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|Hélio Bernardo Lopes| |
Ninguém duvida de que Carlos Alexandre é um juiz extremamente experiente, determinado, inflexível e que, dentro da lei, não se deixa tolher pela condição de quem possa surgir-lhe pela frente. E, ao contrário do que tem sido propalado, esta não foi a primeira vez em que falou à grande comunicação social. Já em certa noite, numa procissão que estava a decorrer em Mação, Carlos Alexandre se quedou em plena rua, falando à repórter que o entrevistou, e onde salientou que atuava exclusivamente à luz da lei e da sua consciência e que não surtiam efeitos quaisquer pedidos.
Não existem, por razões objetivas, quaisquer factos nesta mais recente entrevista que justifiquem mais que uma chamada de atenção do Conselho Superior da Magistratura a Carlos Alexandre. Por um lado, o que disse não tem um ínfimo de influência sobre o processo. Por outro, quem acusa é o Ministério Público, como ontem bem referiu Ricardo Sá Fernandes. A verdade, quase com toda a certeza, é que estão a surgir dados que apontam para a saída de Carlos Alexandre do caso Marquês. Quem o substituir, naturalmente, poderá discordar das decisões do seu antecessor, tudo mudando de rumo. Uma tragédia para a já muito má imagem do Sistema de Justiça.
Como ontem referi, há já um bom tempo atrás, em certa intervenção sua, José Sócrates fez a afirmação de que sabia que ia ser condenado, o que de pronto refutei, salientando que não existia qualquer indício de tal acontecimento. Basta falar com alguém amigo e corrente, embora atento, para se perceber que tal hipóteses esteve sempre em dúvida. A grande verdade é que a generalidade dos portugueses não concebe que, em Portugal, alguém do topo da pirâmide política possa ser condenado. Protesta-se, mas quando surge a situação não se gosta. Portugal é como é.
Olhemos alguns casos. Fernando Lima, neste seu recente livro, falará de um magistrado que terá feito chegar a Belém informação de que o genro de Aníbal Cavaco Silva estava a ser escutado. E já se ouviu alguma campanha na comunicação social a exigir que se apure quem foi esse magistrado? Claro que não! O que surgiu foi um silêncio quase sepulcral.
Neste agosto que passou os dois filhos do embaixador do Iraque em Lisboa, deram uma violenta e perigosa tareia no jovem português Ruben Cavaco. Bom, foi um fantástico burburinho, até com pedidos de rapidez ao Ministério dos Negócios Estrangeiros do Iraque. Mas no caso do homicídio de Rosalina Ribeiro, no Brasil, que é coisa muito mais grave que o de Ponte de Sor, alguma vez alguém perguntou o que quer que fosse sobre o fim do processo no Brasil, ou simples celeridade? E a nossa grande comunicação social? Fala nisso? Claro que não! Um silêncio sepulcral.
Depois, o caso de Adelino Vera-Cruz Pinto. Então, sendo procurado também pela INTERPOL, ninguém no mundo pequeno de hoje consegue descobrir o que quer que seja sobre o nosso concidadão? E a nossa grande comunicação social aborda este tema do modo persistente como está a fazer com declarações de lana-caprina produzidas pelo juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal? E que é feito dos casos Furacão, BES/GES, BPN, etc., etc.? Quando é que terminam? E terão condenados a prisão efetiva? Claro que ninguém acredita. E não se acredita pela mesma razão que nunca alguém acreditou na condenação de José Sócrates, muito para lá do que, de facto, possa ter-se passado ou apurado. E isto tem uma causa: o Sistema de Justiça tem uma muito má imagem, tomado como operando duas leituras dos acontecimentos, a justiça para ricos e a dos que não têm riqueza. É a opinião, muito geral, dos portugueses.
Por tudo isto, tem de colocar-se esta pergunta: não é verdade que Carlos Alexandre começou logo a ser posto em causa desde o início do caso Marquês? Aos poucos, de um modo sub-reptício, Carlos Alexandre foi sendo posto em causa. Simplesmente, José Sócrates foi perdendo todos os recursos, do que a grande comunicação social também se fez eco. Então e agora? Se vier Carlos Alexandre a deixar o caso Marquês, o que irá decidir quem o vier a substituir? Porque se essa decisão for a inversa de tudo o já decidido até aqui, bom, qual será o português que ainda continuará a dar crédito ao Sistema de Justiça Português? De facto, quase ninguém.
Termino recordando Miguel Sousa Tavares, quando, injustamente, apontava, há já muitos anos, José Narciso da Cunha Rodrigues como o grande responsável pelo estado da Justiça em Portugal. A verdade é que, tantos anos depois, já sem ele na ribalta, as coisas são como se vão vendo. Estou, pois, muito expectante com o que irá ser dito por Carlos Alexandre na entrevista ao EXPRESSO, neste próximo sábado. Será que vai fechar a campa, depois de ter a mesma sido aberta? Por tudo isto, embora nunca tendo escrito uma frase sobre o tema, eu sempre estiva quase certo de que José Sócrates não seria condenado.