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| |Hélio Bernardo Lopes| |
Cada dia que nos chega, de imediato se percebe que as aparentes boas novidades que parecem dar-nos mais não são que a antecâmara de quem pretende continuar com a atual máquina de empobrecer sociedades e pessoas. Vejamos três aspetos a nós trazidos nos últimos tempos.
Em primeiro lugar, as novas condições remuneratórias dos magistrados. Como há muito expliquei, elas são completamente deslocadas da realidade da nossa sociedade. Pior ainda: comportam o risco de levar a um aumento generalizado dos vencimentos dos detentores de soberania, facto que, a dar-se, reforça o caráter dicotómico dos portugueses. De primeira – os detentores de soberania –, de segunda – os restantes.
Se se pretende solidarizar a comunidade portuguesa, para mais num tempo de desemprego forte, de pobreza, de miséria e de emigração, então o caminho de aumentar as remunerações dos detentores de soberania é um erro absoluto. O que se consegue é um distanciamento ainda maior entre a generalidade da população e uma minoria de privilegiados. Mesmo tendo em conta as nossas caraterísticas comportamentais, tais medidas nunca deixarão de causar revolta íntima no seio da grande maioria dos portugueses e das suas famílias. Além do mais, essas medidas vão completamente ao arrepio do que se contém na letra e no espírito da Constituição da República. Lamentável.
Em segundo lugar, o facto do Provedor de Justiça, José de Faria Costa, vir considerar que o estudo que serviu de base à decisão do Instituto de Segurança Social, sobre a dispensa de quase setecentos trabalhadores, não se suportar em estudo com fundamento bastante para justificar a colocação destas pessoas na requalificação – despedimento, portanto. O referido estudo é omisso em relação aos critérios utilizados para a tomada da decisão em causa. O mais interessante, porém, é que tais reparos não merecem da parte do Governo um ínfimo de atenção e de consideração quanto ao que referem. Lamentável.
E, em terceiro lugar, o verdadeiro mas estranho texto de Mário Soares na sua crónica de hoje. Se lhe assiste toda a razão quanto ao estado em que se encontram os setores da Saúde, da Educação e da Justiça, – e da Segurança Social, mormente ao redor das pensões do regime contributivo –, a verdade é que, ao fim de todas as contas, acabou por chegar-se ao final da democracia através da sua prática com quatro décadas.
Temos, de facto, uma democracia formal, mas nada representativa. Tal como nos refere no seu texto, Portugal já não é hoje uma verdadeira democracia, antes um espaço onde se pode dizer o que se deseja porque ninguém do poder liga ao que é dito. Simplesmente, vem aí um Governo do PS, certamente com um Presidente da República apoiado por este partido e pela esquerda política, pelo que, a fazer fé nas críticas corretas de Mário Soares, se o poder atual tirou o que se tem visto, esse outro Governo reporá o que constitui um anseio e o legítimo direito dos portugueses. Com sorte, cá estaremos para ver – também para criticar – o que então irá ter lugar e o que nos irá dizer depois Mário Soares. Já falta pouco.
