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|Hélio Bernardo Lopes| |
Trata-se de um texto estruturado num Sumário Executivo, 11 Capítulos – o primeiro tem a designação de Nota Prévia –, um conjunto de Anexos e um outro de Apêndices, sendo que o Capítulo 10 – Problemáticas e Recomendações – se encontra dividido em 6 Subcapítulos, indexados de A a F. É, pois, um relatório extenso, estruturado e diversificado, bastante completo e complexo, envolvendo quase três centenas de páginas. Tratarei aqui, neste meu texto, do que se contém no Sumário Executivo, que se constitui de 17 páginas.
Acontece – não é casso raro, na Califórnia e noutras partes do mundo desenvolvido – que este relatório surge no momento em que se desenvolve na Califórnia um vasto, prolongado e catastrófico incêndio florestal – mais um de muitos –, com umas dezenas de mortos, umas centenas de feridos, alguns milhares de desaparecidos e umas centenas de milhares de desalojados, tudo de parceria com alguns milhares de casas completamente destruídas, incluindo uma cidade pequena. O que significa, pois, que o que se passou em Portugal – e continua a passar-se, tal como também no norte de Espanha – não se constitui numa singularidade no domínio em causa, mormente no plano mundial. Constituiu-se, isso sim, num extremo absoluto ao nível nacional, mas já ontem ultrapassado.
Refere o relatório, logo no seu primeiro parágrafo, que foram os incêndios florestais de 2016 e, sobretudo, os de 2017 que remeteram esta temática para uma situação reconhecidamente insuportável e que exige soluções profundas, estruturantes e consensuais. Tenho para mim que é perfeitamente possível reestruturar a máquina global destinada enfrentar este tipo de situações, mas não poderá imaginar-se, com razoabilidade científica, que a minimização em causa possa assumir valores muito vastos, nem de um modo veloz, em termos de periodicidade anual.
De seguida, o relatório coloca esta questão: no século XXI, com o avanço do conhecimento nos domínios da gestão da floresta, da meteorologia preventiva, da gestão do fogo florestal, das caraterísticas físicas e da ocupação humana do território, como é possível que continuem a existir acontecimentos como os dramáticos incêndios da zona do Pinhal Interior que tiveram lugar no verão de 2017? A verdade, porém, como volta agora a ver-se e de há muito se percebeu, é que esta realidade tem mão criminosa, mas, quase com toda a certeza, já de um modo organizado, talvez transnacional.
Ora, a anterior consideração do relatório, a uma primeira vista muito pertinente, coloca o problema completamente à revelia do que se passa em lugares os mais diversos do mundo civilizado. O que está agora a passar-se, mais uma vez, na Califórnia, e que tem tido lugar na Austrália, no Canadá, no Brasil e noutros lugares da Terra, em geral caraterizados por densa floresta, temperaturas muito elevadas, baixa humidade, construção com materiais combustíveis e com elevada dispersão urbanística, mostra que poderá não ser possível encontrar uma metodologia que evite, fortemente, o tipo de acontecimentos em causa. Uma coisa é um modelo teórico destinado a atingir tal meta, outra o de saber se o mesmo é realizável e, se assim fosse, quais os seus resultados.
Depois, o relatório aponta três eixos fundamentais de análise: conhecimento, qualificação e governança. E se é evidente que terão existido limitações a estes níveis, que poderiam ter sido minimizadas nos seus maus efeitos, também o é que a mesma estaria necessariamente longe de poder produzir alguns efeitos de monta se operadas num prazo curto. As limitações apontadas resultam, naturalmente, de uma acumulação de más práticas desde há muitas décadas, não sendo superáveis a curto prazo.
O que este Sumário Executivo nos fornece é um quadro guia muito completo, suportado nos tais três eixos que adota, mas sem que se possa imaginar que tudo o que se contém no relatório possa ser posto em prática num prazo curto. No fundo, o referido Sumário Executivo conta-nos o que já se conhece e desde sempre se tem referido e debatido. O que legitima esta minha pergunta: se estivesse agora Marcelo Rebelo de Sousa como Primeiro-Ministro, poderia ele garantir que o cenário deste tempo quentíssimo e extenso – não esquecer a secura extrema –, para lá do caso da brutalidade das vítimas em poucas horas e numa simples estrada, não voltaria a repetir-se no próximo ano de 2018, logo que as temperaturas começassem a crescer alarvemente? Como facilmente haverá de reconhecer-se, Marcelo Rebelo de Sousa, se fosse Primeiro-Ministro, nunca se atreveria a garantir um tal êxito. Sabe muitíssimo bem o Presidente da República, e sabemos todos nós, que ninguém pode dar uma tal garantia. De resto, e para lá das vítimas mortais, o mais provável, infelizmente, é que os fogos florestais em Portugal voltem a novos máximos no próximo tempo quentíssimo de 2018. E depois, há a tal mão criminosa...