; “esqueceste-te que tens um filho e há dias que não apareces para o ver, nem neste fim de semana te dignaste fazê-lo”. Conjuntamente com a cena que observei, as palavras ainda me comoveram mais e não pude ficar indiferente, mas também nada podia fazer, senão reprimir o impulso de confortar aquela mãe e abraçar, no meu colo aquela criança, porque não há nada mais gratificante do que sentir o corpo frágil duma criança bem colocada ao nosso peito, de modo a que “penetre” a nossa alma. Assim tenho a felicidade de o fazer com os meus netos, tal como o fiz com os meus filhos. Fiquei a pensar se aquela não seria uma mãe solteira ou uma daquelas mães em auto-gestação, mas essas não protestam pela falta do pai, porque, muitas vezes, ele serviu apenas para fecundar, às vezes anonimamente, o desejo materno, talvez num gesto egoísta.

A matutar ainda naquela situação, e nem por coincidência, cruzei-me, com uma vizinha, mãe e o seu filho André, um menino com pouco mais dum ano, fruto do amor de duas mulheres, cuja mãe, que conheço há anos, decidiu casar-se, oficialmente, com a companheira e engravidar, como qualquer mulher que sente o desejo da maternidade. Pelo que vou observando, e por vezes em diálogos próprios dos encontros à porta ou no elevador, parece-me ser uma mãe extremosa para com o seu filho. Mas mais do que a curiosidade de saber como foi o André gerado e de viver com duas “mães”, embora a “mãe-pai” seja bastante mais ausente, talvez por questões profissionais, dou comigo a pensar como será o crescimento do André e do seu futuro, quando souber que não tem pai nem nunca o teve, não porque ele o tenha abandonado ou ter sido vítima duma fatalidade, mas porque é fruto do amor de duas mulheres, embora uma delas o tenha trazido no seu ventre a ela seja tão devotada ao ponto de sacrificar a sua profissão, cuidando dele.

A gestação, a adopção e a criação duma criança por um “casal” do mesmo sexo, é um tema fracturante da sociedade portuguesa, mas vale a pena pensarmos no que é (será) melhor para as crianças institucionalizadas, isto é, crianças internadas nas instituições, muitas delas desde o nascimento até atingirem a maioridade e que ali foram parar por razões já de si “desumanas”. Fazerem um percurso de vida triste, sem afectos e amor e, muitas vezes, vítimas de violência dos cuidadores , ou serem criadas com amor por duas “mães” ou por dois “pais”? E o que dizer do “horror” da pedofilia e da violação de muitas crianças, mas cuja sociedade, todos nós, vai assobiando para o lado, sem que se “ataque” este drama que nos deveria envergonhar a todos, mas que estamos mais preocupados com a “proteção” dos direitos dos violadores, muitos deles da própria família, do que com as vítimas indefesas?

Estes dois exemplos, aqui relatados, são, talvez, o espelho de que a família tradicional está em profunda crise e, paradoxalmente, numa época em que o presépio, como símbolo dessa “tríade” (pai, mãe e filho) está na moda, grandes, pequenos, simples ou sumptuosos, mas fazendo parte desta festa natalícia convertida mais numa manifestação de consumismo, apesar dalguns gestos puros e genuínos. Paradoxos, mas é inquestionável que um pai, tal como a mãe, faz falta na educação e formação humana de qualquer criança e jovem, pelo que o presépio deveria ser visto e interiorizado na plenitude da sua simbologia e mensagem, sejamos ou não cristãos.

A sociedade ainda não se questionou de que a educação e a formação, desde o infantário, escola primária e o ensino secundário é, maioritariamente, feita no feminino. Quais as consequências, nos “fomandos” sem pai (presente ou um avô que seja a referência masculina) que “compense” esta realidade? Estudos e factos têm revelado pesadas heranças e vítimas, piores do que nos casos de orfandade, porque, nestas situações, a falta do pai não é imputável a outrem, mas a um “Deus” ou algo semelhante.

Já Brilham as Luzes de Natal

|Serafim Marques|
Sem ofensas, os engenheiros, no nosso país, são as pessoas mais dotadas técnico-profissionalmente, assim se julgam alguns deles. Dizem saber de tudo, às vezes menos de engenharia! Tivemos um Primeiro Ministro (PM) que até, por mais do que uma vez, se decidiu “dar lições de economia”, para justificar a tomada de medidas que poderiam ser contestadas pelos seus efeitos na Economia do país ou na sua oportunidade.

