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| |Hélio Bernardo Lopes| |
Como se torna evidente, foi um tempo inutilmente perdido, mas que valeu a pena, porque voltou a confirmar esta realidade simples: se o nosso Sistema de Justiça – ou um outro qualquer – funcionasse como ali defendeu José Miguel, bom o crime organizado teria já ido incomensuravelmente mais longe e por toda a parte.
Apesar de tudo isto, sempre me dei por satisfeito por ouvir de José Miguel Júdice o reconhecimento de dois dos seus falhanços em matéria de previsão política. É verdade que não referiu o mais estrondoso, e que foi aquele raciocínio profundo e semanalmente continuado, no EXPRESSO, onde dizia demonstrar que António Soares Carneiro sairia vencedor sobre António Ramalho Eanes. Perante a promessa que então fez, Júdice lá deixou de fazer análise política, sabendo perceber que cada um é para o que nasce.
Simplesmente, com ninguém a vida é só coerência, de molde que o causídico lá voltou a debitar pontos de vista e ideias, mas qual delas a mais chocante com a realidade. Vejamos algumas das suas ideias desta última entrevista à SIC Notícias.
Em primeiro lugar, o caso do Bloco Central. Bom, José Miguel Júdice é liminarmente contra tal iniciativa de governação. E porquê? Diz Júdice que, por um tal caminho, os extremos acabariam por crescer! Passa, deste modo, sobre a História da III República, esquecendo – só pode ser intencional – que o português nunca teve qualquer interesse na democracia e que tem uma visão clubista da vida partidária. Mesmo que os maiores economistas do mundo agora viessem aqui salientar que o PCP era quem tinha a melhor solução para o futuro de Portugal, ainda assim os portugueses, na pior hipótese, refugiar-se-iam na abstenção. Júdice finge – não consigo perceber outra motivação – não perceber esta realidade objetiva.
Em segundo lugar, as escutas telefónicas, ou iniciativas similares. Não sendo um ignorante do que vai pelo mundo, José Miguel Júdice tem o dever de perceber que num tempo em que a utilização de meios de comunicar entre as pessoas, e por todo o mundo, é o que se conhece, a escuta telefónica é um instrumento absolutamente essencial. Como já se está a ver, mormente no Reino Unido, embora não só. Um verdadeiro brincalhão.
Em terceiro lugar, o quase completo esquecimento de que ao que se escreve nos jornais em matéria de segredo judiciário não deve ser dado grande crédito. Basta que se fique atento. De resto, como sabe Júdice que as duas notícias de conteúdo diametralmente oposto eram, de facto, provenientes de fontes da investigação? Como sabe se não era um bluff operado com fins estratégicos? Sim, porque a verdade é que ele acreditou nessas histórias, contando-as agora como se fossem verdadeiras! Mas como tem ele tal certeza? Será que José Miguel Júdice não percebe que tais notícias de jornal são como provas de noves?
Em quarto lugar, se é verdade que todos achamos que não vale tudo para se descobrir a verdade por detrás de um crime, também o é que Portugal, durante muitas décadas, viveu a aberração de nunca ninguém com algum tipo de poder ser acusado e condenado. O resultado já era sempre dado como certo: nunca era.
E, em quinto lugar, o reconhecimento, sem dúvida interessante, de que também existem advogados que informam (convenientemente) os jornais sobre o que se contém nos processos, muito em especial no domínio penal. Ora, a verdade é que nunca se descobriu ninguém que tenha violado o segredo de justiça, seja juiz, procurador, advogado, funcionário, polícia, etc.. Também aqui tudo é sempre nada.
Espero que os nossos jornalistas evitem este tipo de entrevistas, que até acabam por levar um advogado a falar do que não sabe – o que se contém no processo da Operação Marquês –, dando opiniões, sempre erradas, mesmo quando abarcando aspetos laterais ao que está em causa. Porque não se espera pelo resultado final? Porquê a pressa? Ou não será verdade que é a imagem de José Sócrates que sai atingida com este tipo de intervenções? Claro que é!
