Jogar com as aparências

|Hélio Bernardo Lopes|
Foi sem espanto que ontem acompanhei o programa da TVI, logo depois do notíciário da hora do jantar, O CARTEL DO FOGO. Ao contrário da simpatia, certamente aparente, dos convidados, achei um programa longe de bem feito e de minimamente significativo. Uma realidade que me levou a exclamar para a minha mulher: tinha de ser... Um documentário que depois se prolongou com um debate, mas que mostrou uma qualidade ainda pior que a de muitos aspetos do documentário.

Neste debate pôde perceber-se que muito do que foi dito sobre contratos no documentário era fortemente inexato, como foi dificilmente explicado pelos convidados, dado que Ana Leal constantemente interrompia as intervenções daqueles. De resto, impõe-se reconhecer a falta forte de organização expositiva de dois dos convidados: o primeiro e o terceiro a intervirem. Se eu fosse aluno de um destes nossos concidadãos, bom, reprovaria, naturalmente, pela dificuldade em encontrar um norte na exposição de um qualquer deles.

Referiu-se ali que ninguém aceitou estar presente, de um certo número de entidades convidadas. Entendo, porém, que fizeram bem, porque se sem eles o que se viu foi uma cabalíssima chicana, sempre ao redor da temática do ataque ao Primeiro-Ministro, imagina-se facilmente o que teria tido lugar se os conviidados ausentes ali estivessem. E quem diz ontem, diz hoje, com sucessivos programas e noticiários a dizerem o que era, o que parecia ser e o que não era. Porém, fizeram mal, porque se tivessem convidado Jaime Marta Soares, do PSD, ele teria naturalmente estado presente, atuando como Miguel Sousa Tavares ontem referiu na sua crónica das segundas-feiras.

Depois, os factos do documentário. Desde logo, aquelas imagens captadas a partir de telemóvel nada realmente mostram. Já as visionei duas ou três vezes e nada consigo das mesmas retirar. Para lá dos Estados Unidos, duvido de que alguma estrutura de investigação criminal, ou algum tribunal, as aceitasse como elemente probatório.

Os artefactos ali mostrados também nada provam, porque pode alguém tê-los colocado ali, obviamente com uma finalidade político-partidária. É essencial perceber a quem poderão estes fogos ter aproveitado e a quem poderão ter desaproveitado. No plano político, claro está. Além do mais, para o documentário e para Ana Leal parece que tudo se ficou pelos meios aéreos, porque só por aqui se poderiam encontrar interesses escondidos!!

Também me ficou a ideia de que os nossos concidadãos já idosos se mostraram longe de ser claros, tornando-se evidente que a procura de uma elemento testemunhal deste tipo requer cuidados essenciais: estarem presentes duas ou mais pessoas, de preferência com posições políticas distintas, e serem as testemunhas inquiridas em separado e sem saberem previamente que iriam ser entrevistadas. Ou seja: estes testemunhos, objetivamente, valem nada para uma investigação credível. Se fosse nos Estados Unidos, com brancos a testemunhar contra pretos, seria logo uma prova certeira. Entre nós, todavia, as coisas não são assim, porque é preciso fazer prova dos factos apontados, sendo que pode aceitar-se nenhum daqueles episódios como uma prova. Nem mesmo indício.

Deste documentário e do debate que o seguiu o que sobreveio foram duas ideias centrais: António Costa e a exigência de que a Procuradoria-Geral da República mande operar uma investigação às tais cinco centenas e pouco de ignições. Uma realidade que, tal como José Pacheco Pereira vem referindo, não é evidente na sua existência e muito menos nas suas causas. A ser assim, conseguia-se atingir a credibilidade do atual Primeiro-Ministro, agora que já se percebeu que a atual forma de Governo não sucumbirá por si.

Hoje mesmo, logo pela manhã, a Renascença noticiou que estão a aumentar as insolvências de famílias, sendo umas das causas o aumento do dinheiro disponível nas mesmas... E também ontem Ângelo Correia salientou o imperativo de não colocar dinheiro nas pessoas, antes o direcionando para as vítimas das catástrofes, sejam elas aas derivadas dos fogos ou as da falta de águra. Aqui está o grande desígnio do PPD/PSD, seja com Passos, Santana ou Rio: destruir o Estado Social. Uma sonho já com barbas na Direita portuguesa.

Quando foi criada a Comissão Técnica Independente, Miguel Sousa Tavares, na sua crónica televisiva semanal, salientou o imperativo de se aceitarem os seus resultados sem pestanejar, tal como terá lugar no Reino Unido. Pois aí tem Miguel a resposta de Assunção Cristas: pensa criar uma nova comissão!!... E isto para já não falar na posição de Jaime Marta Soares e de Almeida Lopes, que defendem que na guerra contra o fogo se deve prescindir de um comando central, naturalmente ramificado, adotando, isso sim, uma coordenação!!!

Por tudo isto, já com sinais evidentes desde há perto de uma semana, determinei-me a pôr um fim na minha análise simples sobre O RELATÓRIO da Cominssão Técnica Independente. Infelizmente, neste caso só valem os relatórios conforme as conveniências políticas de cada partido, ou de cada entidade. Para já não falar na intervenção política do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que defende agora que a lealdade e a colaboração institucional só podem ter validade à luz da materialização dos direitos e dos interesses dos portugueses. E quem mede o valor destas grandezas? O povo, através do voto? Não. Agora, quem as mede é o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Chegámos ao tempo do achismo político, com o Presidente da República a manifestar a sua opinião sobre os restantes detentores de soberania, numa situação onde a seperação de poderes se tornou mera e vazia expressão. Os jornalistas, comentadores, analistas e apaniguados, como de costume, sorriem do histórico enfant térrible. Até Pedro Santana Lopes – e o almoço em Belém? – parece ter esquecido o que se disse, pelo lado do seu Governo, no programa de entretenimentp político de Marcelo Rebelo de Sousa, nos domingos da TVI. Leiam os leitores, pois, o histórico discurso de Salazar, no Porto, pelo final da década de 50 do passado século...

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