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| |Hélio Bernardo Lopes| |
Desde logo, a cabalíssima inutilidade das sondagens. Sucedem-se estas em lugares do mundo os mais diversos e em circunstâncias muito variadas, mas os resultados acabam por situar-se a grande distância do resultado final dos jogos em apreço. Passou a ser um indicador de mui reduzida utilidade. Em todo o caso, sempre um dinheirão.
Depois, esta coisa simples de perceber e quase desde sempre: só gente com muita riqueza pode disputar uma eleição. Por acaso, uma situação muito diferente do que teve lugar entre nós e noutro tempo, onde tantos concidadãos atingiram os mais altos cargos públicos, mas sem possuírem real riqueza.
A seguir, o baralhante sistema eleitoral norte-americano, todo ele uma verdadeira confusão, onde nada é, afinal, como parece, e em que já começam a surgir fissuras. Basta que o resultado eleitoral não convenha à nomenklatura que realmente manda no país.
Um pouco depois, a evidência do contrário que sempre se propala pelos nossos políticos: afinal, os juízes federais são escolhidos pelo Presidente, desde que aceites pelo Congresso. A chamada separação de poderes e peras. De resto, um sistema de justiça que, de facto, só concede reais direitos de defesa aos que podem pagar fortunas a advogados de elite. É a razão das mil e uma injustiças descobertas décadas depois de terem sido praticadas em nome da lei.
Mais uns passos, e aí nos foi dado ver, e bem ao vivo, a grande mancha dos interesses mundiais, capitaneada pelos norte-americanos, para quem mudar, mesmo que por via de eleições livres, é algo que não pode ser realizado. Hillary Clinton era, neste mecanismo, o seu representante supremo e ideal.
Por fim, o que a entrevista de Diogo Freitas do Amaral ontem mostrou: Delors, sem estudos mas defensor de uma (qualquer) Europa Unida, era excelente; Trump, também sem estudos, mostra, com esta caraterística, um fator em seu desfavor. Nada, pois, como ser doutor, que era o que se dava com Reagan, com Truman, ou com o último Bush. Vejamos, no entretanto, o que realmente se passa ao redor de Donald Trump.
Em primeiro lugar, é essencial ter em conta o modo distorcido como a grande comunicação social trata tudo o que possa dizer respeito a Donald Trump. E quem diz grande comunicação social, diz políticos democratas, compreensivelmente frustrados com a mais que lógica derrota de Hillary Clinton.
Em segundo lugar, toda esta loucura artificialmente fabricada ao redor de Donald Trump esbarra com uma realidade que muitas vezes referi nos meus textos: um general não faz um exército. Os propagandistas ao serviço da nomenklatura mostram Donald Trump como um ditador em potência, que passará por cima dos direitos de tudo e de todos. O que o desespero e a frustração acabam por produzir...
Em terceiro lugar, as origens culturais de Donald Trump. A verdade é que não faltam em Portugal personalidades do mais alto gabarito económico, cultural e académico, mas continuamos divididos, com uns a colaborarem objetivamente com interesses estrangeiros, e sempre muito ao redor da cauda da Europa, ou mesmo mundial em certos domínios. O caso da corrupção é o exemplo mais referente desta realidade. Não nos faltam cultura, títulos académicos, experiência política, etc., mas, no plano relativo, estamos onde sempre estivemos. Mais ou menos.
Em quarto lugar, o seu temperamento. Diz-se que não é bom, ou que não é o melhor. Mas o que se dizia de Aníbal Cavaco Silva, logo no seu início e ao longo do seu primeiro Governo? E o que disse Salgado Zenha de Mário Soares, ao redor da leitura de documentos em diagonal, ou algo do género? E o que nos contou Rui Mateus sobre Soares? Portanto, operar análises políticas com base no diz-se, bom, é garantidamente um mau caminho. O que é verdade em tudo isto é que Donald Trump tem um tipo de intervenção que, se necessário, se torna grosseiro. Só que a grosseria foi o que não faltou aos seus adversários quando se lhe referiram.
Em quinto lugar, o já célebre muro. Simplesmente, o muro já existe! Já leva cerca de um milhar de quilómetros. E o que não falta no mundo são muros, desde Israel a Estados diversos da União Europeia. Nestes casos, porém – noblesse oblige –, os nossos jornalistas evitam referi-los, tal como António Guterres nunca cita o caso israelo-palestiniano. Tudo naturalíssimos acasos, claro... Num outro texto voltarei a tratar do caso do muro, porque o mesmo tem uma outra função que o cinismo da política e a guerra religiosa hoje em curso não permitem que seja citado aqui de modo adequado.
