Uma mente linear em tempos exponenciais

[vc_row][vc_column width="1/4"][bs-push-notification style="t2-s1" title="Subscribe for updates" show_title="0" icon="" heading_color="" heading_style="default" title_link="" bs-show-desktop="1" bs-show-tablet="1" bs-show-phone="1" bs-text-color-scheme="" css=".vc_custom_1590655396226{margin-bottom: 50px !important;}" custom-css-class="" custom-id=""][better-ads type="banner" banner="3816" campaign="none" count="2" columns="1" orderby="rand" order="ASC" align="center" show-caption="1" lazy-load=""][/vc_column][vc_column width="3/4"][vc_column_text css=".vc_custom_1590655381349{margin-left: 20px !important;}"]Um dos fenómenos mais vívidos da atual pandemia é a sua crescente negação. Enquanto que a maioria dos cidadãos fica (ou ficou) em casa obedecendo às medidas de segurança impostas pelos seus governos, em alguns países, as vozes de oposição às restrições tornaram-se cada vez mais audíveis, incluindo as de alguns líderes políticos, de empresários e até de alguns cientistas. Parecem achar a pandemia bem menos perigosa do que como é retratada pelos meios de comunicação e minimizam o impacto das infeções por COVID-19 na sociedade. Da mesma forma, alguns grupos de pessoas organizam-se e pedem um relaxamento das medidas de segurança e até negando a existência da pandemia. As redes sociais a nível mundial estão inundadas de teorias e opiniões mais ou menos ridículas que argumentam que a COVID-19 não é tão perigosa assim, sendo por vezes comparada a uma simples gripe, que até causa mais mortes, dizem. Será que estas opiniões estão sequer perto de serem verdadeiras. A versão curta da resposta é: não.

A versão longa da resposta e a provável explicação para a propagação tão rápida destas opiniões está no nosso cérebro e na forma como foi biologicamente moldado ao longo da evolução da nossa espécie. O erro que leva as pessoas a subestimar o crescimento epidemiológico ao olhar para os números iniciais baixos é o mesmo que nos leva a acreditar que, se ultrapassarmos o limite de velocidade em apenas 10 Km/h, o nosso carro vai parar apenas mais alguns metros à frente do que se viajássemos dentro do limite. Não vai.

Tal como muitos outros vieses intrinsecamente presentes no nosso cérebro, este não é um erro, mas sim uma característica. A sua existência remonta ao passado evolutivo da nossa espécie e resulta de problemas que o nosso cérebro aprendeu a resolver enquanto habitávamos a savana africana. Grande parte das mudanças que o nosso cérebro aprendeu a prever são lineares no tempo. Um animal em movimento segue uma trajetória e velocidade previsíveis. Não vai desaparecer de repente (a não ser que caia a um buraco) nem acelerar geometricamente. Uma lança arremessada seguirá uma trajetória curvilínea que conseguimos prever, e irá desacelerar ou desviar-se de forma linear. A nossa capacidade para interpretar números está associada às estruturas cerebrais responsáveis pela interpretação destes eventos. As mudanças lineares são muito mais intuitivas e frequentes no mundo natural com o qual aprendemos a interagir.

Ainda assim, eventos como uma pandemia não evoluem de forma linear. A expressão “curva exponencial” foi pesquisada no Google mais frequentemente desde que foram reportados os primeiros casos da COVID-19 fora da China. Isto demonstra o quão contraintuitiva é a rápida aceleração num curto espaço de tempo característica do crescimento exponencial. Demonstra ainda o quão essencial é comunicar a natureza destes fenómenos exponenciais à população, demonstrando a todos que um baixo número de casos não significa um baixo risco. Esta comunicação necessita de ter em conta a forma como a mente humana funciona: em vez de serem apresentados números, o crescimento exponencial deve ser visualizado de forma a que seja mais fácil compreender por que razão bastariam apenas algumas semanas para o país inteiro ser infetado caso não tivessem sido tomadas medidas preventivas. A próxima onda de COVID-19 é, provavelmente, uma questão de tempo. É absolutamente crucial preparar os cidadãos e os responsáveis políticos para tal.

