Um caso que nos faz pensar

|Hélio Bernardo Lopes|
Num qualquer dia da passada semana surgiu a notícia de um julgamento, já a decorrer, em que o acusado é um antigo seminarista de Barcelos, agora acusado de difamação, creio que pela Diocese de Viana do Castelo ou por concidadãos nossos com funções eclesiásticas no seio da Igreja Católica.

Muito sinceramente, já não recordava este caso, mas logo o fui buscar a uma qualquer gaveta da minha memória. Não, claro está, no seu pormenor noticiado ao tempo, mas nas linhas gerais que lhe deram forma. Trava-se – e trata-se – de um antigo seminarista que dispunha de um seu blogue e que aí foi denunciando, creio agora que também de forma sarcástica, personalidades diversas da referida diocese. Denúncias que se constituíam em aspetos financeiros e sexuais. E, como se torna evidente, nenhum de nós conhece a realidade que teve lugar.

Claro está que o tribunal também não poderá apurar a verdadeira verdade, permita-se-me esta expressão. O que acabará sempre por subsistir será a dúvida e, quase com toda a certeza, a condenação do referido seminarista, hoje a viver no Canadá, nos termos do ora noticiado.

As razões de ser este o previsível desfecho são muito fáceis de perceber. Por um lado, o tal seminarista, se acaso pretendesse provar o que foi escrevendo no tal seu blogue, teria de dispor de provas, fossem materiais ou testemunhais. Estas nunca certamente conseguirá apresentar, ainda que as pudesse conseguir, porventura, com a imensa boa vontade e coragem de quem quisesse testemunhar. Quanto às primeiras, poderá sempre apresenta-las, mas se delas dispuser e se tiver quem o defenda, o que é por igual duvidoso.

Por tudo isto, o desfecho deste processo é deveras previsível. Ora, segundo o noticiado há dias, o padre Vítor Gonçalves, chefe de gabinete do bispo de Viana do Castelo, disse que Marco Ribeiro – o seminarista a viver no Canadá – tinha feito uma ameaça séria, dizendo dispor de matéria para destruir a fama da diocese de Viana do Castelo e até a de Braga.

A minha dúvida, neste caso, é esta: o que fizeram as autoridades competentes para levantar estas indeterminações? Foi pedido o repatriamento do tal seminarista às autoridades canadianas? E se foi, o que disseram estas? Foram feitas diligências relativamente aos problemas materiais alegadamente apontados pelo tal seminarista?

Por fim, uma pergunta especialmente para o leitor: pensando, por mera hipótese académica, que tudo isto era uma verdade e se encontrava a par de tais realidades, nada tendo que ver com elas e tendo a sua vida e carreira de padre, tinha a coragem suficiente para apresentar queixa às autoridades judiciárias, ou evitava meter-se no caso? Note que esta pergunta tem igual lógica num qualquer outro caso em que esteja presente uma estrutura muito fortemente unida, como a militar, a policial, a das magistraturas, etc..

Aonde pretendo, então, chegar eu com este meu texto? Pois, à conclusão de que o assumir de tais iniciativas daquele seminarista sempre teria de pressupor a real existência de provas, mormente materiais ou testemunhais. E teriam de ser muito fortes, ou tudo poderia dar em nada. Um caso muito típico e já por mim referido por diversas vezes, foi o do julgamento, em Nuremberga, do grande-almirante Karl Dönitz: depois do promotor de justiça ter pedido a sua condenação à morte, o militar apresentou provas materiais de que o seu colega norte-americano, Chester Nimitz, havia feito o mesmo na guerra do Pacífico. Bom, já não foi condenado à morte, mas a dez anos e vinte dias. É que nenhuma ordem jurídica pode garantir que os atos praticados no seu seio são justos.

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