Em sexto lugar, o caso da expulsão dos ilegais. Mas trata-se de um tema já aplicado desde há muito, atingindo, por exemplo, portugueses açorianos que se haviam visto a braços com a área da Justiça. E ninguém pode duvidar de que o nosso Renato Seabra, logo que cumprida certa parte da pena, será repatriado para Portugal. De resto, de há muito defendo que casos deste tipo devem ser remetidos para o país da nacionalidade dos condenados, logo que terminados os julgamentos.
Em sétimo lugar, o caso das investigações a Hillary Clinton. Como se sabe, Barack Obama pediu a Donald Trump que não as promovesse. A verdade é que um tal pedido faz crescer no meu pensamento a ideia de que algo de legalmente inaceitável poderá ter-se passado, seja com o caso dos e-mails, seja com o da Fundação Bill Clinton. Mas se nada de mal existiu e se os Estados Unidos são um Estado de Direito, que razões podem levam a um tal pedido de Barack Obama? E se for o Congresso a mandar operar tais averiguações? Coisas estranhas, muito à moda americana...
Em oitavo lugar, o grito de AMERICA FIRST. Mas não é natural que um presidente americano pense deste modo? O problema é que na União Europeia os nossos políticos gritam União Europeia First, mas os alemães fazem-se sempre ouvir com o grito de GERMANY FIRST. E aqueles, sempre de cócoras e realmente já sem valores, dizem sentir-se profundamente europeístas, mesmo quando mui bem pontapeados. É excelente.
Em nono lugar, o ridículo caso da OTAN. Ora, nos seus piores momentos, Donald Trump nunca defendeu o fim da OTAN, nem que não aceitaria o Artigo 5. O que Trump salientou foi que não irá aceitar que os americanos continuem a ser usados como carne para canhão e a pagar o que compete aos restantes, precisamente nos termos do Tratado. E tem aqui a mais cabal razão. De resto, ele sabe muitíssimo bem que Obama e Hillary se encarregaram de criar em Putin um inexistente inimigo, ao mesmo tempo que se envolveram em falhadíssimas iniciativas no Médio Oriente. Foram asneiras a esmo. E asneiras com consequências mundiais.
Em décimo lugar, as relações com a Rússia. Mas que razões podem impedir que os Estados Unidos queiram manter a Paz com a Rússia? Pois, se assim pretendem, terão de pôr um fim no modo agressivo, até insultuoso, como a administração Obama tratou Vladimir Putin e a Rússia. Obama e Hillary desenvolveram a fantástica mentira metodológica de tentar vender a Rússia democrática como se fosse a URSS dos tempos de Estaline!! Uma ideia que a nomenklatura europeia, hoje profundamente ligada aos grandes interesses mundiais e cada dia mais distante dos cidadãos, comprou como um canal sem ruído. De molde que deixo esta pergunta, já por mim esboçada em textos anteriores: que razões poderão impedir a entrada da Rússia na OTAN? Não seria uma base essencial para a Paz na Europa e em boa parte do mundo?
Em décimo primeiro lugar, a fraqueza de Hillary Clinton. No fundo, nem com os apoios de Bernie Sanders, de Obama, de Michelle e de quase toda a grande comunicação social mundial, hoje ao serviço dos grandes interesses da nomenklatura criada à sombra da globalização, conseguiu ganhar com as regras desde sempre existentes e praticadas nos Estados Unidos. Imagine-se o que teria sido o resultado sem esses apoios...
Por fim, o futuro. Bom, se não for Donald Trump assassinado, os Estados Unidos irão ser colocados em primeiro lugar. O que significa que os outros países terão de se tornar mais atinados e exigentes com os seus deveres. Basta que tenham o juízo político que de há tanto vem faltando aos fraquíssimos políticos europeus que vimos tendo desde há uma boa imensidão de tempo. Asneiras a esmo, falta de valores, elevação do dinheiro e deus supremo, com a quase completa secundarização das pessoas e dos seus naturalíssimos direitos.
Infelizmente, realidades que só muito dificilmente irão mudar. O recente texto de Jorge Sampaio mostra que assim é, porque com a sua idade e a sua longuíssima experiência política ainda não tem respostas para a trágica situação europeia, esperando pelos resultados do que designou por um amplo debate sobre o tema! Como tinha razão João Pedro Miller Guerra, quando referiu que as universidades não se autorreformam. E assim está a famigerada União Europeia, que vê num reformador como Donald Trump um perigo! Para os políticos europeus de hoje, como para Obama e Hillary, continuar a caminhar para o abismo da guerra no leste europeu, com a pobreza a crescer, era o caminho a seguir. Triste sina.