Este texto foi escrito por Art Pilacinsky e traduzido para o português por Daniel Ribeiro
Proaction Laboratory
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

Cientistas descobrem proteína que contribui para o surgimento de doenças do coração

[vc_row][vc_column width="1/4"][bs-push-notification style="t2-s1" title="Subscribe for updates" show_title="0" icon="" heading_color="" heading_style="default" title_link="" bs-show-desktop="1" bs-show-tablet="1" bs-show-phone="1" bs-text-color-scheme="" css=".vc_custom_1589878518003{margin-bottom: 50px !important;}" custom-css-class="" custom-id=""][better-ads type="banner" banner="3816" campaign="none" count="2" columns="1" orderby="rand" order="ASC" align="center" show-caption="1" lazy-load=""][/vc_column][vc_column width="3/4"][vc_column_text css=".vc_custom_1589878504678{margin-left: 20px !important;}"]Uma equipa multidisciplinar de investigadores, liderada por Henrique Girão, da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), identificou uma proteína que pode comprometer a comunicação entre as células responsáveis pela propagação do sinal de contração do coração, contribuindo para o surgimento de doenças cardíacas.


Em concreto, neste estudo [icon name="external-link" class="" unprefixed_class=""], que contou com a participação do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), foi descoberto que «a proteína EHD1 é determinante para regular a distribuição e localização de um canal – designado gap junction - que é essencial para a propagação rápida do sinal elétrico (“sinal de contração”) através do músculo cardíaco, e que está na base do batimento sincronizado do coração», salienta Henrique Girão.


Para se perceber melhor a relevância desta investigação, cujos resultados já estão publicados na reputada revista científica Circulation Research, o investigador da FMUC explica que «num coração saudável, para assegurar uma condução competente do “sinal de contração”, estes canais [gap junctions] localizam-se em determinadas zonas da superfície das células do músculo cardíaco, denominadas discos intercalares. Por essa razão, muitas doenças do coração estão associadas a uma distribuição anómala das gap junctions nas células do coração, com a sua saída dos discos intercalares, o que acarreta um impacto negativo na eficiência de propagação da onda elétrica e, consequentemente, na força de contração».


Nestes casos, esclarece, «o batimento do coração é menos vigoroso, fazendo com que em cada contração haja menos sangue a ser ejetado (bombeado). Neste estudo percebemos de que forma, nos corações doentes, ocorre a redistribuição das gap junctions nas células cardíacas. Os nossos resultados evidenciam que a EHD1 participa no processo de remoção das gap junctions dos discos intercalares, conduzindo, em seguida, à sua acumulação em
outras zonas da célula, onde o papel destes canais na propagação rápida do sinal elétrico fica comprometido
».


Os resultados deste estudo, que foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e teve a duração de quatro anos, esclarecem os mecanismos através dos quais esta redistribuição das gap junctions ocorre no coração doente, possibilitando «a identificação de novos alvos terapêuticos que permitam, no futuro, o desenvolvimento de abordagens mais eficazes no combate às doenças cardiovasculares, particularmente estratégias inovadoras que evitem que a proteína EHD1 participe na remoção das gap junctions dos discos intercalares, garantindo assim um batimento eficiente do coração», conclui Henrique Girão.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

Cientistas estudam como as crianças veem interações sociais

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[bs-push-notification style="t2-s1" title="Subscribe for updates" show_title="0" icon="" heading_color="" heading_style="default" title_link="" bs-show-desktop="1" bs-show-tablet="1" bs-show-phone="1" bs-text-color-scheme="" css=".vc_custom_1587394682859{margin-top: 20px !important;}" custom-css-class="" custom-id=""][/vc_column][vc_column width="3/4"][vc_column_text css=".vc_custom_1587394633882{margin-left: 15px !important;}"]Investigadores da Universidade de Bangor, no País de Gales, revelaram como as crianças e os adultos veem de forma diferente as interações sociais num artigo publicado [icon name="external-link" class="" unprefixed_class=""] numa conceituada revista científica em abril deste ano. Os resultados demonstram como o cérebro processa comportamentos sociais complexos, o que poderá ajudar a compreender a esquizofrenia e os transtornos do espectro autista.

A equipa levou a cabo um estudo com 29 adultos e 31 crianças entre os 6 e os 12 anos, que se focou numa zona do cérebro designada sulco temporal superior (STS), conhecida por desempenhar funções relacionadas com a socialização tais como o reconhecimento de faces ou de movimento corporal. A experiência foi feita com recurso a ressonância magnética funcional, que permitiu visualizar intensidade da resposta de algumas zonas do cérebro quando apresentados estímulos visuais aos participantes.

