Três gritos recentes

|Hélio Bernardo Lopes|
Como se conhece hoje à saciedade, cada dia que nos chega traz-nos novidades, em geral, desagradáveis. Embora qualquer delas facilmente previsível, mas desde que os mais interessados e atentos se determinem a usar do discernimento essencial. 

A grande verdade é que esta correnteza de desagradáveis novidades veio para ficar. E – é o ponto mais significativo – de algumas delas a nossa comunicação social (dita) livre nunca fala. E quando o faz é à custa da utilização do que designo pelo método da tangente.

KADHAFI
Pois, aí nos chegou a novidade, contada por um primo do assassinado líder líbio, sobre as razões do seu homicídio. Uma dessas razões terá sido a tentativa do líder líbio para criar uma moeda única africana e unir o continente, tornando-o numa espécie de Estados Unidos da África. Não sei se tal foi, ou não, uma realidade, mas torna-se evidente que se estaria sempre perante algo muito longínquo. Uma realidade que seria sempre muito difícil de implementar. Desde logo, porque as antigas potências coloniais poderiam liquidar uma tal iniciativa, promovendo movimentos separatistas e guerras em diversos países. E poderiam, por igual, simplesmente convencer muitos desses países a não aderir a uma tal ideia. Não faltam razões.

É muito possível – até provável – que Kadhafi tivesse colocado uma tal ideia sobre a mesa política africana, mas esta notícia, quase com toda a certeza, deverá ter um outro objetivo. Esse objetivo é o de tentar apagar o que veio a público sobre Sarkozi e Kadhafi. E isto porque Sarkozi pretende voltar a candidatar-se ao lugar tão mal desempenhado pelo socialista democrático Hollande. Ou seja, a Direita de França continua a mandar em gente líbia.

DEFENDER O PLANETA TERRA
Há já uma dezena de anos, um dos nossos canais temáticos trouxe-nos um documentário sobre regiões diversas da Rússia, ambientalmente destruídas por via da política da antiga União Soviética. Em boa verdade, tal documentário quase cortava o coração de qualquer pessoa que ambicionasse um bom sentido para a vida nas sociedades e no mundo. E não duvidei de que, para lá da componente propagandística, o mesmo fosse verdadeiro no seu conteúdo. Mas havia um dado certo: os países ocidentais teriam de fazer coisas similares, porventura piores, mas em lugares diversos da Terra. Basta recordar, por exemplo, os casos de Bikini, Mururoa e Los Alamos.

Pois, aí está a descoberta, proporcionada pelo degelo polar norte, do chamado problema da herança suja da Guerra Fria, enterrada sob a neve há décadas. Com o fim da Guerra Fria foram encerradas as bases militares dos Estados Unidos na Gronelândia, sendo que os resíduos radioativos e químicos perigosos para o ambiente não foram destruídos, uma vez que não se conseguiu decidir sobre quem devia pagar pelas tentativas dos Estados Unidos para controlar a extinta União Soviética.

Aqui está, precisamente, um dos temas que Donald Trump tem vindo a abordar na sua campanha eleitoral. Todos nós sabemos bem que são sempre os Estados Unidos que pagam, com dinheiro e com vidas, a dita defesa da Europa. Uma defesa, claro está, que também é a dos interesses norte-americanos.

O interessante, no meio de tudo isto, está no silêncio da nossa grande comunicação social (dita) livre. Nem uma notícia tangencial sobre o tema, e muito menos grandes desenvolvimentos ao redor do mesmo, mormente de físicos, climatologistas ou geólogos. A democracia, portanto.

REALIDADE EVIDENTE E OMNIPRESENTE
Krzystof Charamsa, hoje a meio da casa dos quarenta, é padre católico com o exercício das ordens suspenso pelo Vaticano. A causa desta situação reside no facto de ser homossexual, se ter publicamente assumido como tal e ter um companheiro com quem vivia. Ora, este padre veio agora a público acusar a hierarquia da Igreja Católica de ser profundamente hipócrita com este caso dos homossexuais. E tem toda a razão.

No livro que agora publicou expõe o seu percurso como católico fervoroso e como sacerdote, que iniciou carreira na Santa Sé, tendo sido segundo secretário da Comissão Teológica Internacional e oficial da Congregação para a Doutrina da Fé. Nele apresenta uma carta que enviou, em outubro do ano passado, ao Papa Francisco, na qual rejeita publicamente a violência da Igreja Católica sobre as pessoas homossexuais, lésbicas, bissexuais, transexuais ou intersexuais. Nesta carta se pode ler que não pode continuar a suportar o ódio homofóbico, a exclusão, a marginalização e a estigmatização das pessoas como ele. Uma carta que foi enviada a Francisco nas vésperas do Sínodo sobre a família, que se reuniu em Roma, e cujas conclusões o desapontaram. Aliás, desapontaram quase todos os que realmente acompanham a necessidade de uma Igreja Católica inclusiva.

Mas o padre Krzystof Charamsa diz mais, expondo uma sua estimativa: do que sabe, cerca de metade das pessoas que se movimentam no seio do Vaticano estão na situação dele mesmo. Tratando-se, embora, de uma estimativa pessoal, a mesma parece-me aceitável, mesmo natural, dado que o problema em causa, tal como o da pedofilia de muitos padres, tem de possuir uma causa estrutural, como já referi por diversas vezes. Enfim o terceiro destes três gritos do momento.

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