A intolerância religiosa dos brandos costumes

|Hélio Bernardo Lopes|
É muito frequente ouvir dizer que Portugal é um país de brandos costumes. A grande verdade, porém, é que esta ideia é constantemente ultrapassada ao ritmo da sucessão dos dias e das noites. Dia que chega, e novo ato de violência terrível e extrema nos surge através das notícias.

Esta situação de grande violência vem sendo acompanhada de uma atitude de intolerância religiosa, sobretudo por parte de católicos mais extremistas e que procuram, a todo o custo, impedir a vivência do princípio da liberdade religiosa. Precisamente o que ontem fui encontrar numa petição pública, já então a caminho das sete mil assinaturas.

A petição destina-se a ser apresentada à Assembleia da República, e procura que esta revogue, tão rapidamente quanto possível, a decisão da Câmara Municipal de Lisboa de construir aqui uma nova mesquita, na zona da Mouraria. E os argumentos apresentados foram os possíveis, embora objetivamente sem fundamento.

Em primeiro lugar, a suposta incompatibilidade do estilo arquitetónico com o tecido construído na região. É um argumento sem sentido, para o que basta perceber que se o templo fosse católico ninguém levantaria problemas. Não faltam casos deste tipo.

Em segundo lugar, o caso da suposta inconstitucionalidade, dado ser Portugal um Estado laico. A verdade, porém, é que Portugal apoia à saciedade obras ligadas à Igreja Católica Romana, pelo que a laicidade do Estado Português vale o que vale. E opera este apoio sem qualquer controlo financeiro adequado.

Simplesmente, a Constituição da República não impede apoios pontuais a estruturas religiosas, antes limita a ação do Estado no plano da assunção de uma religião oficial. É uma realidade cabalmente distinta da invocada pela petição em causa.

E, em terceiro lugar, o fantástico e falso argumento de que o dito templo estará manifestamente a contribuir para o alarme social, tendo em conta a situação de expansionismo do extremismo islâmico que se vive no Médio Oriente e Norte de África e que ameaça Portugal, a partir do momento em que se sabe que existem radicais muçulmanos que defendem a integração da Península Ibérica num grande califado islâmico. A grande verdade é que não é isto que o Papa Francisco repete à saciedade, antes o contrário. Embora, como se vê, não sirva para nada.

Lamentavelmente, esta petição pública ajudará a colocar o nosso País no mapa da intolerância religiosa anti-islâmica. À luz de um raciocínio deste tipo, os padres católicos pedófilos, fruto da sua ação, teriam já criado um alarme social grave, que poderia levar a suspender a ação mais geral dos colégios católicos. Porventura, a própria Concordata entre Portugal e a Santa Sé. E isto para não referir já o caso do dito Banco do Vaticano – convém recordar as palavras de Adriano Moreira em entrevista à STELLA –, para mais com o conhecimento que o mundo pôde ter das palavras iradas deste Papa, que dois jornalistas eméritos italianos deram a conhecer.

Esta recente petição pública, creio que ainda a decorrer, a ter algum impacto será na apresentação de Portugal ao mundo como um Estado de católicos intolerantes em matéria religiosa. Por ser esta uma evidentíssima realidade, não duvido, mesmo que minimamente, que a Assembleia da República não aprovará o que se deseja com esta petição. Mas cá estaremos para ver o que irão fazer o CDS/PP e o PSD... Até porque a temática pode também ser usada como tema eleitoralesco.

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