Jobs e boys, um tema de sempre e de todos

|Hélio Bernardo Lopes|
O comportamento de cada pessoa no seio da comunidade de que faz parte, pela natureza das coisas, é condicionado pela estrutura funcional da mesma, mas por igual pelas suas caraterísticas pessoais. E estas são, por sua vez, condicionadas por aquela mesma estrutura e pelo designado berço.

Natural é, pois, que cada um siga na vida o seu caminho, em boa medida determinado pelos ambientes antes expressos. A ambição pessoal, como se sabe, é uma caraterística pessoal muito importante para definir o modo como cada um enfrenta o seu futuro. Seja qual for a profissão prosseguida, essa ambição estará presente, tanto no dia-a-dia da vida, como numa perspetiva mais estratégica. Não deve, em todo o caso, ser levada a um tal ponto que venha a cair no atropelo social, visto aqui num sentido muito amplo.

Por outro lado, a sociedade não é nunca garantidamente justa no modo como premeia cada um dos seus. Basta pensar, por exemplo, no caso de Diogo Freitas do Amaral, que nunca atingiu nenhum cargo cimeiro da nossa soberania, apesar de possuir qualidades singulares para assim trabalhar e servir o País. Ou em Adelino Amaro da Costa, ou Francisco Sá Carneiro, assassinados no atentado de Camarate numa fase ainda muito potenciada das suas vidas.

Vem tudo isto a propósito das considerações de anteontem por parte de Rui Moreira, segundo as quais o seu critério de escolha é o mérito e a capacidade para o exercício dos cargos por si distribuídos. Caraterísticas que reconheceu no seu atual adversário, Manuel Pizarro.

A este propósito, de pronto surgiu, nos comentadores televisivos da Direita, a notícia de que o PS pretenderia colocar em lugares elegíveis os seus boys. Não sendo impossível, a verdade é que o lógico é que sejam assim as coisas. Como facilmente cada um perceberá, por entre os ditos independentes também existirão boys a pretenderem ocupar os jobs disponíveis. Se há jobs, existirão, natural e logicamente, boys a pretenderem ocupá-los.

Esta converseta do jobs for the boys foi sempre uma popsição de tipo populista, destinada a desenvolver a inveja junto da comunidade humana do País. A grande verdade é que, de um modo muito geral, não existem critérios objetivos para medir a capacidade para o desempenho de um cargo público. Mostrarei aqui diversos casos que ilustram esta realidade.

Em primeiro lugar, a chegada de Marcelo Caetano à cátedra da Faculdade de Direito de Lisboa. Foi uma situação que, para lá do indiscutível mérito do académico, envolveu uma partilha de dois jobs para dois boys, digamos assim. Sendo Marcelo Caetano apoiado pelo CADC, Jaime de Gouvei era-o pela Maçonaria. E o que foi combinado pelos académicos que teriam de decidir foi que, ou eram os dois aprovados, ou não seria nenhum. Bom, foram os dois.

Em segundo lugar, a classificação de 20 valores dada ao Professor Araújo, no doutoramento que fez na Universidade do Porto, na área da Física. Sendo uma classificação inteiramente merecida, não era usual nas academias portuguesas. Perante uma tal surpresa, pouco mais de um ano depois, uma outra universidade portuguesa, na mesma área, atribuiu a um doutorando do seu seio a mesma classificação. Embora igualmente muito sabedor, a verdade é que, não tivesse sido o caso anterior do Professor Araújo, e ter-se-ia seguido a tradição de não atribuir uma tal classificação.

Em terceiro lugar, o caso do concurso, que acabou por não ter lugar, de Gustavo de Castro e de José Maria Quadros e Costa a uma cátedra de Matemática no Instituto Superior Técnico. Sendo o primeiro oriundo da Faculdade de Ciências de Lisboa e da área da Matemática, o segundo era de Engenharia Eletrotécnica, pelo anterior instituto. Sebastião e Silva era o arguente principal e convidado. Perante o que expôs ao Conselho Escolar do Técnico, o concurso foi anulado. Um caso de cujos pormenores históricos tomei conhecimento direto pelo próprio Sebastião e Silva, muitos anos depois, ainda estudante universitário.

E, em quarto lugar, o caso do concurso para catedrático de Física da Faculdade de Ciências de Lisboa, que envolveu o meu antigo professor e amigo, José Pinto Peixoto, e o seu compadre, José Francisco Vitorino Gomes Ferreira – marido da Professora Lídia Salgueiro. Veio este a ser considerado o vencedor do concurso em mérito relativo, com ambos aprovados em mérito absoluto. A verdade é que o que perdeu em mérito relativo acabou por se tornar Presidente da Academia das Ciências de Lisboa, o que nunca se deu com o vencedor. Mas mesmo este acontecimento também nada realmente representa.

Creio ter ilustrado com o que escrevi antes três realidades. Por um lado, também por entre os apoiantes diretos de Rui Moreira existe uma profusão de boys para os jobs que estão em causa. Por outro lado, não existe modo de garantir que uns são superiores aos outros para o exercício do cargo de vereador. E, por fim, esta é a realidade de qualquer decisão entre candidatos humanos a qualquer cargo, seja político ou de outra natureza.

Convém, pois, que o leitor perceba que esta historieta dos independentes é mera conversa, porque o que realmente nela se contém é o desejo de aproveitar o descontentamento proveniente do massacre criado pelo modelo neoliberal e pela globalização. Dois aspetos que Rui Moreira, por exemplo, nunca contestou. É para aqui que o PS e os partidos deverão olhar, resolvendo os graves problemas criados aos cidadãos. O resto é conversa para entreter...

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