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|Tânia Rei| |
Não, isto não pode ser o início de uma boa estória! O que poderia acontecer de inusitado neste cenário? Entrar um homem lindíssimo pela porta? Demasiado cliché. Um assalto à mão armada? Um ataque zombie? Uma invasão de seres alienígenas? Não, nada disto serve uma boa estória.
Há vivências que parecem que nunca poderiam ter sido experienciadas por nós, porque, sei lá!, não se enquadram. O mais estranho, é que com facilidade percebemos que uma grande fatia do queijo populacional considera que o incomum lhe bate à porta diversas vezes, como algo “normal”, “habitual”.
Para todas essas pessoas, sentencio que estão enganadas.
Todas essas pessoas seriam incapazes de cheirar sequer algo fora do normal, porque não estão para aí viradas, num mundo que se quer de clones. E à força de tanto se querer ser diferente, copia-se o vizinho do lado, em maneirismos desajeitados e que não caem bem, tudo para acumular as ditas estórias do incomum. É este, o mundo em que se caminha na rua na esperança de que, ao chutar uma pedra, saia de lá a estória da nossa vida, a que nos vai tornar famosos, nem que seja lá no bairro.
Só que isso dificilmente vai acontecer. A tendência é para que os acontecimentos do quotidiano tenham de ser mais do que isso, tenham de ser epopeias, romances avassaladores, ficções científicas daquelas mesmas boas, e BD’s e cartoonistas famosos.
Não percebo a fixação das pessoas pelas estórias rebuscadas, que soam a mentira e a filme de domingo à tarde. Eu cá gosto das coisas normais. O improvável só se quer se o desfecho for, como de rotina, bom, ou pelo menos, aceitável. Caso contrário, que o destino recolha as unhas, ou as lime, ao menos, para não arranhar os incautos moradores deste piso.
“E ali estava eu, sentada na mesa de uma pastelaria, com uma chávena suja de café à frente. Folheava nem sei bem o quê, que por ali estava à mão, e pensava, desta vez tristemente, sobre a existência do eu.”
Não deve ser a estória de uma vida, mas já é alguma coisa. O começo é o mesmo, o humor é diferente, o final é, provavelmente, idêntico. A autora deste início arrebatador levanta-se, paga o café, e sai, tão alegre, triste ou pensativa quanto entrou. E segue, na sua vidinha normal, evitando, de futuro, um punhado de estórias do extraordinário.