De novo a Catalunha...

|Hélio Bernardo Lopes|
Tive já a oportunidade de tratar a questão que se levanta ao redor da Catalunha. Volto hoje a tratar o tema, mas tentando aperfeiçoar a minha análise à luz de alguns ângulos novos de visão, e que são, em minha opinião, os principais.

O Uruguai é hoje um Estado independente da Comunidade Internacional, naturalmente assim recpnhecido por todos. Acontece que o espaço do atual Uruguai era parte integrante do Brasil, tendo tido lugar três guerras até conseguir a sua independência. Portanto, uma independência conseguida após se operar uma guerra de independência contra a potência-mãe.

Do mesmo modo, os Estados Unidos são hoje um Estado independente, sendo que o seu território se formou a partir de partes que eram dominadas pela Inglaterra, França, Espanha e México. Algumas destas partes só se tornaram norte-americanas após guerras, digamos assim, ainda recentes – uma centena e pouco de anos. São hoje os senhores do mundo e querem se-lo ainda mais.

Os países nórdicos, após conflitos prolongados no seio do reino sueco, acabaram por operar tratados de paz, assim surgindo novos Estados, monarquias em certos casos, repúblicas noutros. O mesmo se deu com a Estónia, Letónia e Lituânia, que eram repúblicas da extinta URSS. A tal Comunidade Internacional não viu nisto um ínfimo de mal, como não veria se a Califórnia se desligasse dos Estados Unidos, se Trump fosse o presidente. Outra seria a reação se o presidente fosse Obama.

De igual modo se assistiu ao desmantelamento da antiga Jugoslávia, operada sob a batuta da Alemanha e do Vaticano. Um domínio que merece uma leitura atenta à obra de Carlos Santos Pereira, DA JUGOSLÁVIA À JUGOSLÁVIA. Por fim, os casos do nascimento calmo da República Checa e da Eslováquia a partir da antiga Checoslováquia, ou o referendo no Canadá, destinado a medir o desejo do Qubeque ser independente, ou o da Escócia, com a mesma finalidade.

Neste último caso, a lei do Reino Unido não confere, sem mais, o direito da Escócia deixar o Reino Unido, tal como acontece em Espanha. A verdade é que o Governo britânico, através de decisões da Câmara dos Comuns, da Câmara dos Lordes e da Rainha, aceitou que o referido referendo pudesse ter lugar. Sem essas autorizações, o mesmo não teria existido nem voltará a ter lugar.

Como se tem podido ver, em Espanha não é esta a realidade. E a causa é simpples: a tradição inglesa é incomensuravelmente mais democrática que a espanhola, que é essencialmente dominada por um espírito franquista. De um modo simples, a Espanha de hoje resulta do domínio, pela força, de Castela sobre partes diversas e vastas do restante território ibérico de hoje. E só não continuou a dominar Portugal – está-lhes atravessado na garganta histórica – porque as tropas espanholas tiveram que deixar Aljubarrota para acudir à rebelião catalã. O próprio Franco, já pelo final da Segunda Grande Guerra, esteve preparado para invadir Portugal em três frentes e com outros tantos corpos de tropas – comandados e não coordenados, como tanto apraz a Jaima Marta Soares. Sabe-se hoje que a Inglaterra não teria vindo em nosso auxílio, mesmo que para tal solicitada ao abrigo do sempre badalado tratado entre ela e Portugal.

No presente momento os ex-detentores do poder na Catalunha sofrem os históricos e humanos efeitoos do ve victis: perderam, pelo que passaram de bestiais a bestas.

Admitamos agora que Puigdemont tivesse pedido uma audiência a Filipe VI, a fim de o sensibilizar para o anseio histórico dos catalães, informando-o de que iria conversar com o Presidente do Governo, Mariano Rajoy, sobre o tema. Bom, desde logo, Filipe VI não o receberia. E quando viesse, um dia, a falar com Mariano Rajoy sobre o caso, de pronto este lhe diria: olhe, isso é um não-tema, porque a Constituição de Espanha não prevê tal medida.

Mas admitamos, também, que, após estes evidentes e expectáveis desaires Puigdemont se determinaria a abordar o caso com os órgãos da União Europeia. Bom, na melhor hipótese, seria recebido uma vez e ponto final. E se se determinasse a fazer o mesmo com as Nações Unidas, duvido de que o Secretário-Geral alguma vez o recebesse. No máximo, acabaria por falar com um funcionário qualquer do gabinete deste. Tudo, porém, ficaria na mmesma. O que permite perceber, facilmente, que o diálogo a nada conduziria. Em Espanha, porque se fosse na Suécia ou no Reino Unido, teria o desfecho próprio de gente muitíssimo mais civilizada e realmente democrática.

Por fim, suponhamos que, por uma razão que não importa materializar, a Catalunha conseguia – ao final de um conflito militar, claro está – repelir as trops de Castela e assim atingir a sua independência. Bom, ao fim de algum tempo, a realidade viria a impor-se: acabaria por ser reconhecida pela generalidade dos Estados da tal dita Comunidade Internacional.

Significa isto, pois, que a Catalunha nunca terá facilidade, seja o caminho o que for, em conseguir ser um Estado independente. O Direito Internacional Público tem as caraterísticas que Marcelo Rebelo de Sousa, ao tempo do homicídio de Kadafi, expôs no seu programa de entretenimento político dos domingos: é a lei dos mais fortes, realidade que passou a conhecer, como contou, desde o seu segundo ano do Curso de Licenciatura em Direito.

O que este caso da Catalunha veio mostrar foi a cabalíssima falta de autenticidade democrática da União Europeia e dos seus Estados. E das Nações Unidas, bom, o melhor é limitarmo-nos a recordar os colonatos israelitas no território do Estado da Palestina...

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