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| |Hélio Bernardo Lopes| |
No caso de hoje a ideologia é o neoliberalismo; depois da guerra foi o protecionismo dos cidadãos, apoiados na defesa da promoção da sua dignidade. Hoje é o cada-um-que-se-salve; naquele tempo era o todos por um, embora com as naturais diferenças.
Nunca por um segundo duvidei de que esta seria a mais que evidente consequência do tudo-privado, de pronto defendida no Ocidente pelos donos do mundo, logo que o comunismo soviético viu o seu fim. O valor da vida e da dignidade humana têm-se vindo a perder, substituídos pelo de deter dinheiro e riqueza. Chegou-se mesmo ao ponto de conseguir perceber que os grandes criminosos da alta finança, de um modo muito geral, nem condenáveis são pelos tribunais.
Esta realidade muito objetiva foi bastante bem sintetizada por José Pacheco Pereira no seu escrito deste passado sábado, quando referiu a mudança que o SYRIZA trouxe a um mundo estagnado e pantanoso, maldoso e desigual. A verdade, caro leitor, é que continuam a existir por aí, e sempre pronunciando-se em nome dos valores da (sua) democracia, os que pedem a todos os santos – os já existentes e os futuros – que o SYRIZA nada consiga realizar de realmente válido. Têm razão, na medida em que defender hoje a dignidade humana é para aqueles abjetos concidadãos coisa velharia.
Acontece, como pude já escrever, que logo na sequência da vitória do PSD de Pedro Passos Coelho eu me determinei a escrever ao cardeal José Saraiva Martins, em carta enviada para a sua terra, onde então se encontrava. Aí alertava para esta ideia central: vem aí a eutanásia. Como logo se poderia perceber, difícil seria não perceber isto mesmo. E foi o que tem vindo a poder ver-se, desta vez no Canadá. Nesta passada sexta-feira o Supremo Tribunal do Canadá anulou uma proibição que se encontrava em vigor, ao redor do suicídio medicamente assistido. Esta metodologia vai passar a ser permitida, embora reservada a adultos na posse de todas as capacidades intelectuais que sofram de uma doença incurável.
Durante este primeiro ano, porém, a norma ainda não entrará em vigor, ficando a comunidade canadiana convidada a debater tal realidade. A verdade, porém, é que este desfecho teria sempre de vir a ter lugar, dado que o modelo político-económico que comanda hoje o mundo se suporta, acima de tudo, na defesa do dinheiro e do lucro, secundarizando completamente o valor da vida e a sua dignidade. Ainda agora nos foi dado observar – e com que dor?! – o que se passou ao redor dos tais medicamentos que salvam da morte os infetados com Hepatite C. E só vamos ainda no caso da Hepatite C...
Hoje, perante quanto desde sempre se podia ter percebido e pelo que se está a confirmar, até eu já mudei de valores essenciais neste domínio. Entendo hoje como fora da lógica da atual organização social que se continue a defender a recusa do suicídio medicamente assistido, quando é quem comanda a própria sociedade que atira os seus concidadãos para um sofrimento que pode ser verdadeiramente indescritível e mesmo desumano, recusando-lhe o acesso aos cuidados de saúde, exceto se puder pagar por si. É que nós fomos conduzidos, como muito bem referiu José Pacheco Pereira, a um mundo estagnado e pantanoso, maldoso e desigual.