Quem não se lembra dele ter dito, numa Conferência em Paris que: "Para pequenos países como Portugal e Espanha, pagar a dívida é uma ideia de criança. As dívidas dos Estados são por definição eternas. As dívidas gerem-se. Foi assim que eu estudei" (sic).

Noutra altura, para justificar o lançamento do Parque Escolar (PE), argumentou que, face à crise que se iniciava, era necessário injectar dinheiro na economia do país para combater essa recessão. Igualmente para defender, quase a raiar a vitimização e quando a corda da bancarrota já estava para ser atada ao pescoço do país, perdão, ao nosso, a prossecução do TGV (Porto e Madrid), nova Ponte sobre o Tejo, novo Aeroporto de Lisboa, etc, usou os mesmos argumentos da “economia do senhor engenheiro”. Mas esqueceu-se de citar algumas das variáveis básicas que se aprendem nas aulas de Economia ou Gestão, por exemplo Rendimento (Rd); Consumo (Público e Privado); Investimento (I) e Financiamento (F), Receitas; Despesas; Procura (Interna e Externa - exportações), Défice, etc, porque a Economia é uma ciência viva e interactiva, isto é, as variáveis, através dos agentes económicos a que se destinam, influenciam-se e interagem.

Esqueceu-se de dizer, na altura da sua acalorada defesa de tais investimentos (ou elefantes brancos?), quem, como e quando esses investimentos públicos seriam pagos e o efeito que teriam na nossa elevada Divida Pública, Juros, défice crónico, hipotecando o futuro dos nossos filhos e netos, etc. Soubemos, depois, que ele não se esqueceu, porque na atrás citada palestra apara jovens ele disse que “as dívidas públicas não são para pagar mas para serem geridas, qualquer estudante sabe isso, acrescentou”(sic). Aliás, esta “aula” foi agora, aquando da sua prisão preventiva, exibida várias vezes na televisão!

Imagine-se que tais projectos megalómanos teriam avançado mais do que já estavam, sim porque já havia estudos que tiveram que ser pagos, a austeridade que nos foi imposta pela “Troika” seria ainda mais severa para nós, não tenhamos dúvidas. E depois dizem, os “herdeiros” do ex-PM, que a austeridade é um castigo dos Deuses ou do governo que lhe sucedeu, depois da ameaça de bancarrota a que o país esteve em risco de cair, com terríveis efeitos na nossa economia e na nossa sociedade.

De facto “qualquer estudante de economia sabe” que à Despesa (mais o I) corresponde sempre uma Receita, pelo que um euro que um cidadão ou uma empresa gaste, vai para o “bolso” de alguém como Receita e que , parte dele , pode ser seu Rendimento líquido e com ele poderá fazer despesas. É assim que funciona o “circuíto económico”, pelo que parando ou sendo mais lento, surge a recessão económica, desemprego, etc, como qualquer cidadão sabe. Por isso, tinha “razão” o nosso PM de então ao argumentar que o Estado tinha que fazer despesa e investimento como aquelas obras, para combater a recessão que se anunciava, tal como já tinha feito ao lançar o programa de renovação do PE, este sim mais gerador de valor interno dos que os outros, onde a componente externa foi mais elevada. Mas infelizmente, o programa deixou maus exemplos e foi, como algum disse, um “forrobodó” e desnorte nos gastos dos dinheiros públicos.

Aliás, a sua então então Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, chamada, mais tarde, ao parlamento para justificar os problemas da empresa PE, criada para gerir o programa, “calou” os deputados, dizendo que o "o programa foi um êxito e de festa para as escolas, para os alunos, para os arquitectos, para os construtores e para a economia portuguesa", (sic) . O povo ficou espantado com a palavra “festa”, porque sabe que enquanto o dinheiro durou, e as derrapagens orçamentais não fugiram à regra, fizeram-se escolas com muitos luxos ou desperdícios, mas para outras, essas mais carenciadas, o dinheiro não chegou, porque o programa foi suspenso.

Vem tudo isto a propósito por causa das luzes de Natal que enchem algumas das ruas e praças das nossas cidades, vilas ou simples freguesias, como é aquela em que vivo, em Lisboa, e que, diga-se, está linda a zona central da freguesia. É uma obra de Junta que, de acordo com as “lições do engenheiro”, está a fazer despesa que, obviamente, será receita de outros e embora com alguns recursos humanos da edilidade (face ao novo sistema de delegação de tarefas feitas pelas câmaras nas juntas de freguesia), mas com materiais produzidos algures, talvez parte o seja na China.

