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Raquel Abreu |
Sou Neurocientista, ou seja, faço investigação na área da Neurociência. E o que é Neurociência? Neurociência é o estudo científico do sistema nervoso, o qual inclui o cérebro, a medula espinal, os nervos e os gânglios nervosos.
Dada a complexidade do sistema nervoso, o seu estudo é igualmente complexo e requer um conhecimento multidisciplinar em várias áreas, nomeadamente biologia, farmacologia, psicologia, medicina, e metodologia computacional. Eu, por exemplo, tenho formação em Bioquímica, Bioinformática e Neurociência.
O objectivo final da comunidade de neurocientistas é definir a anatomia e a função do sistema nervoso e usar esse conhecimento para o desenvolvimento de medicamentos, instrumentos ou procedimentos clínicos que serão aplicados na prevenção, tratamento ou cura de doenças neurológicas.
A investigação pode ser definida como fundamental, translacional ou clínica. Eu trabalho num laboratório onde fazemos investigação fundamental, também designada de investigação básica. Para estes estudos recorremos a modelos animais, como por exemplo ratinhos. A grande vantagem destes modelos é a disponibilidade de técnicas bastante avançadas para a visualização e medição de actividade neuronal que nos permitem estudar em detalhe o cérebro.
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Agora pedimos-lhe que tente contagiar-nos: o que há de particularmente entusiasmante na sua área de trabalho?
Costumo comparar Neurociência com a montagem de um puzzle. Cada neurocientista tenta contribuir com uma nova peça para decifrar um puzzle de biliões de peças que constitui o cérebro. O cérebro fascina-me pela sua complexidade e pelo mistério que ainda reside nos biliões de neurónios que o constituem. Apesar do aumento significativo de investigação em Neurociência nas últimas décadas, ainda há muito por explorar e muitas peças do puzzle para descobrir.
Pessoalmente, acho que qualquer estudo relacionado com o cérebro é aliciante e um constante desafio. A cada descoberta segue-se sempre mais uma incerteza, uma curiosidade, um novo desafio que cativa os neurocientistas na sua busca incessante de respostas. A memória, em particular, é algo que me fascina. Existem inúmeras doenças neurológicas que afectam a memória. Mesmo num envelhecimento normal, a memória é uma das primeiras funções cognitivas a ser afectada. O meu objectivo, enquanto neurocientista, é contribuir com mais uma peça do puzzle acerca da memória.
Por que motivos decidiu emigrar e o que encontrou de inesperado no estrangeiro?
O meu percurso académico e profissional não foi muito planeado. Tudo foi acontecendo naturalmente. Com muito esforço e dedicação, fui alcançando desafios a que me propus. E quando as oportunidades surgiram não hesitei em aproveitá-las. Acho que tenho um lado aventureiro que me levou a ser cientista e a sair do país pela primeira vez.
Em 2008, quando decidi trabalhar em San Antonio, Texas, não tinha qualquer expectativa, estava simplesmente aberta a uma nova experiência, pessoal e profissional. Felizmente, foi uma experiência bastante positiva e muito enriquecedora a todos os níveis. Gostei de trabalhar no sistema académico americano pelo seu profissionalismo, rigor, e disponibilidade de recursos. Assim como da pontualidade e eficiência do sistema. Tive também a oportunidade de interagir com uma comunidade científica diversa, cultural e cientificamente, “open-minded” e menos formal do que em Portugal. Dada a minha personalidade foi bastante fácil a adaptação.
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Que apreciação faz do panorama científico português, tanto na sua área como de uma forma mais geral?
Penso que a investigação em Portugal ainda está bastante limitada pela falta de recursos e investimento. Infelizmente, a ciência em Portugal é financiada maioritariamente pelo estado estando, por isso, sempre sujeita à instabilidade política e financeira do país. Devido a este panorama científico, muitos projectos acabam por ser abandonados por falta de financiamento. E, quem sabe, se ideias brilhantes estão a ser desperdiçadas.
Na minha opinião, ser cientista em Portugal é ainda mais desgastante e difícil do que normalmente já é. Admiro e valorizo imenso os cientistas a fazer investigação em Portugal por terem de enfrentar algumas dificuldades adicionais. Admiro igualmente os cientistas que saíram do pais por abdicarem da família, amigos e do país. Tenho orgulho de ser portuguesa e de conhecer neurocientistas portugueses de alta qualidade, quer em Portugal quer no estrangeiro.
Que ferramentas do GPS lhe parecem particularmente interessantes, e porquê?
Quero em primeiro lugar felicitar a iniciativa da Fundação Francisco Manuel dos Santos na criação da rede GPS. Acho que é extremamente importante a divulgação da localização dos portugueses que se encontram espalhados pelo mundo. Esta iniciativa não só revela o espírito aventureiro e empreendedor dos cientistas portugueses, como torna possível a troca de ideias e contactos entre os portugueses, independentemente da sua localização e especialização profissional. Penso que esta iniciativa realça também a qualidade dos cientistas portugueses cujo valor é apreciado onde quer que estejam.
Espero sinceramente que mais portugueses se registem à rede GPS, pois tenho a certeza de que existem muitos mais aventureiros espalhados por outros cantinhos do mundo.
Conteúdo fornecido por GPS/Fundação Francisco Manuel dos Santos Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva