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Hélio Bernardo Lopes |
Em primeiro lugar, estiveram presentes neste referendo os laços históricos muito antigos que foram ligando ingleses e escoceses, de resto, envoltos, por igual, com outros povos e um pouco por todo o Mundo. O peso da História terá estado claramente presente no resultado final deste referendo. Um peso histórico que vai sobrevivendo através da memória e da transmissão cultural entre gerações e pela ação escolar. No fundo, um sentimento de pertença histórica, difícil de esquecer num tal momento. Sobretudo, num momento como este.
Em segundo lugar, este trajeto histórico também teve dados desagradáveis, sendo um destes, porventura, um certo sentimento de subordinação dos escoceses aos ingleses. Simplesmente, podendo a realidade ser esta, a verdade é que o bom senso e o seu cuidado inerente sempre teriam de menorizar esses aspetos traumáticos de desconfiança em favor do bem comum que une todos os povos que se acobertam sob o Reino Unido.
Em terceiro lugar, e porque não acredito, sinceramente, nas vantagens, sobretudo para os escoceses, desta independência, a sua utilização como ponto fulcral do programa do atual Governo acabou por se transformar numa arma política, muito mais que num mecanismo destinado a operar o fim de alguma injustiça que, porventura, possa ainda existir na atual situação do Reino Unido. Em quarto lugar, esteve aqui presente um desagradável sinal dos tempos, materializado no sentido independentista do voto jovem. É uma geração que perdeu sentido histórico e que não se viu forçada a defender a liberdade com os restantes povos do Reino Unido – mesmo outros – em tempos recentes e difíceis.
Em quinto lugar, um segundo sinal dos tempos, e que são tempos de egoísmo: a defesa da independência da Escócia face ao Reino Unido suportada numa base de poder económico, mormente pelo que diz respeito às capacidades de produção petrolífera. De resto, uma realidade que, a prazo breve, poderia ver-se atingida por uma réplica similar por parte de outros pequenos povos. Em sexto lugar, a prevalência cuidadosa dos mais velhos, que construíram também o Reino Unido que hoje se conhece. Não só não esqueceram o peso da História dos diversos povos deste último, mas foram capazes de perceber que, sem mais, o melhor sonho pode bem dar-se ares de um imprevisível pesadelo.
Em sétimo lugar, esta realidade do referendo escocês de ontem foi, em mui boa medida, um fruto de uma das modas do tempo atual: o direito de cada povo com identidade nacional própria, ter direito a ser independente, mas só mesmo por via de um direito, sem ser ponderado nas suas consequências e sem olhar os ensinamentos da História.
Em oitavo lugar, o resultado final deste referendo: uma vitória do NÃO por mais de dez e meio pontos percentuais. Haverá de convir-se que se trata de uma vitória ampla e clara. Um resultado que também mostrou como a grande comunicação social, em geral, se deixou levar pela ideia independentista, sem ir muito longe na análise de quanto realmente estava em jogo e sem ao menos apontar o erro de, também aqui, se deitar mão do argumento egoísta da maior riqueza da Escócia em face dos restantes povos do Reino Unido.
Por fim, é agora essencial que o Governo Britânico mostre toda a sua capacidade e honestidade política, no sentido de dar corpo às garantias entretanto apresentadas, e fortalecendo, dentro de um sentimento de unidade autêntica, a cada uma das partes que o constitui. Todos hoje, por todo o Mundo, anseiam por isso. Se assim proceder, custa-me acreditar que o que ora se viu possa vir a inverter-se no futuro.