Não se discute se a opção dos muitos promotores e financiadores da luzes de Natal por esta despesa é a melhor, mas é certo que a factura terá que ser paga e, espera-se que algumas das autarquias “falidas” não tenham caído nesta idílica tentação, embora os efeitos psicológicos, junto dos consumidores, seja também uma variável económica muito importante para combater a crise de consumo e, deste modo, agradar aos agentes económicos. Haja festa e porque é Natal, mas temo que, voltando a uma certa euforia consumista, alimentada em muito por bens importados, se esteja a querer antecipar o fim da crise, palavras ditas e reeditas por muitos agentes se for do seu agrado dizer isso, “vislumbrando-se já a luz ao fundo do tunel”? Mas, depois da “desmontagem do circo natalício”, assente cada vez mais no “consumismo”, como se não houvesse, pelos visto já não há para muita gente, outros valores em que o período natalício deveria assentar. Depois se verá quem paga, mas, normalmente, é o cidadão contribuinte que paga, porque “não há almoços grátis”.

Serafim Marques 
Economista

Eu, Quem Sou?

| Serafim Marques |
Eu, pronome pessoal, da primeira pessoa do singular mas que representa, contudo, tantos “eus” que é, por isso, imensamente plural: O “eu” que é (só) nosso e que não partilhamos com outros, mesmo com os mais íntimos, porque muito da vida que eu ainda quero viver existe, essencialmente, nos meus sonhos e a minha meta é ser feliz e não perfeito;

O “eu” que julgamos ser, de acordo com os nossos valores e referências. Mas sou o que eu vejo, porque somos o que sabemos e o que estamos dispostos a aprender; sei que eu não sou a melhor pessoa do mundo, mas pelo menos não finjo ser quem não sou;

O “eu” que aparentamos ser, tentando esconder o nosso “eu” intimista; O “eu” que queremos ser, visando objectivos individualistas; Sigo procurando quem eu sou e sei que sou o que quero ser, porque sou ser humano e que o meu “eu” me permite ser; O “eu” que deveríamos ser, para que o nosso contributo pessoal beneficiasse outros “eus”; O “eu” que os outros querem que sejamos, como que limitando a liberdade do nosso “eu” mais egoísta; O que os outros pensam sobre mim não vai mudar quem eu sou, porque ninguém tem o direito de me julgar a não ser eu mesmo;

O “eu” pelo qual nos tomam, a partir de certos preconceitos ou de ideias-feitas e que podem mudar o meu conceito sobre o “eu” dos outros que me julgam; O “eu” que nós não conhecemos, porque não sabemos ou não queremos olharmos-nos ao espelho, preferindo cultivar um certo narcisismo; afinal, seria tanto o que poderíamos aprender com os outros, se tivessemos a mente aberta.

O “eu” que os outros conhecem e nós não, porque egocêntricos, tentamos escondermos-nos numa carapaça que, apesar de tudo, é visível pelos outros; Contudo, sou o que eu vejo e sinto e não tento ser o que os outros querem que eu seja; simplesmente sou o que eu sou;

Sou também o meu “eu” da criança que existe dentro de mim, apesar das muitas voltas da vida dum tempo que já passou e se aproxima do fim; Sou o “eu” do presente, o “eu” do depois e de tudo o que já fui antes, mas, o que de facto importa é o “eu” que, verdadeiramente, sou, porque eu sou para cada pessoa aquilo que ela acha que eu sou;

Mas este meu “eu”, que para mim é mais importante, é o “eu” que eu procuro ser e isso eu ainda não sei, nem sei se algum dia saberei quem sou. Sei que o que somos hoje e o que seremos amanhã depende das nossas atitudes; Se procedo mal, sofro as consequências e se procedo bem, o meu “eu” mesmo se purifica, enriquecendo-se. Este “eu” que nos confunde e, por vezes, nos deixa perdidos neste mundo de tantos “eus”; Este “eu” que também é dos outros, principalmente daqueles com os quais nos relacionamos e interagimos; Este “eu” que incomoda os outros, gerando, por vezes, ciúme, inveja, ódios, raiva e violência; Este “eu” inquieto e lutador, neste mundo tão desigual e tão violento, com um “eu” confuso do inconfundível e do medo do impossível.

