![]() |
| Ana Sousa Manso |
A descoberta, publicada na edição de dia 2 de outubro da revista Nature Communication, culmina quase 1 século de investigação desde que em 1933 se mostrou que a bactéria, capaz de causar pneumonia e meningites que matam milhões de pessoas por ano, podia também viver sem sintomas nas vias respiratórias humanas.
O trabalho é uma colaboração internacional entre cientistas no Reino Unido, Itália, Austrália e os Estados Unidos
A Streptococcus pneumoniae da origem aos casos de pneumonia e meningite bacteriana de maior mortalidade, podendo mesmo causar septicemia (envenenamento do sangue frequentemente fatal).
Apesar da existência de vacinas e antibióticos contra a infeção, o pneumococo continua fora de controle, em especial entre os grupos de maior vulnerabilidade como crianças, idosos e doentes com problemas imunitários em particular nos países mais pobres.
De facto, e de acordo com a organização mundial de saúde, esta bactéria mata anualmente 1,6 milhões de pessoas, sendo também a principal causa de óbito em crianças com idade inferior a cinco anos. Assim, compreender como emerge a virulência (capacidade de infeção) do pneumococo, é visto por muitos como o “Santo Graal” para o seu controle, e um passo crucial para isto foi a descodificação do seu ADN
No estudo agora publicado Ana Sousa Manso e colegas abordam o problema de forma diferente, e vão à procura de possíveis mecanismos epigenéticos. Neste caso os genes ligados à virulência do organismo seriam ativados (ou inibidos) por ligação de uma molécula externa “reguladora”, e não por mudanças neles mesmos (mudanças nas contas). Epi em grego significa “em cima”, epigenética é literalmente em cima dos genes.
A hipótese emergiu a partir da descoberta no pneumococo dos chamados Sistema RM. Estes funcionam como defesas bacterianos que atuam degradando o material genético de organismos invasores. Mas para evitar que o ADN bacteriano seja atacado por engano – e aqui é a parte interessante – este é marcado com um grupo químico chamado metil pelo sistema RM. Ora a metilação do ADN é um dos mecanismos epigenéticos mais comuns.
E com efeito, testes revelaram que um dos sistemas RM encontrado no pneumococo tinha a particularidade de funcionar como um “interruptor genético” com 6 possíveis posições para os grupos metil, resultando assim em 6 diferentes combinações de genes ativados e inibidos. E cada vez que uma bactéria se dividia as novas bactérias podiam ter qualquer uma destas combinações.
As formas do pneumococo obtidas tinham não só diferente estrutura e fisiologia, mas também diferente ativação dos genes ligados à virulência. E de facto ratinhos infetados com estas diferentes formas podiam desenvolver a doença ou não tal como acontece em humanos, dando suporte à ideia que o sistema RM era a origem das diferentes virulências em pneumococcus.
O estudo é importante por varias razões, para começar, ao elucidar o mecanismo como a bactéria se torna infeciosa, abre a porta ao desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas e melhores vacinas.
Mas a revelação de que as populações de pneumococo (e provavelmente muitas outras bactérias com o sistema RM) são heterógenas, é particularmente relevante porque vai mudar de forma drástica a forma como estas são estudadas. Por exemplo, agora sabemos que em diferentes ambientes este tipo de populações irá evoluir de forma diferente, dependendo de qual a subpopulação melhor adaptada ao ambiente onde se encontra. No caso do pneumococo isso pode explicar o porquê de diferentes indivíduos (diferentes ambientes) terem populações com diferentes virulências, mas também como desenvolver formas de manipular e controlar estes microrganismos.
Catarina Amorim
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva
