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|Hélio Bernardo Lopes| |
E explicava-se que no caso de quem estivesse a ser julgado se determinar a manter o silêncio nas audiências, o que se continha no inquérito simplesmente nada valia. Expliquei, por diversas vezes, que tal teoria não tinha fundamento, porque se tivesse, bom, ninguém nunca era condenado. Bastaria manter-se em silêncio durante o julgamento. E mostrei a estranheza destes programas, dado o facto dos jornalistas nunca colocarem aos entrevistados esta elementar evidência.
Pois, na passada quarta-feira, num dos noticiários da hora do jantar, a propósito de certo julgamento que creio ter envolvido um homicídio, o acusado resolveu-se a não falar. À luz da tal teoria – uma teoria sem nexo –, este nosso concidadão, se acaso mantiver esta sua postura, virá a ser absolvido, o que, quase com toda a certeza, não irá ter lugar.
Simplesmente, à saída da audiência, o seu advogado, instado pelos jornalistas sobre o silêncio do seu cliente, referiu que este havia dito que nada sabia e nunca soubera do caso em causa. Em todo o caso, durante o inquérito, este nosso concidadão reconheceu a sua culpa em quanto estava em jogo.
Ora, o que era dito nos tais programas a que fiz referência ao início, é que as declarações constantes do inquérito deviam valer, desde que feitas perante um juiz e na presença do advogado. E fazia-se passar a ideia de que esta situação é a corrente. De molde que não posso deixar de lamentar a pouca coragem dos jornalistas que ali estavam, porque aquele era o momento para perguntar ao causídico se havia estado presente em todos os interrogatórios operados pelas autoridades policiais neste caso.
Como se torna evidente, é altamente provável que tal não tenha tido lugar, e mesmo que nenhum juiz tenha assistido ao tal interrogatório em que o acusado de agora explicou tudo. O tudo que ele agora diz desconhecer e também nunca ter conhecido.
Recordando o julgamento de Salazar na I República, também aqui o que eu penso só eu sei e não digo a ninguém. Mas foi pena que os jornalistas não tenham tido a coragem de colocar ao causídico esta questão absolutamente essencial: esteve presente no interrogatório em que o seu cliente explicou tudo, bem como um juiz? Foi uma oportunidade lamentavelmente perdida.