Mas sou o “eu” de mim mesmo, o dono das minhas ideias; Este “eu” sofrido, mas corajoso e resistente à dor, buscando no exemplo do sofrimento dos outros a coragem e a resistência, quando as forças parecem já faltar; Este “eu” que ama os outros e, sem narcisismo, se ama também a si próprio; um “eu” que se revê na ternura das crianças e na paz dos idosos e da natureza, nas suas diversas formas, mas um “eu” que se revolta pela onda destruidora em que vivemos.

Por muito tempo fui tudo o que pude e agora procuro ser tudo o que quero, porque “o valor do ser humano não é medido segundo aquilo que se tem, mas sim segundo aquilo que se é”; Sei que não quero morrer, mas sim viver, porque sou ainda destino incerto, sou estrada, sou andarilho, mas eu não quero esperar até o final para ser feliz no outro mundo, porque eu quero é ser feliz aqui e agora; Contudo, queria ter um “eu” que me levasse para bem longe desta incerteza, destas guerras e desigualdades, dos egoísmo exacerbados, deste mundo tão agressivo e violento.

 Mas isso, seria no país da utopia, que só existe no nosso imaginário e quando a inquietude nos assalta. Assim “eu”, palavra de duas letrinhas apenas, mas de tão profunda complexidade do nosso ser, quer como indivíduo quer como membro da comunidade em que vivemos; Por isso, são tantos os “eus” que tenho dentro de mim que fico sem saber quem, verdadeiramente, sou! Nem eu mesmo sei como lidar comigo.Sei, apenas que sou eu.

O pensamento é o diálogo da alma consigo mesma e, por isso, dei comigo a pensar em “Eu, quem sou e o que fiz e faço neste mundo?”

O Fim do Capitalismo Popular

Serafim Marques
Aquando das privatizações das empresas nacionalizadas em 1975, os governos de então incentivaram os pequenos aforradores e os próprios empregados, a adquirirem acções dessas empresas, nas quais se incluíam alguns bancos, vários já desaparecidos por fusão ou aquisições de outros.

Criaram, para esse objectivo, condições preferenciais, incluindo benefícios fiscais, para os pequenos accionistas e trabalhadores. A partir daí, muita gente, com pequenas poupanças, passaram a ser “donos” (accionistas) de grandes empresas e bancos e se alguns, mais conservadores, se limitavam a receber os dividendos que entretanto iam sendo distribuídos, embora não insensíveis às variações do valor de cotação dessas acções, outros adquiriram o “vício” do jogo da bolsa e deixaram-se contagiar por ganhos de mais-valias na compra e venda naquele que deveria ser um mercado perfeito, a Bolsa de Valores Mobiliários, mas não o é, porque ali se “joga” muito do actual poder do “dinheiro fácil e transnacional”.

O sobe e desce do valor dos títulos cotados, na maioria das situações, não reflecte o valor patrimonial da respectiva empresa mas resulta de vários tipos de “jogos e manipulações”, por vezes pouco claras que até aos mais “experts” na matérias escapam.

É claro que sendo as acções uma parte de capital duma empresa, os reveses nos seus negócios reflectem-se no seu valor de cotação ou mesmo na falência, com a consequente perda dos valores investidos pelos accionistas, de outros credores, dos empregados, do Estado, etc. Se nalguns casos houve erros de gestão ou mesmo gestão danosa e crimes económicos, onde a ganância dos homens e a falta de ética se sobrepuseram a todos os outros valores, nalguns casos são as naturais consequências dos dos riscos inerentes aos negócios e das crises, por vezes cíclicas e de que o capitalismo precisa para “viver”, que levam à falência.

A diversificação em áreas de negócios, com participações de capital que mais parecem uma teia (ou polvo, este no mau sentido), e a globalização, incluindo-se o incontrolável poder do “mundo financeiro”, torna os negócios cada vez mais incertos e, por isso, de maiores riscos.

Se assim não fosse, por que razão as diversas entidades envolvidas na regulação e fiscalização, não detectaram os enormes buracos que têm ocorrido, no estrangeiro e em Portugal, estes de terríveis consequências para todos nós, para uns de forma directa e para outros de forma indirecta, porque as crises ocorridas nos bancos portugueses e empresas com interdependência aos mesmo, afectaram-nos a todos, incluindo a imagem do nosso país junto dos mercados financeiros estrangeiros, aqueles que nos emprestam dinheiro, mas que, face a essa imagem de crise, acabam por cobrar um juro tão alto quanto possível, para “compensar” os riscos que correm com esses financiamentos.