Os resultados demonstram diferenças significativas na resposta do sulco temporal superior (STS) entre adultos e crianças. Embora existam diferenças em ambos os hemisférios, estas são muito mais significativas no hemisfério esquerdo. “A distinção entre os dois hemisférios leva-nos a crer que o STS ainda se encontra em desenvolvimento nas crianças. A sua capacidade de reconhecer interações sociais não está completamente desenvolvida”, esclarece Jon Walbrin, investigador responsável pelo estudo, agora a trabalhar na Universidade de Coimbra [icon name="external-link" class="" unprefixed_class=""]. A maturação desta área parece ocorrer primeiro no hemisfério direito, pelo que apenas nos adultos a resposta do STS é forte em ambos os hemisférios. “Estudar o desenvolvimento de áreas intimamente relacionadas com a perceção de sinais sociais poderá ser particularmente útil no estudo de doenças relacionadas com a cognição social, tais como a esquizofrenia ou transtornos do espectro autista”, refere o autor do estudo.



Este estudo pretendeu ver quão responsivo é o STS a interações sociais. Para isso os participantes visualizaram imagens de padrões constituídos por pontos enquanto estavam dentro da ressonância magnética. Um dos estímulos consistiu na interação entre duas figuras humanas e no outro as figuras não interagiam entre si. A seletividade do STS para interações sociais foi medida pela diferença de respostas entre o primeiro e o segundo estímulo, ou seja, quanto é que o STS respondia em específico para as interações sociais.

Quando se analisaram os resultados mais a fundo, a equipa percebeu que havia também diferenças significativas entre o grupo de crianças. “Demonstramos ainda que as crianças mais velhas (9-11) apresentam uma seletividade semelhante à dos adultos no hemisfério direito. As crianças mais novas, no entanto, apresentavam uma resposta a interações mais fraca”, refere Jon Walbrin.

Os resultados do hemisfério esquerdo sugerem que a seletividade do STS aumenta com a idade, apoiando ainda mais a hipótese da maturação incompleta em crianças. “O contexto das interações sociais varia muito de cultura para cultura. Faz sentido que esta capacidade de as perceber não seja apenas inata, mas que seja também moldada pelas nossas experiências e pelo contexto onde vivemos”, continua. Sobre os próximos passos, o investigador diz que seria importante “replicar este estudo para todas as faixas etárias e alargar o estudo a outras áreas do cérebro que sabemos que também podem ter um papel importante na perceção de interações sociais“, finaliza.[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

A propósito do coronavírus, o que são os vírus?

No geral podemos definir um vírus como um agente infeccioso de dimensões submicroscópicas (isto é, mil vezes mais pequenos do que um milímetro) constituído por uma “cápsula” de alguns tipos de proteínas que se encaixam umas nas outras, quais pedras numa calçada portuguesa, numa estrutura regular que lhes confere resistência, a qual guarda e protege o genoma viral. O genoma, livro de instruções que definem, de certa forma, a história e o ciclo de vida do vírus, pode ser composto por ADN (exemplo, os adenovírus) ou ARN (exemplos são o HIV – vírus da SIDA, ou o influenza A sub-tipo H1N1 – vírus da gripe e os actualmente preocupantes coronavírus), mas nunca por ambos. Alguns vírus, de que o HIV é um exemplo, possuem uma bainha de lípidos à volta da cápsula proteica.

Como se sugeriu, o material genético que compõe o genoma viral contém todas as informações ou planos para a construção do seu “edifício”, instruções para a sua arquitectura proteica regular. No entanto precisam da “fábrica e maquinaria” bioquímica existente no interior das células vivas, para dar expressão, sentido e função aos seus próprios planos. Isto é assim, porque os vírus são caracterizados por não possuírem um metabolismo independente e por serem incapazes de se replicarem fora de uma determinada célula. Para além disso, vírus diferentes têm capacidade de invadir tipos de células específicos e diversos.

Por exemplo, os vírus que causam hepatite “escolhem” as células do fígado (que se designam hepatócitos e daí advém o nome da doença hepatite – infecção nos hepatócitos), os que causam a SIDA “preferem” um determinado tipo de células brancas do nosso sistema imunitário, enquanto outros como os adenovírus e os coronavírus “alojam-se” nas vias respiratórias dando origem a faringites, pneumonias e outras infecções.

Esta propriedade de os vírus serem capazes de “escolher” um tipo específico de célula é determinada pela existência de algumas proteínas no exterior do vírus que interagem forte e especificamente com moléculas existentes na superfície das células do hospedeiro e que são marcadores “típicos” das células de um determinado tecido. Por exemplo, o vírus influenza A, sub-tipo H1N1, possui no seu mosaico proteico duas proteínas: um tipo de hemaglutinina (H1) e um tipo de neuraminidase (N1). Assim, devido a uma estratégia de reconhecimento molecular forjada e moldada no início da vida no nosso planeta e que evoluiu desde então através de variações do mesmo tema, o vírus “sabe” a que tipo de célula humana deve “atracar-se” para dar início à sua replicação. Isto porque existem na superfície de todas as células, receptores complementares das proteínas que estão na cápsula viral. Uma interacção tipo chave na fechadura complementar, abre a célula à invasão viral.

