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| Hélio Bernardo Lopes Escreve diariamenete |
Claro está que o que ali se dizia, em mui boa medida, era verdadeiro, mas não era muito diferente do praticado pelas suas congéneres, nomeadamente dos Estados Unidos e do Reino Unido, e onde surgia também todo o apoio tático de estruturas diversas do Vaticano e da Igreja Católica, um pouco por toda a parte. Era o caso, entre outros, de Portugal, Espanha, Itália, OTAN, União Soviética, mas também todo o subcontinente americano.
Entre nós e durante quase toda a II República, a presença oficial da Maçonaria foi uma realidade, sendo muito úteis os textos que Joaquim Dias da Silva Pinto vem dando à estampa num dos nossos diários, embora a um ritmo semanal. Mas é igualmente muito útil a obra de António José Vilela e Pedro Ramos Brandão, SALAZAR E A CONSPIRAÇÃO DA OPUS DEI, publicada entre nós pela Casa das Letras.
Neste sentido, é muito interessante a recente entrevista de Jorge Jardim Gonçalves ao i, onde refere um conjunto de amigos seus da Opus Dei – um deles até foi meu professor na universidade –, todos ligados, se não erro, ao antigo Banco da Agricultura, mas que são os já referidos na obra antes anterior. E, para quem conheça a História da Opus Dei, mormente em Portugal, facilmente percebe três coisas: a procura suprema de aceder ao poder político, a presença forte na banca e a correspondente nas universidades e em todos os centros formadores de quadros importantes do Estado.
De resto, Jorge Jardim Gonçalves tem até uma tirada muitíssimo verdadeira, mas muitíssimo significativa quando vinda de si: porque, infelizmente, nacionalizando a banca tomou-se conta do tecido empresarial, tal como hoje acontece, dado que quem domina os bancos chega a todo o lado. E a propósito de tudo isto é agora bom recordar que o próprio Salazar chegou a ser presente a juízo durante a I República, acusado de trabalhar em favor da reposição da monarquia, situação de que saiu absolvido.
O que tudo isto mostra é o que desde sempre se soube, mas raramente se fala: as sociedades democráticas vivem escolhendo os seus representantes por via do voto, mas muitos dos eleitores e, sobretudo, dos eleitos, encontram-se ligados por forças grupais típicas, legais ou não. Tal como sempre expliquei, até por vezes muito diversas, a democracia funciona como um anestesiante, destinado a legitimar a ação de quem chega ao exercício do poder, faça lá o que fizer e depois de prometer as coisas mais diversas durante a campanha eleitoral. Invariavelmente, sobretudo nos ambientes latinos, a medição direta da vontade popular é completamente posta de lado, mesmo em áreas essenciais, como se dá com a soberania. É, entre outros casos, o que se tem passado entre nós nesta III República.
Vem tudo isto a propósito da mão invisível referida pela deputada Teresa Leal Coelho, ao redor do adiamento da votação da nova legislação sobre secretas. A verdade, porém, é que não deixa de ser espantoso – e onde vai já o nosso espanto! – que quatro décadas depois do nascimento, digamos assim, da III República, volte a ser possível uma discriminação contra os nossos concidadãos que possam ser membros da Maçonaria.
Para Teresa Leal Coelho, o que está em causa é tão só a Maçonaria e os seus membros, porque tudo o mais é necessariamente paisagem. É uma atitude que trás ao nosso pensamento a Constituição dos Estados Unidos, com o seu artigo em que mantém os juízes do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais inferiores como inamovíveis e sem que o seu ordenado possa ser diminuído.
Este texto tem como finalidade garantir a inamovibilidade dos juízes, mas também a impossibilidade de se verem coagidos a deixar o exercício da função por via da diminuição do seu vencimento. E aqui, entre nós, é a mesma a realidade que poderá sobrevir: nas nossas secretas, indiscutivelmente, terão de existir membros da Maçonaria, mas por igual da Opus Dei, ou de gente ligada a interesses diversos. É sempre assim, aqui e em todo o Mundo. Na CIA, por exemplo, existem católicos, mações, protestantes, da Opus Dei, judeus, hindus, etc.. Se se exigir aos membros da CIA que digam se pertencem a um destes grupos, o que se está a fazer é a persegui-lo e a favorecer os interesses dos restantes.
Espero, pois, que quem possa ter esse direito constitucional suscite junto do Tribunal Constitucional a apreciação da inconstitucionalidade deste diploma, se acaso ele seguir em frente. Porque uma coisa é certa: trata-se de uma perseguição à Maçonaria, porque só a esta estrutura se aplica a referida exigência, pelo que é uma medida discriminatória.
E, para lá desta evidência, seria desejável, num verdadeiro Estado de Direito Democrático, que a Teresa Leal Coelho seja exigida a clarificação de qual é, em termos humanos e grupais, a mão invisível a que se refere. É o mínimo que se pode exigir, até pela periculosidade atribuída a essa mão invisível, que iria ao ponto de condicionar uma comissão parlamentar.
Claro está que este meu texto se refere a uma democracia e não ao caso português, onde uma deputada pode apontar um risco grave para a segurança do Estados e das suas instituições, sem que lhe seja exigida a correspondente materialização. É a democracia à portuguesa...