Até a odiada “Troika”, maioritariamente constituída por jovens tecno-burocratas e sem experiência, não foi capaz de detectar a real situação patrimonial em que se encontrava o BES (Banco) e o GES (Grupo Espírito Santo), ligados umbilicalmente e “alimentados” com balões de oxigénio que, mais cedo ou mais tarde, rebentariam.

E são tantas as entidades que têm por missão verificar todo o sistema financeiro (BdP, CMVM, Accionistas de referência - alguns eles próprios bancos, os Auditores, a AT-Autoridade Tributária, etc). É que um banco, embora seja uma empresa com fins lucrativos, e apesar da “inveja” de muita gente, que nem sequer pensa que o mundo não funcionaria sem bancos e sem dinheiro, é mau sinal quando não tem lucros, é muito diferente das outras empresas, porque, além da prestação de diversos serviços bancários, são os bancos que “produzem e vendem dinheiro”, ainda por cima que não é deles, pelo que é um negócio assente na confiança dos seus credores (depositantes, prestamistas, etc).

Lembremos-nos que são os bancos as entidades que criam dinheiro, este um “papel físico ou escritural/virtual” representativo duma parte: i)da riqueza presente, fruto dum rendimento ou de ganhos obtidos no passado, por exemplo as poupanças, a venda dum património, etc; ii) da riqueza futura, porque a obtenção dum empréstimo permite ao devedor usufruir de algo que terá que pagar no futuro e, como tal, gerar a respectiva riqueza para liquidar a dívida que contraiu junto do seu banco e este, se os capitais forem insuficientes, refinanciar-se-à junto do banco emissor das notas, neste caso o BCE que, sabe-se agora, se preparava para “asfixiar” o BES se o BdP não tivesse criado o Novo Banco naquele fim de semana apenas com a “carne limpa” do banco mau, para aquele transitando o “lixo tóxico” e os accionistas e outros devedores e credores.

Muita gente contesta a opção tomada pelo BdP para evitar a falência do BES, que a ocorrer teria terríveis consequências e provocaria no sistema financeiro português a propalada crise sistémica ou efeito dominó, mas também na economia em geral, porque isso é tipicamente português, principalmente por parte daqueles que não têm que tomar decisões (oposição, etc) : “Preso por ter cão e preso por não o ter”.

Contudo, esta parece ter sido a melhor opção, face às outras duas que existiam (bancarrota ou nacionalização), apenas com a ressalva dos pequenos accionistas (% máxima a definir) não terem sido protegidos, mesmo que parcialmente. Assim, este modelo de “salvação” de bancos em dificuldade, criado pela UE e aplicada pela primeira vez em Portugal, acaba por dar uma machada no capitalismo popular.

Eu, como pequeníssimo accionista e consequente perdedor na falência do BES, não é só essa perda que me dói, apesar da falta que esse valor me faz e embora as perdas potencias já venham desde a crise de 2008, mas sim e muito mais porque tudo aconteceu aos olhos da comunidade, dos poderes políticos, dos reguladores, dos auditores e dos concorrentes (bancos que perderiam muito com o colapso de um deles), sem que cada um cumprisse a sua missão, “alheando-se” por incompetência, por laxismo/inércia, por compadrio, por interesses político-partidários e pessoais, etc. Voltarei a este assunto, porque o “inexplicável” continua a atormentar-me a alma.

E depois desta hecatombe, que justiça teremos para julgar este caso, porque o BES é o mais grave escândalo financeiro da nossa história, e abalou a nossa economia, a credibilidade do nosso país e as pessoas que ficaram desconfiadas dos bancos? Faça-se justiça isenta e objectiva, doa a quem doer, porque sem bancos, fortes e credíveis e sem dinheiro as sociedades modernas não funcionariam.

'Avós Precisam-se'

Serafim Marques  
Há pessoas que não saborearam a “riqueza” da paternidade ou maternidade, porque não puderam, não souberam ou nem sequer o foram.Depois, na fase da “avosidade”, há muita gente que, mesmo tendo sido pais/mães, não vão ser avós, nalguns casos porque a maternidade/paternidade perdeu os “valores” de outrora e os adultos em idade fértil tem outras motivações, infelizmente, mais materialistas. 

