Descobertas que marcarão a História

Hélio Bernardo Lopes
Volta que não volta, lá nos surgem aparentes descobertas de coisas deveras evidentes. Evidentes já mesmo desde há muito. São os casos da vinculação a compromissos internacionais e do poder político se ter deixado castrar pelo poder económico. Temas abordados, respetivamente, por Vital Moreira e José Silva Peneda. Bom, com toda a sinceridade, fiquei deveras admirado. E é sobre estes dois temas que aqui peroro um pouco.

Vejamos o caso da vinculação a compromissos internacionais. Não sendo jurista, acompanho, em todo o caso, a atividade noticiosa fornecida pelos grandes meios de comunicação social. Neste sentido, não me recordo de alguma vez, sempre que foram assumidos compromissos internacionais, de ter Vital Moreira levantado a correta questão que agora abordou.

Tem o académico toda a razão, como eu mesmo sempre escrevi, mas a grande verdade é que não recordo de escutar alguém da área do Direito em defesa desta correta posição, logo a começar por Vital Moreira. A única pessoa que me surge ao pensamento é Paulo Otero, colega daquele mas da Universidade de Lisboa. Por um mero acaso, fui encontra-lo como convidado no programa da TVI 24, OLHOS NOS OLHOS – nunca acompanho o programa –, onde lhe pude ouvir que a generalidade dos tratados assinados por Portugal no âmbito da União Europeia obrigaram, depois, a mudanças constitucionais, porque a seguir-se o caminho ora proposto por Vital Moreira, o Tribunal Constitucional teria atribuído inconstitucionalidades a quase todos esses tratados.

A este propósito, cheguei mesmo a apresentar, num dos meus textos, um exemplo limite e fortemente hipotético. Admita-se que o Governo de Portugal, nas suas negociações periódicas com a Tróyka, aceitava entregar a Região Autónoma dos Açores a uma qualquer entidade credora. Seria um tal ato inconstitucional? Claro que sim, embora se levante a questão: como podia o Tribunal Constitucional decidir pela sua inconstitucionalidade?

Esta pergunta tem lógica, embora num cenário hipotético e extremo. Esse cenário seria materializado pela ausência de solicitação ao Tribunal Constitucional a fim de apreciar da inconstitucionalidade de semelhante decisão do Governo. Se nenhuma das entidades decidisse solicitar essa apreciação, o ato de entrega de uma parte do território nacional prosseguiria com toda a normalidade.

Claro está que um qualquer cidadão poderia apresentar uma queixa num qualquer tribunal contra o Primeiro-Ministro, podendo este órgão declarar a inconstitucionalidade de tal ato, assim obrigando o Tribunal Constitucional a ter de pronunciar-se. Foi o que se passou com a decisão do histórico juiz Barata ao redor da suposta inconstitucionalidade da Lei 8/75.

Para mim, o estranho nestas palavras de agora de Vital Moreira foi o não lhe ter eu escutado uma qualquer chamada de atenção para esta reiterada realidade. Claro que pode ter-me passado ao lado uma sua intervenção neste sentido, mas até estas suas mais recentes palavras nos induzem a ideia de que as mesmas são, digamos assim, uma estreia absoluta. Em qualquer caso, trata-se de uma chamada de atenção muito tardia.

Olhemos agora o caso do poder político se ter deixado castrar pelo poder económico, que veio agora reconhecer José Silva Peneda. Bom, é uma outra evidentíssima realidade, mas que chega com muitos anos de atraso. E porquê? Bom, porque tal realidade está hoje completamente consumada.

É pena que José Silva Peneda não tenha percebido que esta sua constatação de agora seria sempre um dado certo, desde que a política mundial fosse no sentido há dias referido por Ângelo Correia na sua entrevista ao i. O sentido que lhe tem vindo a ser imprimido, sempre sem uma chamada mínima de atenção para o atual desastre.

Mas tem razão quando refere que a sociedade portuguesa tem problemas muito graves e muito complicados. E o leitor, já se tinha dado conta desta espécie de descoberta de Silva Peneda? Mas o economista diz ainda mais: não acredita nos automatismos do mercado, realidade que a crise mostrou claramente. E o leitor recorda-se de ter Silva Peneda esgrimido esta ideia de um modo forte e bem audível? Sendo assim, que metodologia governativa propõe José Silva Peneda?

Ora, é aqui que todo este discurso, aparentemente crítico para a atual política do PSD, se nos mostra na sua cabal plenitude. E porquê? Bom, porque José Silva Peneda nos diz agora, já de um modo mais claro – Pedro Passos Coelho afunda-se a uma cadência diária –, que Portugal precisa de um compromisso a dez anos. Um compromisso com três objetivos claros: a reforma do Estado, o crescimento da economia e o equilíbrio das finanças. Tudo, pois, coisas sempre ditas por este Governo, embora sem grande ligação com a realidade vivida pela generalidade dos portugueses. A não ser a pobreza gerada nos portugueses e nas suas famílias.

Mas José Silva Peneda logo junta uma condição absolutamente primacial – sempre se bateu por ela, mas sem que António José Seguro se determinasse a hipotecar o futuro político do PS, aceitando tal caminho –, e que é um entendimento neste âmbito entre as principais forças políticas. Ou seja: precisamos de tempo, mas sem um acordo de regime – um Bloco Central, portanto – dificilmente se poderá mudar Portugal, sendo tudo o resto conversa.

Simplesmente, como facilmente se percebe, um tal acordo só poderá ser gizado com a aceitação plena do PS relativamente às destruições já operadas pela atual Maioria-Governo-Presidente. Com António José Seguro este suicídio do PS e do pouco valor que a democracia ainda tem entre nós nunca teve lugar, o que justifica a pergunta: como vai responder agora o PS a este convite para se subordinar à política já realizada pela atual Maioria-Governo-Presidente? Estamos, pois, perante duas descobertas que marcarão a nossa História.

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