A Democracia

|Hélio Bernardo Lopes|
De um modo muito geral, os grandes defensores da liberdade democrática, mormente ao tempo da II República, defendiam a ideia de que a mesma, para lá de coisa natural, era essencial a uma consciente escolha dos cidadãos em face das realidades que tivessem pela frente.

O próprio Mário Soares, no seu PORTUGAL AMORDAÇADO, defendeu mesmo que Salazar tinha o dever de ter sufragado, pela escolha livre dos portugueses, a defesa das antigas províncias ultramarinas, tal como pôde ver-se.

Esta tomada de posição suportava-se numa ideia hoje claramente percebida como errada: o de que um esclarecimento cabal de cada um dos acontecimentos da vida da comunidade seria, para lá de acompanhado pelos cidadãos, decidido de acordo com os interesses destes e do País, olhado este na sua perspetiva histórica e à luz da realidade do tempo de cada decisão. Simplesmente, cada um de nós não é um computador, sendo coisa natural o próprio desinteresse sobre as coisas em apreço.

Vem isto a propósito de uma conversa a que há dias assisti, na pastelaria em que me encontrava, onde na mesa ao lado três senhoras discutiam as palavras de António Costa no encontro que teve com a comunidade chinesa em Portugal. Sempre atentas à minha presença na mesa contígua, conhecendo-me de vista – e eu a elas –, lá iam tecendo considerações completamente inócuas. As três senhoras são licenciadas pelas universidades portuguesas e já hoje aposentadas da sua profissão de sempre: professoras de liceu. Uma delas, a mais preponderante, mas por razões que não vêm agora ao caso, explicava que estavam já a ter lugar muitas reações no seio do PS, mesmo com demissões de militantes.

Depois de um novo olhar, a mais preponderante lá explicou, perante a aquiescência das outras duas, que quem se havia demitido era um que era médico, de apelido Barroso, e que era muito mal educado. Teria até tido uma função qualquer com o Soares. E assim foram prosseguindo, sempre de asneira em asneira, mas por igual sem assumirem uma opinião sobre o que estava em causa: a gafe de António Costa.

Mostra esta conversa, pois, que três senhoras de boa idade – entre os setenta e os oitenta –, ainda válidas e mexidas, todas licenciadas, para lá de continuarem a manter medo na exposição do seu pensamento, também desconheciam, afinal, o que realmente se passara com o fundador do PS que se demitiu do partido, e que foi Alfredo Barroso e não Eduardo Barroso. Estas senhoras, caro leitor, têm hoje o direito de votar nas eleições livres que existem entre nós, mas nem sabem do que falam. E são licenciadas!

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