Se os seus pais tivessem agido com o mesmo individualismo ou egoísmo, essas pessoas não estariam aqui para poderiam usufruir tudo aquilo que as alternativas de vida, essencialmente do lazer e do hedonismo, lhes proporcionam.

Obviamente que o reflexo está na baixa natalidade no nosso país, mas a crise da natalidade não é de agora, embora no presente seja mais grave, para mim, com maiores preocupação sócio-afectivo do que do ponto de vista económico/capitalista, porque a figura de “filho único” já começou há décadas, principalmente fora do meio rural, onde as famílias numerosas eram uma realidade no “bayboom” dos anos 60, por várias razões, incluindo culturais e as religiosas. O controlo da natalidade e o aborto era “condenável, mesmo do ponto de vista jurídico e, no caso em que era praticado, clandestinamente e também por isso, de riscos elevados para a mulher.

Para aqueles que “conseguiram” ser avós, podem, por isso, viver uma nova etapa natural da vida humana, isto é, presenciar a continuação do seu sangue e da sua árvore genealógica. Têm, assim, a oportunidade de poderem corrigir e ou melhorar muitas das coisas que fizeram nos seus papeis de pais e mães. Por razões várias, não é fácil, às vezes porque o relacionamento entre entre os pais e os avós não é o melhor e o mais desejável, por culpa das partes, mas esse período único na vida dum adulto sénior, não deve ser desperdiçado, porque todos ganham com essa partilha e essas vivências intergeracionais.

Para aqueles que foram PAIS, mesmo que humana e naturalmente com muitas fraquezas, erros e omissões, é extremamente fácil serem AVÓS, até porque têm uma rica “escola da vida”, assente nos saberes, na experiência, na maturidade e paciência, mas, acima de tudo, no AMOR paternal e maternal, muito diferente da paixão (coisa diferente de amor) entre adultos a que, muitas vezes, chamamos amor.

Imodestamente, considero-me neste grupo de pessoas, porque vivo a “AVOSIDADE”, desde há menos de três anos e reforçada com a chegada ao mundo de novos “reforços” para a equipa dos netos. Confesso que é indescritível aquilo que sinto e partilho/troco com aqueles seres tão belos, tão pequeninos, tão frágeis e tão genuínos e aquilo que recebo deles é , numa palavra que tenho dificuldades em encontrar para definir o que sinto. Essa abrangência pode sintetizar-se na palavra: AMOR. Até quando, não sei porque já não tenho a idade em que fui pai e do calendário da vida (finito) é retirada em cada dia uma folha. Que o seja por muitos anos, para continuar a “viver” com o crescimento humano e também físico, dos meus netos, para meu “BEM” e para bem deles. Bem haja por ter sido pai e agora por ser avô. Ousaria, modéstia à parte, escrever com maiúsculas PAI e AVÔ, por aquilo que significa recorrer a esta grafia, como o fiz atrás.

“Avós precisam-se”, mas para que tal aconteça, também “precisam-se de netos”, porque não há avós sem netos, embora e infelizmente, haja (muitos) “avós” sem netos tal como há muitos “pais” (aqui “avós” e “pais” em sentido potencial e não real) sem filhos, mas nunca filhos sem pais, biologicamente falando, entenda-se, porque existe, mesmo em países desenvolvidos, muita “orfandade afectiva”. O “problema” da baixa natalidade do nosso país tem sido explicada por inverdades e os responsáveis estão mais preocupados com o efeito na economia e nas finanças e na sustentabilidade do sistema da segurança social, mas, no meu entender, os efeitos mais graves dizem respeito às roturas que tal provoca e continuará a provocar nas famílias e nas estruturas da nossa sociedade.

“País de velhos” é o que nos espera, se a tendência não for invertida, triste futuro em que vale a pena reflectir, nesta celebração do “Dia dos Avós”, tal como se celebram muitos outros “Dias .....”, como se os avós tivessem apenas um dia, principalmente os “avós cuidadores” dos netos, porque para esses (quase) todos os dias são “dias dos avós”. Outros são apenas “avós de fim de semana” e esses são avós mais do ponto de vista do “direito”, que não se questiona, mas não e como se deseja, “AVÓS de corpo e alma plena”.

P.S. - A este propósito e sem quaisquer intuitos publicitários, recomendo a leitura do livro : “Avós Precisam-se – A importância dos laços entre avós e netos” da autoria de Gabriela Oliveira.

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