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|Hélio Bernardo Lopes| |
É um tema interessante tentar perceber a razão dos três anteriores Presidentes da República de pronto terem apoiado, publicamente, a sua candidatura, no lugar de o fazerem com Marcelo Rebelo de Sousa. Embora – há que dizê-lo – tenham depois Mário Soares e Jorge Sampaio deixado muito de se ver durante a campanha. E também não deixa de ser sintomático que a nossa grande comunicação social, que hoje se percebe estar completamente alinhada com a Direita, ter sempre dado um importante relevo a tudo o que se ligasse a Marcelo, ao invés de o fazer, por igual, com António Sampaio da Nóvoa.
A Direita social do tempo sempre sonhou com a dissolução da Assembleia da República no caso de uma vitória de Marcelo Rebelo de Sousa. Eu mesmo também sempre acreditei nesta hipótese, embora reconhecesse existir uma limitação, que o tempo viria a mostrar ser inultrapassável pelo atual Presidente da República: o quase geral apoio da máquina do PSD a Pedro Passos Coelho. Marcelo Rebelo de Sousa nunca aceitaria uma convivência forte com quem havia referido a frase que se tornou célebre: o PSD – disse Pedro Passos Coelho – não irá apoiar um qualquer catavento político. Uma expressão que o comentador Marcelo de pronto abordou naquele seu programa de entretenimento dominical.
A partir de certo momento, olhados os resultados conseguidos pelo Governo de António Costa, o Presidente percebeu, talvez acreditando nas sondagens – convém recordar a mais recente, da Universidade Católica, que dava um empate entre Rio e Pizarro...– que as autárquicas de há pouco pudessem ser uma nova perda acentuada do PSD, ou seja, de Pedro Passos Coelho. A ser assim, talvez este deixasse, finalmente, a liderança do PSD, assim surgindo a possibilidade de alguém mais da sua confiança, até da sua amizade, poder surgir.
Acontece que os únicos a surgir foram Rui Rui – finalmente! – e André Ventura, que vez depender a sua corrida à liderança do PSD da ausência de alguém que viesse confrontar Rui Rio. À falta de algum notável, lá surgiu – a partir de Cascais...– um tal militante do PSD, de seu nome Miguel Pinto Luz. Ficava assim, embora em pouca medida, posta em causa a predisposição de André Ventura. E digo em pouca medida, porque Miguel Pinto Luz seria sempre um não-candidato. O que era, isso sim, é de Cascais...
É neste contexto que surge o tal almoço do Presidente da República com Pedro Santana Lopes, sendo certo, como escrevi há uma semana, que os dois, mesmo com o Papa Francisco ao lado, nunca conseguiriam levar os portugueses interessados e atentos a acreditar na explicação dada. Bom, surgiu a candidatura de Pedro Santana Lopes, tomada, naturalmente, como apadrinhada pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, e desapareceram as potenciais de André Ventura e de Miguel Pinto Luz – este último caso é espantoso.
Desde então, no relacionamento do Presidente da República com o Governo tudo mudou. Basta que se olhe o caso dos dois grandes fogos, digamos assim: no de Pedrógão Grande, ainda sem terem tido lugar as eleições autárquicas, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa chegou-se ao Governo e deu-lhe o seu conforto político; no caso mais recente, já depois das autárquicas e já com a certeza de que Pedro Santana Lopes, suportado na máquina partidária deixada por Pedro Passos Coelho, irá confrontar Rui Rio com a posição do Presidente agora vista e com as consequências que já se podem observar.
Sem estranheza para mim, nunca até agora o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa colocou a questão, naturalmente reconhecida pelo líder da Junta da Galiza e corroborada pelo Presidente do Governo de Espanha, Mariano Rajoy: quem estará por detrás desta ação criminosa e terrorista, que levou ao surgimento de bem mais que meio milhar de ignições num só dia? E também não nos explicou esta realidade muito evidente: a quem prejudicam estes fogos e a quem servem os mesmos politicamente, embora sem o terem desejado? Não será o Governo, no primeiro caso, e a Direita no segundo? Claro que sim! É à luz destas realidades que tem agora de compreender-se o que acaba de passar-se no seio da sociedade portuguesa. Uma realidade que mostra esta coisa simples, por mim percebida desde há muito: a Direita teve de engolir a democracia, porque, como se sabe, nunca nada fez para a ter.
Se o leitor prestar atenção, verá que são já notórias as mudanças no seio da nossa Direita, mormente na grande comunicação social. Precisammente o que Carlos Santos Pereira em tempos explicou numa sua entrevista. Vale a pena ler essa entrevista, de molde a não continuar a enfiar barretes e a falar sobre balelas.
Num ápice, perante os desenvolvimentos recentes, surgiu a nova grande questão, apresentada de um modo claramente insidioso no seio da grande comunicação social: será possíivel que ninguém soubesse do que Sócrates e os restantes ora acusados, alegadamente, faziam? E ainda: não estará em causa o regime constitucional da III República? Infelizmente, quando se pretende combater com denodo a corrupção que grassa macivamente no seio da sociedade portuguesa desde há muito, de pronto surgem obstáculos. Basta recordar os colocados às iniciativas de Paula Teixeira da Cruz, ou a recente recusa de um controlo bancário anual e global por parte da Autoridade Tributária. Enfim, um dado é hoje claro: regressou de novo a problemática criada entre o Presidente da República – do PSD – e o Governo – do PS –, tal como já se havia visto com a anterior Maioria-Governo-Presidente.
Por fim, uma palavra para Constança Urbano de Sousa. Com toda a certeza, terá feito o seu melhor e com quase certa qualidade. Infelizmente, em política não basta ser-se sério, leal e competente. Não faltam exemplos de quem, ao longo de uma vida, viveu da intriga, da jpgada ou do apoio recebido, por exemplo, por via familiar. E existem casos destes em todos os quadrantes políticos e em todos os países. Mas fez bem em deixar o seu cargo, sendo bom que se deite agora a descansar das mil e uma tropelias que, quase desde o início, lhe foram sendo criadas. Certo, isso sim, é que Constança, manifestamente, não possuía o perfil para desempenhar um cargo político espinhoso como o que agora deixou.