Trump e as alterações climáticas na Bacia do Mediterrâneo

|Luis Pereira|
A eleição de Donald Trump para presidente dos EUA constituiu um autêntico abalo no mundo dito democrático e civilizado. Contudo, passados alguns dias sobre a sua eleição, muitos são já aqueles que pensam que os absurdos saídos da boca do empreiteiro de Nova Iorque não passam disso mesmo: absurdos proferidos dentro de um contexto e de uma estratégia para causar impacto em muitas hordas de descontentes americanos cujo voto permitiu a eleição de um “protofascista”, no dizer de muitos analistas que veem em Trump um perigo eminente para o equilíbrio mundial.

A ação futura de Trump é uma verdadeira incógnita, mas haverá, com toda a certeza, muitas matérias onde o multimilionário americano vai recuar para não colocar em risco a periclitante harmonia da sociedade americana. Há, contudo, uma vertente onde Trump não parece muito disposto em retroceder. Essa vertente é o Ambiente, sendo que o Presidente eleito dos Estados Unidos da América já avisou que não vai cumprir o “Acordo de Paris”, prevendo-se que nas questões ambientais leve até ao fim a sua obsessão e o que dita a sua profunda ignorância.

Numa altura em que o planeta precisa de viabilizar, com muita urgência, um conjunto de regras definidoras das taxas de emissão de CO2, aparece o responsável máximo do segundo país mais poluidor do mundo a dizer que saltará fora desse acordo e que vai continuar a poluir em função das necessidades reais da sua indústria e dos interesses petrolíferos de alguns Estados Americanos. O grande problema é que as consequências desta decisão afetarão o mundo inteiro, e na parte que nos toca o futuro ambiental não se prevê muito risonho.

As consequências das alterações climáticas na Bacia do Mediterrâneo será sentida principalmente na escassez de água doce, com uma esperada redução nos recursos hídricos disponíveis de entre 15 e 20% até 2050, noticiou recentemente a agência EFE.

Se não ocorrer uma redução drástica das emissões de dióxido de carbono durante as próximas duas décadas, as reservas de água doce do Mediterrâneo podem descer até 20% em meados do século. Esse decréscimo resultará de um aumento da temperatura que vai agudizar os períodos de seca no Mediterrâneo e no sul de Espanha e de Portugal.

Segundo Joel Guiot, um paleoclimatologia da Universidade Aix-Marseille (França), “o aumento da temperatura e a falta de chuva já estão a refletir-se em índices de menor produtividade das culturas e no declínio das unidades populacionais de alguns aquíferos”.

Segundo o especialista, que publicou recentemente um estudo na revista “Science”, nestes últimos anos a temperatura subiu 1,3 graus no Mediterrâneo. O estudioso detetou aqui uma subida de quase cinco décimos a mais do que a média mundial, que é de 0,85.

Este aumento de 1,3 graus não é linear em toda a bacia do Mediterrâneo, percebendo-se que umas regiões estão a ser mais afetadas do que outras. Nesse sentido, a pior zona é constituída pelo sul e leste da bacia mediterrânica, nomeadamente Espanha, Portugal, Norte de África e Médio Oriente.

Segundo Joel Guiot, caso uma queda drástica das emissões de CO2 não ocorra nos próximos tempos, e se esta subida de temperatura não for mantida abaixo de 1,5 graus, a metade sul da Espanha vai transformar-se num deserto até ao final deste século XXI. A maneira de evitar este autêntico desastre ambiental seria, de acordo com o cientista francês, travar as emissões globais de CO2 até meados do século. “Em 2050 cada tonelada de gases de efeito estufa deve ser compensada por sumidouros naturais, de forma a que se possa manter o planeta sob controle“, disse Guiot, citado pela agência noticiosa EFE.

Uma outra consequência do imediato é a elevação do nível do mar. Também aqui o cientista francês refere que se não forem desenvolvidos os esforços necessários dos países poluidores para reduzir as emissões, a temperatura global vai mesmo subir acima de 1,5 graus e entre 2030 e 2050 o planeta já terá ultrapassado o limite máximo dos dois graus em relação à era pré-industrial. A partir daqui tudo se desenvolverá em catadupa. Ao ultrapassar-se este limite máximo de dois graus haverá um aumento do nível do mar mediterrâneo em cerca de dez centímetros, facto que terá consequências dramáticas .

É para precaver uma situação como esta que o Acordo Climático de Paris, assinado em 4 de novembro deste ano, marca o “caminho certo” para que o planeta entre num processo de “descarbonização” das suas economias; uma necessidade urgentíssima e que deverá ocupar as preocupações de todos os países na primeira e segunda metades deste século. Contudo, a eleição de Donald Trump poderá colocar em risco este objetivo global e caso os EUA não respeitem o acordo, a nossa casa comum poderá caminhar para um negro processo sem retorno.

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