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Hortas urbanas e alterações climáticas |
Assim que comecei a trabalhar na área, nomeadamente em ateliers nos EUA, percebi que apesar do processo de concepção arquitectónico ser já complexo e interdisciplinar, (sendo que os arquitectos têm essa capacidade de lidar com equipas multidisciplinares porque têm que coordenar muitos projectos de especialidades dentro do projecto de arquitectura) não bastaria certificar ambientalmente um edifício, ou dois ou três para minimizar o efeito ilha de calor nas cidades, ou mitigar as cheias em cidades muito densificadas.
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Assim surgiu o meu gosto em estudar cidades resilientes, com modos de vida sustentáveis e governança comprovada. Fui viver para a Alemanha, o país europeu que sofreu mais guerras mundiais e grandes convulsões políticas e sociais.
Neste país (e também no Reino Unido) as hortas urbanas sustentaram a população urbana durante quase 8 anos de guerra. Mais tarde, e durante os 40 anos de comunismo na Alemanha democrática, também as hortas ajudaram a complementar a alimentação urbana. No caso de Leipzig, cidade de leste, os Kleingärten (hortas urbanas com mais de 100 lotes, sendo que cada lote tem entre 150m2-400m2) têm mais de 150 anos e surgiram durante o período da Revolução industrial, providenciando alimentos frescos às famílias proletárias, assim como espaço ao ar livre para as crianças crescerem de forma saudável.
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Contudo são os kleingärten que hoje são reconhecidos como uma importante infra-estrutura verde para ajudar a mitigar as alterações climáticas. Isso deve-se ao facto destas área contribuírem para a infiltração da água da chuva (a área total de hortas em Leipzig é de 1229 ha, correspondendo a 4% da área urbana total). Estes espaços contêm também várias árvores de médio e grande porte e por isso contribuem para o sequestro do carbono , arrefecimento do ar por evapo-transpiração, e ainda para a filtração de poluentes aéreos.
Adicionalmente as hortas urbanas produzem vegetais e fruta como complemento alimentar das famílias, promovem a saúde dos horticultores mais idosos, e por último são espaços urbanos que abrigam várias espécies animais e vegetais, contribuindo para a biodiversidade urbana e por isso para um ecossistema mais equilibrado .
Assim é mais fácil perceber a importância para a cidade destes espaços multifuncionais. Estas funções são chamadas em ecologia de «Serviços de Ecossistema» porque consistem nos serviços prestados pela natureza ao homem. Esta funcionalidade da natureza ajuda-nos a perceber a importância do seu papel e a respeitar a sua conservação.
Naturalmente que depois de estudar estas hortas, não resistimos à comparação com o caso de Lisboa. Na capital portuguesa, as hortas sempre estiveram presentes até ao seculo XIX, tendo então sobrevivido apenas nas zonas suburbanas após a industrialização. Algumas hortas ilegais também nasceram durante o período do retorno das colónias.
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Apesar disso os parques hortícolas de Lisboa estão bem integrados em parques de recreio e merecem por isso um elogio porque potenciam a conectividade entre espaços verdes tão importante para o equilíbrio ecológico.
No caso das hortas comunitárias (resultantes de iniciativas de bairro, e em numero reduzido) Lisboa ainda possui poucas comparativamente com Leipzig. Porém seria importante considerar o valor destas iniciativas que já provaram a sua importância em cidades médias como Todmorden, no Reino Unido. Neste caso, a vila tomou a iniciativa de promover hortas comunitárias invertendo a tendência de despovoamento.
De facto, a vila outrora maioritariamente fabril é hoje assolada pelo desemprego. Perante tal a população decidiu voltar às raízes agrícolas e começar a cultivar todos os espaços vazios das cidades, contando com o apoio da Câmara, tendo-se tornado uma atracção turística, e constituindo uma referência mundial de revitalização urbana na Europa .
Inês Cabral
Conteúdo fornecido por Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva