No âmbito das Comemorações dos trinta anos de actividade, a Filandorra – Teatro do Nordeste revisita cinco anos depois da sua estreia um dos espectáculos mais emblemáticos do seu reportório, À Manhã de José Luís Peixoto, com “encontro” marcado com o próprio autor na sua terra natal, Ponte de Sor, no próximo fim-de-semana, no âmbito da cerimónia de entrega do Prémio Literário José Luís Peixoto promovido pela Câmara Municipal.
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"À Manhã". Créditos CM Vila Nova de Foz Côa |
Este novo périplo pelo interior dos interiores… da alma humana, tem início no Concelho de Ponte de Sor, com o apoio integral do Município, que leva este espectáculo às freguesias de Galveias - Auditório da Fundação Maria Clementina Godinho de Campos (terra natal do autor) e Foros de Arrão - Salão do Grupo Desportivo de Foros de Arrão no dia 03 de Dezembro, 15h00 e 21h00 respectivamente, e no dia 04 no Auditório do Centro de Artes e Cultura de Ponte de Sor pelas 17h00.
Nesta viagem pelo interior do Portugal profundo a Filandorra é acompanhada por uma delegação do município de Alfândega da Fé, liderada pela Presidente da Câmara Berta Nunes, concelho onde a Companhia estreou este espectáculo em Novembro de 2011, no desfecho de uma Residência Artística de dois meses neste Concelho do nordeste transmontano e durante a qual contactou directamente com os idosos, as suas rotinas, as suas falas, os seus modos de estar e ver a realidade que os rodeia, que a Filandorra transpôs para o palco e que teve a cobertura da equipa da Grande Reportagem do canal SIC, que deu origem ao trabalho “O Teatro e as Serras” da Jornalista Sofia Arêde.
Escrita em 2005 e publicada em 2007 no livro intitulado Cal, uma colectânea de crónicas, poemas e teatro, À Manhã retracta o quotidiano do mundo rural, abordando problemas como o despovoamento e envelhecimento da população. A acção desenrola-se numa aldeia envelhecida e desertificada do interior do país, cinco personagens, três mulheres e dois homens, dão corpo aos seus próprios desejos e receios, numa "viagem" pelo tempo das estações: as Primaveras e os segredos, os enganos e o Verão, os beijos nunca dados e o Outono onde se retarda o último frio.
Segundo Luciana Éboli, investigadora em teatro e dramaturgia, «as cinco personagens deste texto personificam um encontro possível entre dois autores distintos: Beckett e Tchekhov. As personagens masculinas chamam-se Vladimiro e Estragão, numa alusão ao drama Esperando Godot, e as femininas têm os nomes das principais personagens de As Três Irmãs: Olga, Irina e Masha. Os nomes transformam-se, assim, no sentido paródico proposto pelo autor, em: Ti Estragão Trinta Cabelos, Ti Olga Despedida, Ti Macha do Artilheiro, Ti Irininha e Ti Vladimiro Costelas Bambas.
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"À Manhã":Créditos CM Vila Nova de Foz Côa |
Todos os cinco com mais de setenta anos, vivendo, em tempos particulares, as lembranças do passado(…). As personagens vivem num lugar sem definição no mapa, numa alusão às infinitas possibilidades e desdobramentos espaciais. A aldeia representa muitas outras aldeias e o futuro projectado, representa muitos outros futuros (…). Na construção dramática, o tempo é um dos elementos mais expressivos da narrativa: lento, pesado, ritmado. As vozes, falas e diálogos acompanham essa cadência, inclusive a cadência proposta pelo uso do próprio silêncio. Mas, ao contrário do que uma visão becketiana da existência poderia instigar, o ritmo daquele lugar dá espaço para que seus habitantes tenham tempo(…). Naquela terra, onde não chove e as árvores estão despidas, parece que nada acontece.»
Este espectáculo conta com o espaço cénico e encenação de David Carvalho, assistência de encenação de Bibiana Mota e na leira em terra batida em forma de retângulo (metáfora do Portugal profundo) com os atores Anita Pizarro, Helena Vital, Sofia Duarte, Márcio Pizarro e Silvano Magalhães. No som Pedro Carlos, na luz Gonçalo Fernandes, e assistência geral de António Nascimento.
Depois de Ponte de Sor, À Manhã vai regressar ao concelho de Alfândega da Fé no início de 2017, estando também agendados espectáculos na UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, entidade parceira das Comemorações dos 30 anos de actividade da Filandorra – Teatro do Nordeste nos domínios da formação e animação teatral em toda a região do Interior Norte, com mais de cinco mil espectáculos e a caminho de um milhão de espectadores desde a sua fundação.
“Já diziam os antigos que há duas maneiras de procurar: uma é
andar às voltas à procura daquilo que se perdeu, outra é ficar
num sítio à espera que aquilo que se perdeu nos encontre.” (Ti Irininha)