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|Hélio Bernardo Lopes| |
De molde que creio não estar enganado se tomar para mim que nunca um qualquer dos nossos bispos assumiu publicamente a inaceitável situação do hiperbólico preço de medicamentos essenciais à salvaguarda da vida humana. Muito sinceramente, não retenho uma qualquer crítica a tal situação, como por igual com os fantásticos vencimentos auferidos por umas centenas de portugueses, numa sociedade a caminho de uma pobreza muito generalizada.
Ora, nestes dias recentes, fruto de uma desagradável singularidade, acabou por se precipitar uma solução para o preço dos medicamentos essenciais para salvar vidas de pessoas com Hepatite C. O que há um ano se discutia, aparentemente sem andar para diante, num ápice encontrou a solução que ora se conhece.
Claro que todos ficaram contentes com a solução encontrada, percebendo-se que a mesma teria podido ser conseguida muito mais cedo, para tal bastando que tivesse existido vontade política. Os dados essenciais ao encontrar de uma solução estavam há muito lançados, pelo que a solução ora encontrada podia estar em vigor desde há muito, evitando-se desse modo mortes inúteis.
Sem espanto – nenhum espanto –, eis que o Patriarca de Lisboa veio considerar neste sábado muito positivo o referido acordo alcançado, de modo que todos os doentes possam aceder aos medicamentos inovadores para a hepatite C, lamentando que só tenha ocorrido após uma morte. Bom, caro leitor, não consegui evitar o espanto que me acometeu, porque uma coisa é existirem mortos no entretanto, outro o manterem-se os bispos portugueses num silêncio sepulcral perante o que estava até aqui em vigor neste domínio. O que justifica que se coloque a questão sobre se os bispos católicos portugueses conhecem outras doenças em situação similar, e se já se pronunciaram, e como pensam levantar tal indeterminação. Em que se fica?
Esta espécie de boleia apanhada pelo Patriarca Clemente, porém, deve ainda ser vista sob duas ópticas. Por um lado, o vir a terreiro deitar foguetes, digamos assim, quando nunca nada foi dito sobre o terrível drama qua tantos portugueses viviam. Por outro lado, vir agora bater palmas à solução encontrada, esquecendo o atraso da mesma, dá a sensação de um apoio político à atual maioria. Um domínio em que nunca se deverá esquecer aquela salva de palmas nos Jerónimos...
Os portugueses, como se sabe, têm referências católicas na sua postura perante a vida, embora vivam, de um modo muito geral, a anos-luz do magistério da Igreja Católica. Simplesmente, é-nos legítimo esperar dos nossos bispos católicos imensamente mais que a defesa da vida de quem está prestes a nascer, defendendo por igual a de quem já nasceu e por aí se vê a viver as agruras causadas pela atual ordem político-económica mundial. Neste domínio, os nossos bispos católicos estão também a anos-luz da militância que se vê em Francisco. E é pena.