Três momentos

|Hélio Bernardo Lopes|
No meio da balbúrdia que varre hoje o mundo, objetivamente capitaneada pelos Estados Unidos de Donald Trump, também o nosso Portugal se vê atingido pelos efeitos de tal maré. Escolhi hoje três casos que ilustram bem o estado a que chegou o Portugal da III República, hoje a caminho do fim pleno de quanto trouxe de bom aos portugueses a Revolução de 25 de Abril.

PEDRO SIZA VIEIRA
Sem mais nem menos, eis que nos surgiu o caso do ministro Pedro Siza Vieira. Um caso de que se conhecem os contornos razoavelmente bem e que não dá mostras de se estar na presença de algo malicioso, independentemente de erros que poderiam (e deveriam!) não ter tido lugar.

Como teria de dar-se, no sentido que se compreende, começou o jogo do empurra. O Governo expõe a verdade objetiva: um lapso. A Direita, ainda hoje sem um conteúdo político para uma sua hipotética governação – não pode revelá-lo...–, deita mão de tudo o que possa servir, ao menos aparentemente, de arma de arremesso. De molde que aí nos surgiu a bramar ao redor deste caso do ministro Pedro Siza Vieira. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa sorri e segue em frente, tal como o Primeiro-Ministro. O Presidente do Tribunal Constitucional salienta que este não falhou e que o Ministério Público junto do mesmo terá centenas de casos para analisar. O Ministério Público determina-se a ir esclarecer o que se poderá ter passado e que deve ser algo como centenas de outros casos. É o meu primeiro momento deste texto.

Acontece que este caso do ministro Siza Vieira suscita-me uma dúvida: o que achará José Sócrates deste caso e do modo como os diversos órgãos de soberania o estão a abordar? Mais de quatro décadas depois da Revolução de Abril! E sobre o caso em si: o que pensa o antigo Primeiro-Ministro? Porque a verdade é que se seguiu aqui a metodologia já usada com José Sócrates: aguarda-se que as autoridades judiciárias esclareçam o que está agora em causa.

O SPORTING
Verdadeiramente inenarrável é o caso que vem varrendo a vida do Sporting Clube de Portugal. Depois da passada quinta-feira, está-se agora à espera do penúltimo sábado do mês que se segue ao atual. Mas o mais interessante foi aquele espetáculo da tentativa de saída de Jaime Marta Soares das instalações de Alvalade, sem conseguir responder em condições aos jornalistas presentes e acabando por dar meia volta. O maravilhoso Estado de Direito a que se chegou. O que até se torna interessante, por ter tido lugar no dia em que o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa prestou elogio público ao Tribunal Constitucional.

Claro está que aquela decisão ao redor do tal penúltimo sábado do mês de junho vale hoje o que vale, ou seja, quase nada. Seguir-se-ão impugnações e o seu inverso e a esmo, sessões de esclarecimento em catadupa, declarações e o seu contrário sem parança, etc.. E tudo isto ao mesmo tempo que se assiste ao nojento espetáculo de uns quantos a tentar ficar no retrato para memória futura, com Deus ou com o Diabo... Simplesmente inenarrável! E já agora: não será que Bruno de Carvalho irá ficar?

CLARINHA
Por fim, o último episódio d’O EIXO DO MAL, trocado com a esperada QUADRATURA DO CÍRCULO. Um tempo televisivo que nos permitiu perceber o grande falhanço político da III República, mormente por via das fantásticas e irreais considerações de Clara Ferreira Alves sobre o PS, a sua esquerda e a sua direita.

Desde logo, a grande verdade que Clara Ferreira Alves conhece bem é que as proclamadas posições de esquerda de Manuel Alegre foram sempre inconsequentes e, por isso mesmo, vazias e inúteis. Clara Ferreira Alves fingiu não recordar o posicionamento de Alegre em favor de Mário Soares e em desfavor de Manuel Serra, quando este estava à beira de conseguir liderar o PS.

Depois, fez ainda por esquecer que as intervenções de Manuel Alegre são sempre pontuais, mas cabalmente inconsequentes. Terminada cada singularidade que o leva a falar, operada a correspondente equação de balanço, constata-se que o poeta se limitou a falar, a parar de falar e a em nada ser seguido. Derrotas, umas após outras. A inconsequência política de uma vida passada a lutar por um ideal que foi colocado de lado, precisamente, pelos que dirigiram o partido que é o seu. Sobra-lhe, pois, tal como a Clara Ferreira Alves, o (dito e badalado mas vazio) socialismo democrático.

O que este programa permitiu ver à evidência é que Clara Ferreira Alves só é de esquerda no falar – mesmo assim...–, porque o seu alinhamento é já claramente sintonizado com os grandes objetivos neoliberais defendidos pelos vencedores da Guerra Fria, depois do apoio que lhes foi sempre dado pelos partidos da Internacional Socialista e que os levaram à prática extinção política.

Três momentos deveras interessantes, porque ilustram o estado de cabal degradação política que o neoliberalismo e a globalização criaram ao mundo e na real e substantiva prática das liberdades e da dignidade das pessoas. E já reparou o leitor que Donald Trump deixou de ser tema de crítica? É o socialismo democrático em ação, fazendo lembrar Vasco Santana naquele seu dito: barretes há muitos!...

www.CodeNirvana.in

© Autorizada a utilização de conteúdos para pesquisa histórica Arquivo Velho do Noticias do Nordeste | TemaNN