Assim, uma vez encontrada a célula com a fechadura que a “chave” viral abre, os vírus “injectam” o seu genoma, o seu manual de instruções, no interior celular, ou são primeiramente internalizados integralmente: qual cavalo de Tróia, a célula engole a partícula viral sem ter qualquer desconfiança sobre o que é que lhe vai acontecer.

Uma vez no interior da célula, os genes virais entram em acção, enganando a célula ao dar-lhe novas instruções. Como já se disse, os vírus necessitam da maquinaria bioquímica existente nas nossas células e nas bactérias (sim, também estas padecem com invasões virais). Sem estes processos inerentes e essenciais à vida não é possível “ler” os planos de construção codificados nos genes virais e “traduzi-los” para a forma funcional e estrutural que são as suas proteínas constituintes. Esta tradução é efectuada em unidades de síntese e “montagem” proteica que são os ribossomas. Estes funcionam como “máquinas” de tradução da linguagem genética em proteínas e estão presentes em todas as células. Mas os vírus não possuem ribossomas. Este é um dos aspectos fulcrais para a total dependência dos recursos interiores da célula. Qual atracção “nostálgica” do citoplasma celular, este é destino incontornável no ciclo de replicação viral e fado fatal para a célula hospedeira. Percebemos, assim, porque é que os vírus necessitam das células para se replicarem. Ademais, a célula confere-lhes um ambiente seguro, recheado das matérias-primas e da energia necessária para a sua síntese.

Com o que atrás ficou dito, é mais fácil antever que a infecção de uma célula por um vírus faz com que o metabolismo daquela se desvie muito da sua actividade normal e vital, em direcção à síntese das “peças” necessárias para fabricar novos vírus (nesta etapa designados por viriões). A célula transforma-se assim numa autêntica unidade fabril de produção em série de inúmeras cópias idênticas (clones) do vírus que a infectou. “Obcecada” por esta actividade, a maquinaria celular é impedida de efectuar os processos normais necessários à sua própria manutenção, acabando por entrar em colapso ao fim de algum tempo. Nessa altura, ou porque a célula não é mais capaz de garantir a sua integridade, ou porque o número de viriões por ela sintetizados é muito elevado, ocorre uma ruptura celular e os viriões são libertados para o exterior. Cada um dos novos vírus passa a estar, desta forma, pronto para infectar uma nova célula reiniciando assim o ciclo e o processo infeccioso.

Como os vírus não possuem metabolismo próprio, não é possível utilizar a estratégia intrínseca aos antibióticos que usamos para combater bactérias. Algumas das estratégias da investigação nesta área tentam impedir que os vírus consigam reconhecer a sua célula hospedeira específica e se fixem nela. Outras linhas de investigação dirigem-se para a tentativa de evitar que os vírus dêem ordens de operação à célula para a sua síntese. Outras ainda intrometem-se numa etapa necessária à libertação dos viriões, travando a difusão do programa viral para outras células.

As vacinas actuam de outra forma: instruem o nosso sistema imunitário, “ensinando-o” a reconhecer e a “inactivar” alguns dos vírus que nos visitam. Continua a ser a mais eficaz forma de defesa preventiva que conhecemos. Contudo, alguns vírus sofrem mutações genéticas (alterações no genoma, por exemplo por deriva genética), no decurso da sua replicação, que lhes permite mudar de “aspecto” exterior e escapar à vigilância do nosso sistema imunitário previamente instruído pela vacinação. É como se mudassem de disfarce entre visitas, tornando a sua identificação difícil, e ineficaz a preparação antecipada que a vacinação dá ao nosso próprio sistema de segurança interna contra estes agentes patogénicos.

António Piedade
Conteúdo fornecido por © 2020 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva

Utilizar a retina como “espelho do cérebro” para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer

Um estudo longitudinal sem precedentes, realizado por uma equipa multidisciplinar da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), demonstrou que a retina poderá funcionar como um biomarcador não invasivo relevante para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer.

Caracterizada pela perda gradual e irreversível de determinadas funções cerebrais, como a memória, a atenção e a linguagem, a doença de Alzheimer representa cerca de 60 a 70% dos casos de demência, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). O diagnóstico, que depende da realização de vários exames, não é fácil de fazer, e frequentemente é feito numa fase moderada ou avançada da doença. Assim, há uma necessidade urgente de identificar biomarcadores subclínicos que possam ajudar a diagnosticar precocemente o início da doença e de forma confiável.

