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|Hélio Bernardo Lopes| |
Claro está que não posso estar aqui a comentar o que se passou com o antigo Primeiro-Ministro e os nossos três concidadãos, pelo simples facto de que desconheço a realidade do que se contém nas mãos do Tribunal e dos que nele operam. Por esta evidente razão, apenas irei abordar a envolvente pública deste acontecimento.
Em primeiro lugar, a quase singularidade deste caso, apontada por Daniel Oliveira no último O EIXO DO MAL. Bom, Daniel Oliveira não tem razão, dado que Jacques Chirac foi condenado, Diminique de Villepin, que era Primeiro-Ministro, foi detido e presente ao Tribunal de Grande Instância de Paris, onde respondeu a perguntas durante bem mais de dez horas, tendo saído daquele pelas três da madrugada.
Sarkozy, ex-presidente, foi detido no seu escritório, e conduzido ao tribunal competente. Mas também em Itália, Bettino Craxi teve que fugir para a Tunísia, vindo a ser condenado, à revelia, a trinta anos de prisão. Berlusconi teve tudo o que pôde ver-se, tal como Giulio Andreotti, que esteve a ser investigado e julgado ao longo de anos. Em Espanha, aí está o caso do genro do antigo rei, bem como de sua mulher, ou o julgamento de Baltasar Garzón, entre tantos outros casos. Em Israel, a condenação de um antigo Primeiro-Ministro a mais de sete anos de prisão, entre outros casos. Na Alemanha, casos os mais diversos, até recentes. E, nos Estados Unidos, o conhecido caso do pénis de Bill Clinton, ou os mil e um do Japão e da Coreia do Sul. Ou seja, não faltam casos por toda a parte do Primeiro Mundo.
Em segundo lugar, tornou-se agora muito mais claro que o juiz Carlos Alexandre e o procurador Rosário Teixeira se tornaram em homens a abater, digamos assim. Sobretudo, o primeiro. Chega-se mesmo ao ridículo de ouvir jornalistas, comentadores e opinadores a defender que Carlos Alexandre tem trabalho em demasia! Um pobrinho, coitado, sempre a trabalhar como um autêntico escravo. É uma dolorosíssima pena...
Em terceiro lugar, e como consequência da peninha anterior, a defesa de que sejam colocados mais juízes no TCIC. Simplesmente, como tais futuros juízes podem vir a seguir a escola que se tem podido ver em Carlos Alexandre, de imediato nos vêm os mesmos defender, afinal, a extinção do próprio TCIC. Até o DCIAP, dado que já existem os DIAPs! Factos que me trazem ao pensamento o caso do instituto jurídico do arrependido, ao tempo das FP 25: de existente sem problemas, passou logo a constituir, neste caso, um problema...
E, em quarto lugar, o inenarrável espetáculo das nossas televisões, acompanhando entradas e saídas, operando programas do tipo mais diverso, reconhecendo nada saberem, mas sempre opinando ou especulando. Um verdadeiro fartote de rir. Um autêntico estado de loucura. Uma marca do Portugal da III República, quarenta anos depois do seu nascimento.
Por fim, uma breve nota: que é feito da legislação sobre enriquecimento ilícito? Como pode alguém – e penso aqui em geral – possuir uma riqueza completamente inexplicável, depois de partir de nada, e, num ápice, aparecer como um quase milionário? Só existe um mecanismo para resolver tal problema: aplicar a equação de balanço, o que se tem–o que se declara–de onde provém. Não o fazer é, objetivamente, recusar a aplicação do método científico no Direito. Enfim, é o Portugal da III República, quarenta anos depois do seu nascimento.