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“Rituais do Ver”, exposição de Fátima Carvalho patente no Centro de Fotografia Georges Dussau |
Escolheu um caminho de sobreposições: à experiência da arte, que classificaríamos de primeiro grau, acrescentou uma experiência de segunde grau, a dos que observam. Quanto a nós, espectadores da sua proposta, cumprimos uma experiência de terceiro grau. Na selecção das fotografias documentais que agora mostra, o observador transforma-se no observado, o visitante no visitado, o amador na coisa amada. E no olhar e pela câmara da fotógrafa que a transformação acontece. E como a presente exposição vem na sequência de uma anterior, o caminho das sobreposições adensa-se e já encontramos fotografias da autora onde o observador, apanhado em flagrante, dirige o seu olhar a uma obra que é, afinal, outra fotografia da mesma autora.
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O discurso visual que nos é apresentado, apesar de tudo o que aconteceu à prática artística dos últimos 50 anos, centra-se na contemplação. Seria interessante perceber que imagens a fotografa colecionaria nas exposições em que as artes visuais já não dominam e em que o exame e a vivência da arte assentam noutros pressupostos, requerem outros mecanismos e mobilizam outros sentidos. As manifestações de realidade aumentada, todas as propostas de arte interactiva, os ambientes sonoros são apenas alguns exemplos que remetem para um domínio onde não há espectadores em sentido puro, mas utilizadores. O desafio que representam contém um outro que aqui se lança à fotógrafa.
O ritual de ver arte faz-se, não apenas com o olhar, mas com o corpo, pose, movimento, deslocação, aproximação, paragem. Faz-se com a inteligência em procura, focagem, direcionamento, atenção, compreensão, conhecimento. Faz-se com o coração, em expressão, gosto, desagrado, sorriso, descontracção, incómodo, comunhão, repulsa, descoberta, reconhecimento, agradecimento.
A história da arte e os estudos do visual associaram ao estudo do objecto artístico, o estudo das formas de o expor, a consideração dos textos críticos produzidos, os canais da sua legitimação e a relação com o espectador. Também por isso, são tão interessantes as imagens de Fátima Carvalho que nos revelam a dimensão cultural e social desse protocolo associado à experiência da arte, do conjunto dos rituais seguidos e do comportamento assumido nestes acontecimentos".
[Texto de Laura Castro]