Uma vez que a retina é um tecido do sistema nervoso central (tem a mesma origem embrionária que o cérebro) e é considerada uma extensão do cérebro, a equipa, coordenada por Francisco Ambrósio, explorou o conceito da “retina como um espelho ou janela para o cérebro”, isto é, a retina pode “mostrar” o que acontece no cérebro, no contexto de doença de Alzheimer.

Nesse sentido, foi realizado um estudo longitudinal, único e inovador, com um modelo animal triplo transgénico da doença de Alzheimer (3×Tg-AD), um murganho que possui três genes humanos com mutações associadas a esta doença neurodegenerativa, no qual foram avaliadas em simultâneo as alterações da retina e do córtex visual, in vivo, em quatro tempos diferentes: 4, 8, 12 e 16 meses de idade. Foi também usado um grupo de controlo (murganhos saudáveis).

Os investigadores pretendiam encontrar respostas para questões como: partindo do pressuposto de que, na doença de Alzheimer, há alterações na retina, onde é que surgem as primeiras alterações? No cérebro ou na retina? Onde é que as alterações evoluem mais rapidamente? No cérebro ou na retina? Há alguma relação entre as alterações que ocorrem no cérebro e na retina? Quais são as regiões da retina ou do cérebro que são mais afetadas?

Em cada um dos períodos de vida do modelo animal (que tem uma esperança média de vida de dois anos), os investigadores efetuaram uma bateria de testes em que avaliaram a estrutura e a função da retina, assim como a estrutura cerebral.

Os resultados, já publicados na Alzheimers Research & Therapy, uma das principais revistas internacionais na área das Neurociências e da Neurologia Clínica, indicam «a existência de alterações estruturais e funcionais na retina e alterações estruturais no córtex visual do modelo animal 3×Tg-AD. Estas alterações neurais poderão ser usadas como um biomarcador adicional para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer. Além disso, este trabalho reforça a possibilidade de se usar o olho como uma ferramenta adicional (de modo não invasivo) para o diagnóstico precoce e monitorização terapêutica da doença de Alzheimer», afirma o líder do estudo.

De forma mais simples, notou-se que «a retina, até certo ponto, mimetiza o que acontece no cérebro, isto é, no cérebro há uma redução do volume da estrutura do hipocampo (região do cérebro associada à memória) e do córtex visual e na retina também ocorre uma redução da sua espessura. Em todas as fases estudadas [4, 8, 12 e 16 meses], observou-se uma redução da espessura das camadas mais internas da retina, o que se correlaciona com a redução do volume do hipocampo e do córtex visual. Esta correlação sugere que se poderá utilizar a retina como mais uma ferramenta para o diagnóstico precoce da doença de Alzheimer», explicita Francisco Ambrósio.

Posteriormente, a equipa, constituída também pelos especialistas Miguel Castelo-Branco, Rui Bernardes e Isabel Santana, realizou estudos com humanos, tendo confirmado «a existência de algumas alterações na retina e uma associação positiva entre as alterações no cérebro e na retina», refere Francisco Ambrósio. No entanto, adverte,

«para uma validação robusta da possibilidade de se usar a retina como biomarcador, é necessário aumentar o número de doentes».

Mesmo assim, considerando que o diagnóstico precoce é crucial para um tratamento mais eficaz da doença de Alzheimer e que o olho permite realizar testes não invasivos, ao contrário do cérebro, «este trabalho constitui uma abordagem bastante relevante para a prática clínica. Face aos resultados obtidos, seria interessante que os neurologistas ponderassem a prescrição de testes da retina, por exemplo, uma tomografia de coerência ótica (em inglês, OCT), um exame de rotina rápido e simples e que não é muito dispendioso, que permite avaliar a espessura das camadas da retina, contribuindo assim para a validação do método no diagnóstico precoce da doença de Alzheimer», conclui o investigador.

Apesar de este estudo se ter focado na doença de Alzheimer, pode ser alargado a outras patologias, como, por exemplo, doença de Parkinson, esclerose múltipla e esclerose lateral amiotrófica.

O estudo foi realizado no âmbito do projeto “Alterações cerebrais na doença de Alzheimer: a retina como um espelho do início e progressão da doença?”, distinguido com o Prémio Mantero Belard e Prémios Santa Casa Neurociências 2015, e também financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e por fundos europeus (FEDER e COMPETE 2020).

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