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O "sabor máximo" da(s) palavra(s): compromisso |
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Emmanuel Levinas, filósofo nascido na Lituânia, quem estudou com Heidegger na Alemanha, quem viu a sua família perseguida e morta pelo nazismo, vindo a adoptar a França como país e sem desejar situar-se no Estado de Israel, chama a tais intervalos de tempo “noites sem horas”, ou seja, sem a salvação. Nessas ausências de horas, aflitivas, todo/as nós deveremos reflectir, para que não se repitam. Ora, o próprio Levinas afirmava que escrevia não exactamente o que o Mundo era, mas sim como deveria ser, o que perfila um horizonte de utopia.
Maria Gabriela Llansol bem diz que “ainda nada modificou o mundo”, perseguindo insistentemente uma concepção de espaço que elida o território para construir a Casa. Ora, esta Casa é também a que na linguagem se abre através de boas palavras, de palavras levadas ao seu “sabor máximo”, na bela expressão de Cristina Campo; estar no Mundo não o é apenas através do corpo ou da pátria, mas também a evasão que dele se presta.
Tal evasão traz à colação os livros em que penetramos, os textos em que nos deixamos submergir, as letras com que selamos a existência, como se se tatuassem na pele. Já Maria Zambrano, quando nos fala através das metáforas do coração, deixa assente que a poesia sela, ou deveria selar, a informe existência dos homens. E o que se entende aqui por informe existência? Sem dúvida, aquela que não se deixa impregnar pela espiritualidade da palavra. Embora saiba que quando nascemos não sabemos, contam-nos e acreditamos, pelo que o umbigo da História é feito e a nós cabe-nos dançar em torno dele; parece-me, todavia, importante acreditar no sopro da(s) palavra(s) como sibilas, precisamente, da acção.
No entanto, nunca como neste momento em que nos encontramos se desconfiou tanto da(s) palavra(s): como se já não fosse(m) viva(s), como se já não tivesse(m) as coisas e as pessoas dentro dela(s). Neste entorno, então, o que aqui gostaria de deixar enquanto compromisso, e antes de toda a comunicação que possa eventualmente gerar a escrita, será, é mesmo, a observação do “sabor máximo” da(s) palavra(s).
Tal significa dar prioridade à experiência e entender-me com ela, para que ressoe e possa posteriormente vir colidir com a das restantes pessoas, na sua singularidade. Em lugar de operadora(s) vazia(s), a(s) palavra(s) traz(em) consigo um anagrama do sujeito; saibamos nós velar por ela(s), para que ela(s) nos faça(m) evadir, o que significa, paradoxalmente, estar de corpo todo presente, ou seja, ter encontrado a economia do discurso que dá conta da nossa vida e, por tal, de cada vida em particular. Compromisso, então: trazer a experiência à colação.
Cláudia Ferreira
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva