![]() |
| |Hélio Bernardo Lopes| |
Foi o que ontem nos chegou a propósito do caso que envolveu Bernard Madoff: conseguiu-se recuperar mais de oito mil milhões de euros do montante que estava em causa. Um montante – o ora conseguido – que corresponderá, aproximadamente, a cerca de sessenta por cento do capital perdido na fantástica fraude capitaneada pelo norte-americano, hoje a cumprir uma pena de cento e cinquenta anos de prisão.
Não deixa até de ser interessante que as vítimas da fraude daquele norte-americano vão agora receber quase quatrocentos milhões de euros, isto num momento em que as vítimas recentes do fantástico surto de legionella em Portugal ainda duvidam, e com toda a razão, de que alguma vez venham a ser ressarcidas, seja como for. Não sabem, sequer, quem fez o quê, ou se existe responsabilidade extracontratual do Estado.
Esta atual situação norte-americana só foi conseguida por via de um acordo estabelecido com dois fundos estrangeiros que haviam mantido contactos com Bernard Madoff. Uma realidade que de pronto me trouxe ao pensamento o caso dos nossos dois submarinos, em torno dos quais houve já condenações dos corruptores na Alemanha, mas não dos corrompidos aqui. Conseguiu-se nos Estados Unidos, pois, garantir que o dinheiro irá chegar aos investidores que se viram lesados por uma fraude que decorreu por décadas. O leitor já comparou este caso com os nossos?
E também não deixei de encontrar um enorme interesse nas declarações de Carlos Tavares, ontem, na Assembleia da República, porque nos mostrou ali a sua convicção de que poderá ter existido informação preferencial no caso da venda, por parte de grandes acionistas, das ações do BES nas vésperas do nascimento do Novo Banco.
Ora, se uma tal suspeita surgisse nos Estados Unidos, o lógico seria procurar nas operadoras o movimento telefónico de um lote grande dos acionistas em causa nas vésperas da referida venda de ações. Se nesses lotes de telefonemas existisse um vasto denominador comum, bom, era enorme a probabilidade de ter existido o fornecimento da referida informação preferencial. Seguir-se-ia, naturalmente, o estender da pesquisa aos restantes grandes acionistas.
Mas será que um juiz português, ou a própria Procuradoria-Geral da República, aceitariam seguir uma tal metodologia? É muito pouco provável, como é enorme a de que logo nos surgissem limitações jurídicas, mesmo constitucionais, sobre a referida metodologia. O grande problema da nossa Justiça deriva, muito para lá da lei em vigor, de uma mentalidade que subjaz ao nosso Direito, que, em boa verdade, acaba por recusar a utilização do método científico no deslindar da grande criminalidade organizada, seja simplesmente nacional, seja mesmo transnacional. O que tem uma lógica consequência: somos os reis do tudo em nada, sempre bem confortáveis na cauda da Europa. Um problema imensamente antigo.
