A "Geringonça"

|Hélio Bernardo Lopes|
Em boa hora Paulo Portas criou a já histórica palavra “GERINGONÇA”, com que procurou batizar o Governo de António Costa, hoje em funções. 

A verdade é que a palavra caiu na graça dos poucos portugueses que a utilizam e serve agora para mostrar a cabalíssima falta de razão dos políticos do PSD e do CDS/PP, mas por igual do Presidente Cavaco Silva, dos direitistas do PS e dos mil e um jornalistas, analistas e comentadores, que, de serviço, polvilham os nossos canais televisivos, operando inúteis análises sobre temas os mais diversos. Com exceções raras, obviamente.

Os que dispõem já de uma boa idade, se possam ter mostrado interessados na vida do País e do mundo, e tenham boa memória, há muito sabem que o PSD nunca foi, de facto, um partido social-democrata. Por via de avanços sucessivos, o PSD foi quase tudo em matéria política. Hoje, perante o triunfo neoliberal, apercebendo-se de que o futuro de Portugal não será fácil, os líderes do PSD fazem o mais simples: vendem tudo a pataco, deixando o País quase sem apetrechos para poder progredir minimamente.

Acontece que os portugueses puderam sentir, durante quatro anos, os terríveis efeitos da presença no poder de uma Maioria-Governo-Presidente de Direita. Efeitos que não chegaram a atingir o seu pico mais grave, graças, precisamente, à formação da GERINGONÇA. E – espanto dos espantos! –, eis que o resultado tem superado quase tudo o que haviam sido compromissos com os portugueses. Perante uma omnipresente realidade deste tipo, o que poderiam fazer o PSD e oo CDS/PP? Bom, muitíssimmo pouco.

Para mal dos pecados dos adeptos da receita neoliberal do PSD e do CDS/PP, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa não procedeu como quase todos imaginavam, antes se deitando a defender, com unhas e dentes, o interesse de Portugal. Isso mesmo volta a transparecer do texto do comunicado ontem publicado pelo Presidente da República.

A este propósito, tendo escutado ontem as palavras sonhadoras de Ricardo Sá Fernades na RTP 3, recordo aqui um bombardeamento da aviação da Alemanha nazi a certa cidade inglesa, que foi descoberto por via da descodificação da mensagem que a tratava através da ENIGMA. Conversando Winston Churchill com um elemento importante do seu gabinete, para ele referiu que o conteúdo da mensagem não podia ser conhecido. Ou seja, os ingleses da tal cidade não poderiam ser informados do que ia ter lugar.

Perante esta tomada exigente de posição – uma ordem do Primeiro-Ministro –, o ofical que o escutava retoquiu de pronto: mas isso é um crime (previsto e punido), não se pode deixar de informar as pessoas! De pronto, Churchill respondeu que o crime era ali secundário, porque se a população abandonasse a cidade, tal representaria que o código da ENIGMA havia sido descodificado. E concluiu: a Coroa e o País estão acima dessa realidade legal.

Este caso – um caso real – mostra que existem situações que nos impõem ações para lá da mera ligalidade. Basta recordar, por exemplo, as ações dos serviços de espionagem e de contra-espionagem e o que sobre o tema contou em tribunal o nosso concidadão Jorge Silva Carvalho, que foi líder do SIED.

O que agora se vem passando com o Ministro das Finanças, Mário Centeno, mostra a razão da tomada de posição do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, porque este ministro, nunca sendo insubstituível, pode sê-lo com imensa dificuldade. E o PSD e o CDS/PP sabem disto mesmo. Objetivamente, Mário Centeno tem sido o timoneiro principal do êxito que já todos reconhecem à ação da GERINGONÇA. Com as notáveis exceções do PSD e do CDS/PP. A sua saída da governação poderia deitar por terra todo o dossier da Caixa Geral de Depósitos. E, como cada um de nós conhece bem, o PSD e o CDS/PP sempre pretenderam a sua privatização. Desta instituição e de quase tudo o resto.

Ainda recordando as palavras de ontem de Ricardo Sá Fernandes na RTP 3, é bom salientar aqui que me encontro num café da minha área resindencial, com cerca de uma dúzia de pessoas nas mesas à volta da minha. E já aqui entraram seis ou sete senhoras que trabalham numa empresa próxima – uns quarenta metros. A verdade é que ninguém fala do caso Centeno e muito menos do tal programa de ontem da RTP 3. Fala-se do jogo do Benfica, do estado do tempo, de cinema, da barragem de Oroville, mas nada sobre Centeno. Ao contrário do que referiu Ricardo Sá Fernandes, ninguém com bom senso em Portugal imagina Mário Centeno como alguém manobrador, tão à semelhança do que se imagina como existindo na classe política.

Hoje, os portugueses norteiam-se por um dado essencial: saiu o anterior Governo, entrou a GERINGONÇA, e tudo melhorou. Já quase todos – e por todo o mundo – reconhecem tal. Já só o PSD, o CDS/PP e uma boa miríade de jornalistas, analistas e comentadores, persistem em pôr em causa o êxito até aqui conseguido. Mas isto permite aos portugueses aperceberem-se de que a tal nomenklatura neoliberal mundial também está presente entre nós.

Erram os que se queixam de o PSD e o CDS/PP não apresentarem propostas estruturantes para o País. Eles têm-nas, mas não podem defendê-las publicamente, dado que tudo seria apenas o regresso ao passado, com a mais que certa progressão no sentido de um ainda maior empobrecimento da generalidade dos portugueses.

Um dado é hoje certo: a GERINGONÇA operou mudanças de fundo no seio da nossa empobrecida comunidade humana. Conseguiu mostrar que a política prosseguida pela anterior Maioria-Governo-Presidente se suportava num objetivo ideológico: criar uma sociedade muitíssimo ampla, paga através de baixos rendimentos e do poder da precariedade. O problema é que os portugueses desde há muito quase nada interessados na democracia, percebem esta realidade de um modo claro e simples. E depois o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que percebeu o mesmo que Churchill: Mário Centeno, que não é um mentiroso nem praticou qualquer crime – e não é um político profissional –, é hoje essencial, na situação vivida por Portugal, uma peça fundamental para os resultados já conseguidos e para os que se pretendem vir a alcançar. Imagina-se, facilmente, a cachola da atual Direita política perante o cabalíssimo desmentido que a realidade impôs à Direita de hoje...

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